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Teatro para abrir os olhos
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12/04/2008 | 07:07
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Alguns moradores mais antigos ou turistas que freqüentavam o centro de São Paulo ainda lembram da “passagem do Mappin” que fica bem ali, em frente ao Theatro Municipal, na Praça Ramos, do outro lado da calçada.

Fechada há dez anos, é uma dessas galerias subterrâneas com dupla função: em funcionamento, dava acesso aos pedestres ao viaduto do Chá e ainda servia de vitrine para produtos do Mappin.

Pois quem não conhece, terá uma chance a partir de sábado, quando essa passagem subterrânea vira palco da intervenção cênica intitulada A Última Palavra é a Penúltima, que será apresentada de sábado a terça, às 19h e 21h, com entrada franca. Haverá ainda uma outra apresentação dentro da programação da Virada Cultural.

Na chuvosa noite de terça-feira, houve ensaios. A sensação de estranhamento começa pela entrada nesse lugar desconhecido e vazio em plena agitação do centro e é reforçada pela penumbra, proposital, que confunde contornos. Pouco depois, o espectador vai se sentar dentro da vitrine e desse ponto de observação, privilegiado, acompanha a apresentação.

“Resistam à atuação, não quero que vocês representem”, diz várias vezes o diretor peruano Carlos Cueva, do grupo LOT, de Lima. A tom desejado é mesmo difícil. Caminhar sem ‘atuar’ para um olhar, como alguém só de passagem. “Não é um espetáculo, é uma intervenção cênica”, diz a outra diretora Eliana Monteiro, do Teatro da Vertigem. Outra? Sim, e tem ainda outros dois diretores, André Semenza e Fernanda Lippi, da companhia Zikzira. Muito cacique para pouco índio? Bem, são doze os atores participantes, três do Lot, sete do Vertigem, dois da Zikzira.

Eliana Monteiro conta que a idéia partiu do texto O Esgotado, de Gilles Deleuze. “Fiquei siderada pelas discussões nas aulas de filosofia de Peter Pal Pebart. Ele falou muito da diferença entre o cansaço e o esgotamento. Se a gente cansa, dorme, e no dia seguinte está pronto para repetir tudo. Quando a gente esgota um sentimento, uma tarefa ou um relacionamento-momento, aí surge a mudança, a transformação.” Do livro brotam idéias como o corpo poroso às vivências em contraste com a blindagem cotidiana e surge o projeto da intervenção no espaço de passagem.

Já nessa intervenção o espectador é colocado numa vitrine. Em alguns momentos vira alvo da observação, mas na maior parte do tempo observa quem passa.

O que se vê? Apenas a passagem das pessoas. Daí a insistência de Cueva pela não representação. Daí talvez se consiga, como pedia Brecht, estranhar o familiar e tornar familiar o bizarro. “A maioria dos seres humanos passa muito tempo com o corpo blindado”, diz Eliana. A rotina pode ter um feito de uma espécie de anestesia, que coloca seres humanos em movimento de formigas. O objetivo da intervenção cênica é agir sobre a forma de ver e estar no mundo.

A Última Palavra é a Penúltima – Teatro. Na Passagem Subterrânea Viaduto do Chá e Praça Ramos de Azevedo. De sábado, às 21h a terça, às 19h e 21h. Grátis (retirar ingresso uma hora antes).



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