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Moradores do Centreville aguardam
título de posse dos imóveis para celebrar

Acordo entre CDHU e Prefeitura garante escrituras sem custo a 3.000 pessoas até o fim deste semestre

Bia Moço
Do Diário do Grande ABC
24/01/2020 | 00:01
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Nario Barbosa/DGABC


 Moradores do bairro Centreville, em Santo André, aguardam a posse definitiva das escrituras de seus imóveis para celebrar a notícia de que a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano) deu aval à Prefeitura para a entrega da titularidade a 3.000 pessoas sem qualquer custo à população. O acordo com a empresa paulista, tido como histórico, foi anunciado pelo prefeito Paulo Serra (PSDB) ao Diário na quinta-feira.

O processo de luta pela regularização fundiária da ocupação, iniciada há 37 anos, deixou a comunidade descrente a respeito de promessas de melhorias. Presidente da Associação União e Luta dos Moradores do Centreville, Marilda Brandão, 45 anos, destaca que, embora a sensação seja de que a “guerra acabou”, as famílias preferem aguardar a assinatura dos documentos para comemorar. “Cheguei aqui com 8 anos. Vi meu pai, Messias Carneiro de Moura, dar início à associação, ao lado de Batista Lemos, presidente da entidade na época. Foi lá atrás que começou a nossa luta. Somente agora, enfim, teremos o que é nosso por direito”, ressaltou Marilda.

Para o marido de Marilda, Edilson Lesso Brandão, 58, conhecido como Nenê, a “briga”, que parecia não ter fim, “foi boa”. “Todo ano escutávamos promessas de políticos, especialmente em época de campanha, e nada saía do papel. Foi surpreendente ver que, de fato, o governo lutou por nós”, considerou.

Vizinhos mais antigos do local revelaram não acreditar em solução para a área. Moradora inaugural do bairro, Joselita da Silva de Moura, 74, promete que a comunidade fará festa quando toda a população estiver com a documentação em dia. “Foi uma luta árdua da associação e devemos essa conquista aos líderes que estiveram à frente da nossa comunidade. Estou muito feliz”, comemorou.

João Alves da Silva, 82, também foi um dos primeiros ocupantes da área. Para ele, as dificuldades estão prestes a ter fim. “Fico pensando em quando cheguei aqui, quando não tinha água nem luz, e em como foi difícil construir as casas e fazer nossa vida. Nem acredito que, enfim, vou dormir tranquilo”, destacou.

Chamada carinhosamente de dona Bia pelos vizinhos, Severina Martiniano da Silva, 75, disse que, ao receber a notícia de anistia para a regularização fundiária, caiu de joelhos no chão e agradeceu. “Vim para cá com quatro filhos, sendo duas deficientes. Ia até a Vila Pires, na casa da minha irmã, para lavar roupa. Saí de um aluguel que pagava 10 cruzados (moeda da época) para lutar pela minha casa própria”, relembrou.

Morador do bairro há cerca de 32 anos, Adilson de Souza Caçula, 56, chegou ao Centreville quando a situação já era melhor em questão de infraestrutura. “Pensei, por vezes, em desistir desta briga. Mas os moradores não podiam deixar o erro persistir para as próximas gerações. Marcaremos história por essa luta, em breve, vencida. Fico honrado em ter meu nome na lista da associação e ter, ao lado de tantos, lutado por essa conquista.”

Ocupação nasceu após projeto de condomínio de luxo dar errado

Considerada a primeira ocupação de sucesso do Brasil, o Centreville nasceu com 539 moradias de arquitetura alemã, semiconstruídas em ruas de paralelepípedo. A ideia era a de que o espaço fosse transformado em condomínio de luxo aos moldes de Alphaville, em Barueri.

As obras tiveram início em 1973, no entanto, quatro anos depois a construtora Nova Urbes faliu e abandonou o projeto. Inconformados, os futuros moradores, que já tinham pago montante para construção de quatro lotes residenciais, perderam tudo.

Ainda na época da ditadura militar, representantes da Igreja Católica e do PCdoB – partido comunista que estava iniciando no País – tomaram a decisão, em reuniões organizadas pelas associações de bairro da Vila Guaraciaba e da Vila Vitória, de ocupar as casas abandonadas.

Presidente da Associação União e Luta dos Moradores do Centreville, Marilda Brandão lembra de presenciar militares em busca das pessoas que estavam à frente do partido e da associação. “As crianças faziam corrente em frente à cavalaria, cantando músicas de protesto, as mães ficavam atrás, e os pais vinham na sequência, com armamento para defender nossas casas. Nunca fraquejamos”, se orgulha.

 

Administração diz que documentos serão entregues a partir de fevereiro

A promessa da Prefeitura é a de que cerca de 3.000 moradores do bairro tenham seus imóveis regularizados até o fim deste semestre. Segundo o prefeito Paulo Serra (PSDB), 700 dessas pessoas terão em mãos os títulos dos imóveis até a primeira quinzena de fevereiro.

A regularização fundiária do Centreville avançou nos últimos dois anos e a imissão dos imóveis era o último passo desse processo. Até meados de 2017, a negociação encaminhava para que os moradores financiassem o valor das moradias junto à CDHU – a companhia comprou a área na década de 1980 –, formato que desagradou parte dos moradores. Naquele ano, o Paço andreense publicou decreto em que delimitava os lotes do Centreville, destravando o processo legal de regularização da área.

Pela proposta da CDHU, as famílias não teriam de arcar com o valor da edificação erguida, apenas com o custo do lote. Os moradores receberiam um subsídio, de acordo com a situação econômica de cada um. Quanto menor fosse a renda familiar, maior seria a subvenção, que poderia chegar até a 85% do valor do lote. O montante poderia ser financiado em até 30 anos, com taxa de juros de 4% ao ano, além de que todos os impostos e taxas estariam inclusos no financiamento, bem como o seguro. Apenas 17 famílias aceitaram o acordo e, agora, terão de recorrer à Justiça para obter a isenção dos custos.

“Queriam que a gente pagasse por algo que já era nosso por direito. Iriam tirar tudo dessa gente, que já não tem muito. Não dava para aceitar”, explicou a presidente da Associação União e Luta dos Moradores do Centreville, Marilda Brandão.




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