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Viela no Centro ganha outra cara

Comerciantes da Rua Savino Degni, entre eles a cabeleireira Vera Lúcia, promovem mudanças em espaço que a população temia

Yago Delbuoni
especial para o Diário
19/09/2015 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC:


Uma travessa do calçadão da Rua Coronel Oliveira Lima, um dos pontos com maior movimentação de pessoas em Santo André. Esta é a Viela Savino Degni, bastante discreta para quem passa apressado pelo Centro.

O local tem imóveis muito parecidos e, em sua maioria, comércios. Um deles é ocupado pela cabeleireira Vera Lúcia dos Santos, 65 anos, que está na casa 5 desde 1998. Para Vera, o espaço representa o começo da mudança de sua vida. “Trabalhava na minha residência. Juntei-me a outras duas donas de casas, mães de família, e alugamos um espaço para atuar.”

Vera conta que a chegada do grupo trouxe também a revitalização deste pedaço do Centro andreense. “Quando chegamos aqui, a viela era abandonada. Começamos a torná-la mais frequentada. Antes ninguém gostava de passar por aqui. E pouco a pouco fomos melhorando as condições”, destaca.

A especialidade de Vera são os cabelos crespos. “A gente mexe com todos os tipos, mas o carro-chefe é o afro. A ideia é melhorar a autoestima da mulher.”

Quem pensa que cabelo crespo é ‘ruim’, já na entrada do salão se surpreende com charge com os seguintes dizeres: ‘O que o meu cabelo fez de tão mal para você chamá-lo de ruim?’. “Esse papo de cabelo ruim é muito falado no dia a dia. Isso é algo que eu combato. O cabelo crespo é apenas diferente. E, nos últimos tempos, tem conquistado mais valor. Até na mídia é possível ver que tem mais gente deixando as madeixas livres. O que determina se o cabelo é bom ou ruim é a autoestima.”

Questionada sobre o diferencial do salão, que resiste há tanto tempo no Centro, Vera garante se tratar da qualidade do atendimento. “Essa é a meta do nosso trabalho. Por isso não recebemos só quem tem cabelos crespos, mas todos os tipos de cabelos. A procura é semelhante.”

Segundo a cabeleireira, o serviços mais buscados pelos clientes são tranças, dreads e alongamento de cabelos para lisos ou crespos. Os preços variam entre R$ 30 e R$ 240.

O salão de Vera é conhecido em toda a cidade. “É legal poder passar na rua e dar ‘bom dia’ para todo mundo. É algo que conquistei em todo esse tempo de trabalho.”

A cabeleireira comentou que os clientes estranham a calmaria da viela. “Muita gente pensa que aqui não é mais o Centro da cidade, porque veem a Oliveira Lima muito movimentada e, quando chega aqui, reparam que o movimento diminuiu bastante”

Moradora do Jardim Silvana, Vera comenta que gosta muito de atuar no Centro. “Não me vejo fora daqui. O meu dia a dia é nesse lugar. Passo mais tempo aqui que em casa e, por isso mesmo, gosto muito”, falou.

 

Moradora vive no local há 55 anos

 

Na Viela Savino Degni, onde prevalece o comércio, há também a residência da aposentada Janir Pellozo, 75 anos, que vive ali há 55.

Apesar de morar no Centro de Santo André, garante que a rua é tranquila, já que, à noite, é deserta. “Aqui é tudo comércio. Não tem nada. Depois que você está há 55 anos em um lugar, reconhece tudo o que acontece e todos que passam por aqui.”

Atualmente, a aposentada vive só com a filha de 20 anos. A família é a mais antiga da viela. “Quando a gente fica no lugar durante muito tempo, se acostuma com o barulho e sabe até o som de uma folha que cai na rua”, brincou.

Questionada se pensa em morar em outro ponto da cidade, Janir foi enfática: “De jeito nenhum. Se precisar de farmácia tem quatro, padaria são duas aqui perto. A estrutura que tenho é muito boa. Só falta ter um supermercado.”

A moradora tem boas recordações de sua vida no bairro, “Vim para cá jovem. Toda a minha vida aconteceu aqui.”

Janir disse que os comerciantes a acolhem bem. “Todos me tratam com carinho. Quando chega alguém diferente à viela, não sei se sou intrometida, mas vou ver o que está se passando. Com os outros comerciantes vizinhos foi assim e assim comecei a ser conhecida.”

Em frente à sua casa havia antes uma pensão, que hoje está abandonada. “A casa ficou sem ninguém, tornou-se velha e o piso está até cedendo. Colocaram à venda, mas acho difícil aparecer um comprador interessado nele porque o imóvel é grande e o preço, elevado.”

 

Bairro gera oportunidade de trabalho

 

Outra comerciante que está há muito tempo na Viela Savino Degni é a costureira Edna Fabiano, 59 anos, que, assim como Vera, chegou ao local em 1998.

Edna contou que precisou se deslocar para o Centro, uma vez que a oportunidade de emprego era rara. “Sou costureira há muito tempo. Depois de uma certa idade, fica mais difícil arrumar trabalho com carteira assinada, ainda mais sendo mulher e negra. A Vera e outras comerciantes já estavam aqui na viela e vim para ajudar.”

A costureira disse ser muito agradecida pela oportunidade de atuar na viela. “Trabalhar por conta própria é sempre arriscado, mas está funcionando. Não dependo de uma chance das empresas para sobreviver.”

Edna afirmou que há relação de cumplicidade entre os comerciantes que atuam por ali. “A gente toma conta, se ajuda. É importante manter bons relacionamentos com outros vizinhos, porque não há como viver sem o apoio dos demais. É como se fosse um condomínio, a gente decide tudo junto”, comparou a costureira.

Questionada sobre sua relação com o lugar, Edna disse que gosta de trabalhar na Savino Degni por conseguir modificar o cotidiano do espaço. “Quando chegamos era muito ruim, semelhante a uma favela, com moradores de rua dormindo nas calçadas. As pessoas não andavam por aqui por medo. Mas quando chegamos, mudamos isso com muita luta e cuidamos do que é nosso.”

Moradora do Parque Guaraciaba, Edna afirmou que gosta de ser reconhecida pelo seu trabalho. “É bom passar na rua, ver que tem gente que acena e te reconhece. É muito gratificante.”




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