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No Grande ABC, ação policial causou 44 mortes até novembro

Total de vítimas nos 11 meses de 2019 representa um quinto dos homicídios da região no período e é 52,17% menor do que em 2017

Por Flavia Kurotori
Do Diário do Grande ABC
06/01/2020 | 07:00
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Denis Maciel/DGABC


 Entre janeiro e novembro de 2019, a ação policial causou 44 mortes no Grande ABC. Em 2018, foram 47 óbitos, representando queda de 6,38% no período. A redução é de 52,17% se comparada a 2017, quando 92 pessoas perderam a vida pelo mesmo motivo. Embora o cenário seja de decréscimo, especialistas afirmam que os números são preocupantes.

Considerando todos os homicídios – dolosos (quando há intenção de matar), culposos (quando não há) e latrocínios (roubo seguido de morte) – das sete cidades, as vítimas de intervenções da polícia representam um quinto do total (221). Os dados são do Portal de Transparência da SSP (Secretaria da Segurança Pública) de São Paulo e foram levantados pelo Diário.

Benedito Mariano, ouvidor da PM (Polícia Militar), lembra que as polícias de Santo André e São Bernardo costumam figurar entre as mais letais do Estado – conforme levantamento preliminar, o 40º BPM (Batalhão da Polícia Militar) são-bernardense foi o oitavo no ranking de 2019.

Para David Pimentel Barbosa de Siena, coordenador do Observatório de Segurança Pública da USCS (Universidade Municipal de São Caetano), os dados preocupam, ainda que exijam análise detalhada. “Considerando os números absolutos, a polícia da região matou mais do que a polícia de toda a Alemanha no ano passado, então, a polícia (do Grande ABC) é violenta”, assinala.

Segundo Mariano, um dos agravantes é que apenas 3% dos casos são apurados e investigados pela Corregedoria. “A maioria das mortes em ações da polícia é investigada pelo batalhão de origem do policial e isso é ruim porque apenas a Corregedoria tem a competência judiciária necessária. A função do batalhão é o policiamento operacional”, aponta.

Siena salienta que os países com melhores índices de segurança são onde a letalidade policial é baixa. Além disso, ele avalia que mesmo após a redemocratização, a conduta dos policiais continuou seguindo as diretrizes do regime militar.

Os dados de dezembro devem ser divulgados pela SSP até o fim do mês. Na avaliação do ouvidor da PM, estudo preliminar indica que os 12 meses de 2019 tenham aumento de cerca de 10% na letalidade em comparação a 2018, mesmo com o viés de queda.<EM>

Em nota, a SSP garante que morte em decorrência de intervenção policial são investigadas pela Polícia Civil e também por inquérito policial militar instaurados pelos batalhões e pelas corregedorias. O comunicado destaca que “a opção pelo confronto é sempre do criminoso”.

Na região, todas as vítimas eram homens. A maioria era parda (45,45%), tinha entre 18 e 30 anos (40,9%) e estava envolvida com roubo (68,18%) no momento do disparo.

Excludente de ilicitude agrava cenário
Segundo o ouvidor da PM (Polícia Militar), Benedito Mariano, o conceito de excludente de ilicitude – quando atos praticados por agentes de segurança não são considerados crimes – não contribui para o aperfeiçoamento da atividade policial, mas incentiva a letalidade.

Atualmente, o artigo 23 do Código Penal estabelece a exclusão de ilicitude em três casos: estrito cumprimento de dever legal, em legítima defesa e em estado de necessidade. Além disso, a legislação prevê punição em casos de excessos policiais.

Em novembro, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) enviou proposta que amplia o conceito ao Congresso. Se aprovada, haverá excludente de ilicitude em GLO (Garantia de Lei e Ordem), ou seja, em operações das Forças Armadas quando há esgotamento das forças tradicionais de segurança pública.

No Grande ABC, dos 44 BOs (Boletins de Ocorrência) envolvendo morte em decorrência de intervenção policial em 2019, seis foram caracterizados como excludente de ilicitude. O mesmo ocorreu em 11 de 47 BOs da mesma natureza em 2018.

“Isso (classificação do excludente de ilicitude) não pode ser a priori antes de ter uma investigação, é um erro”, afirma Mariano. Ele cita estudo de 2017, quando investigação apontou que 26% das vítimas de ação policial não tinham indício de confronto armado. “Já temos muitos excludentes. Precisa acabar e não ser ampliado”, opina.




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