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Reflexões sobre o luto
Por Luciane Mediato
Do Diário do Grande ABC
07/07/2011 | 07:00
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O escritor húngaro Péter Esterházy, considerado um dos grandes nomes da literatura europeia contemporânea, lança amanhã na Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) o livro "Os Verbos Auxiliares do Coração" (Cosac Naify, R$ 35,72 páginas) com tradução de Paulo Schiller.
 
A obra é uma reflexão emocionante acerca do luto, das relações familiares e da maneira de expressar a perda. Alternando aspectos confessionais e ostensivamente literários, a obra se aproxima e se afasta da tristeza que procura retratar. É essa mesma ambiguidade que dá ao título da obra a sua ironia: a justaposição de uma categoria gramatical (o verbo auxiliar) com o símbolo da paixão humana (o coração).
 
O livro abre o caminho para nova forma de escrever um romance. Esterházy fala sobre morte e conflitos pessoais que surgem com a perda. Menos de duas semanas após a morte de sua mãe, no início dos anos 1980, ele se viu dividido entre o sentimento comum de que seu luto era único e incomunicável e a necessidade de escrever sobre a pessoa que acabara de perder. Ainda se debatendo entre esses impulsos contraditórios, rascunhou um texto breve sobre o dilema, que acabou se tornando o prefácio de "Os Verbos Auxiliares do Coração".

O autor explica que falar da própria vida faz parte da construção de uma história. "Normalmente para os escritores há um ponto de partida que é autobiográfico e depois começa o trabalho com a fantasia, a ficção. No meu caso, a autobiografia já é uma elemento da fantasia". Porém, "Verbos Auxiliares", que trata da morte da mãe e parece ser autobiográfico, termina com uma frase polêmica. "Um dia vou escrever sobre isso com mais precisão."

A literatura sobre a perda dos pais nem sempre será precisa, já que quando uma mãe morre, o sentimento é de que o mundo inteiro não está direito. Ainda insatisfeito e com a ideia de construir uma história melhor, Esterházy lançou, em 2008, "Nenhuma Arte", que trata do mesmo tema, mas com uma revelação ambígua. "O livro fala que "Os Verbos Auxiliares do Coração" mente, que minha mãe não está morta. Isso já é algo mais preciso, isso escrevi - essa última frase - sorrindo", conta o autor.

Sobre as obras provocarem sensação paradoxal nos leitores, o autor justifica que não sentimentos pessoais, mas falas dos próprios textos. "Um exemplo disso foi que comecei a escrever o primeiro livro depois de quatro anos da morte da minha mãe. Na literatura, normalmente se faz coisas contraditórias, um texto se cala e fala em seu próprio momento e espera-se que ao escrever a impossibilidade se torne possível", define.

Os textos de Esterházy têm como característica uma forma de pontilhismo cultural, como se várias formas de narrativas contracenassem entre si. "O todo de uma obra é constituído de muitos pequenos pontos. O fragmento fala sempre de um todo (ausente). Quando nós não o enxergamos como imagem, mas sim sob a forma de fragmento, tenta-se novamente e novamente dizer algo e não se alcança. Qualquer texto é construído de pequenos retalhos que formam uma imagem total."




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