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Região tem 731 jovens infratores em meio aberto
Por Deborah Moreira
18/04/2011 | 07:23
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Desde janeiro de 2010, é de responsabilidade integral do município o atendimento de adolescentes infratores que cumprem medidas socioeducativas em meio aberto, seja LA (liberdade assistida), seja PSC (Prestação de Serviço à Comunidade). O Grande ABC tem hoje 731 meninos e meninas cumprindo medidas em meio aberto por terem cometido algum ato infracional. Para especialistas, a mudança de valores desses jovens é o grande desafio da ressocialização.

Nos programas municipais, os jovens são estimulados a realizar trabalhos em grupos e oficinas culturais e educativas abordando temáticas que levem a resignificação e construção de valores. Os encontros são realizados semanalmente, mas os adolescentes devem ser incluídos na rede de atendimento, para ter acesso a serviços que vão de oficinas culturais a tratamento de saúde (como nos casos de dependência química).

Em São Bernardo, onde há o maior número de atendidos, 416 adolescentes, eles são estimulados a discutir temas como identidade, cidadania, sexualidade e projeto de vida. Em Diadema, 152 jovens são atendidos por entidade conveniada que encaminha para projetos da prefeitura como Adolescente Aprendiz, escolas de esportes e atividades nos centros culturais e cursos de violão e marcenaria. Também é uma instituição conveniada em Santo André que acompanha os 130 infratores, atendidos em grupo, individualmente e com a família. São Caetano e Ribeirão Pires atendem 21 e 12, respectivamente.

Antes da descentralização da Fundação Casa (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente), instituição vinculada à Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania, em 2006, as medidas eram de responsabilidade do Estado.

O ECA (Estatuto da Criança e Adolescente), lei que garante direitos e deveres, estabelece gradação das medidas: advertência; reparo de danos; prestação de serviços à comunidade; liberdade assistida; semiliberdade e internação.

"Entre os adolescentes corre a informação de que o primeiro delito pode ser cometido, que normalmente vai receber uma advertência verbal ou cumprir medida em meio aberto. E não é bem assim. É preciso levar em conta se o indivíduo é primário, de que maneira praticou o delito e qual sua gravidade, a repercussão que teve na vítima e na sociedade, se apresenta desvio de caráter e se tem convívio sócio-familiar", explicou o juiz Luiz Carlos Ditommaso, da Vara da Infância e Adolescência de São Bernardo.

O juiz ressaltou que o ECA não determina punição para cada infração como ocorre com o Código Penal, que prevê penas e prazos específicos para os tipos de crime. "Por isso aumenta a responsabilidade do juiz da Vara da Infância. Caso haja medida mais rigorosa ou aplicada de forma equivocada pode afetar todo o desenvolvimento desse menino", completou o magistrado.

 

Bons programas têm baixa reincidência

 

A credibilidade dos programas e profissionais envolvidos no trabalho são o que dá respaldo para que juízes confiem a recuperação dos meninos e meninas aos municípios e os encaminhem para meio aberto.

Em São Bernardo, por exemplo, a grande maioria dos jovens infratores é encaminhada para programas do tipo, cerca de 70%. Porém, a prática não é tendência em todos os municípios. "Aqui confio no trabalho da Fundação Criança", ressaltou o juiz Luiz Carlos Ditommaso.

Para a educadora Irandi Pereira, coordenadora do Mestrado Profissional Adolescente em Conflito com a Lei, da Uniban (Universidade Bandeirantes de São Paulo) em São Bernardo, para avaliar os programas municipais é importante levar em conta alguns indicadores.

O primeiro deles é a municipalização do serviço, que garante atendimento mais próximo do local onde o infrator mora. Depois, se há número suficiente de profissionais capacitados na equipe técnica e de socioeducadores. Outro ponto importante é a atuação junto às famílias. "Envolver as famílias no processo é imprescindível, além do atendimento individualizado para contemplar as singularidades de cada um, o que deve ser feito a partir do Plano Individual de Atendimento", frisou a professora.

Para a especialista, é preciso acolher esse menino incluindo-o nas políticas públicas de assistência social presentes no município. Além disso, a sociedade também tem papel importante, incluindo a atuação das escolas, entidades e conselhos.

"A maior parte são indicadores subjetivos. Mas um indicador concreto é o número de reincidentes. E se o jovem reincidiu, qual foi o delito, foi algo mais grave? E o mais importante é refletir o porquê de ele voltar a cometer um delito", enumerou Irandi.

Em São Bernardo, 7% dos adolescentes descumprem a medida socioeducativa em meio aberto. "Aqui não tem segunda chance. Eu aviso: se descumprir a medida em meio aberto vai cumprir internação. Esse número tem aumentado. Ainda está na faixa aceitável, mas já é preocupante", avaliou Ditommaso. O número sobe para 21% de reincidência caso seja levado em conta todo o histórico do adolescente.

Em São Caetano, a reincidência é de 4%. Em Diadema, 4,6%. Ribeirão Pires afirma não haver reincidência e que o número de jovens cumprindo é cada vez menor.

Santo André não informou a reincidência e não permitiu entrevista e visita aos locais onde os jovens são atendidos. Da mesma forma que São Caetano, alegando descumprimento da lei. As cidades de Mauá e Rio Grande da Serra não enviaram dados.

 

Maioria é do sexo masculino e vive com família

 

Segundo levantamento feito pelo Case (Centro de Atendimento Socioeducativo) de São Bernardo, no município a maior parte (66%) dos jovens infratores que cumprem medidas em meio aberto mora em casas próprias, é de famílias com renda acima de três salários mínimos, vive com mãe e pai juntos (37%) ou apenas com a mãe (39%), é do sexo masculino (91%) e primário (79%).

"O maior desafio é dar nova perspectivas a esse jovem", explicou a psicóloga do Case, Maria Lúcia de Lucena.

L.M.R, 17 anos, está em liberdade assistida desde novembro. Roubou celulares com dois colegas de escola que conseguiram fugir durante o flagrante.

"Achei que iria ter de prestar serviço comunitário em alguma repartição. Nunca imaginei que teria atividades como essas. Até fiz oficina de violino, que sempre quis", conta L., que ganhou, aos 14 anos, violino do pai, com que mora em casa própria. A família tem renda mensal de R$ 2.200. L. pediu para mudar de escola para não voltar a encontrar os colegas, está procurando trabalho e quer ser fuzileiro naval.

"É preciso refazer o vínculo com as famílias e reforçar os valores para esses jovens", completou Maria Lúcia.




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