Economia Titulo Poder aquisitivo
Morador da região gasta 7 dias de trabalho para comprar comida

Adquirir carro consome quase 1 ano; quem ganha salário mínimo leva 20 dias para custear cesta básica e 3 anos para veículo

Soraia Abreu Pedrozo
Do Diário do Grande ABC
05/03/2021 | 00:06
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Denis Maciel/DGABC


O morador do Grande ABC que possui renda média de R$ 3.234,89 gasta quase sete dias de trabalho (6,81), ou 59,92 horas, para comprar comida e produtos de limpeza. Isso se for considerado o valor da cesta básica pesquisada pela Craisa (Companhia Regional de Abastecimento Integrado de Santo André), composta por 34 itens de primeira necessidade, que em janeiro valia R$ 881,06. Caso o profissional ganhe um salário mínimo (R$ 1.100), são necessários 20 dias de labuta ou 176,21 horas, na mesma comparação. Se, na outra ponta, os vencimentos chegarem a dez mínimos (R$ 11 mil), é preciso apenas dois dias de labor ou 17,62 horas.

Para comprar carro popular de R$ 45 mil, no entanto, enquanto o profissional que recebe o salário médio da região leva 347,7 dias (3.060,38 horas), ou quase um ano, quem ganha dez salários mínimos precisa de 102,09 dias (898,41 horas) – pouco mais de três meses – e aquele que recebe o piso do mercado de trabalho precisa trabalhar 1.020 dias (8.984,07 horas), ou dois anos e oito meses – considerando que ele apenas pague pelo veículo e não desembolse nenhum centavo com mais nada, incluindo contas de água e luz, assim como cesta básica.

O levantamento integra novo indicador do Conjuscs (Observatório de Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano) divulgado ontem na 16ª carta de conjuntura do órgão e que, a pedido do Diário, realizou cálculos com base no salário médio do mercado de trabalho do Grande ABC, assim como na cesta básica regional e em valores de combustível e dólar atualizados. O objetivo é mensurar o poder aquisitivo em horas e dias de trabalho por faixa de renda – o que, ao mesmo tempo, evidencia a desigualdade ao mostrar o que cada um dos perfis, com as mesmas 44 horas semanais de trabalho, sendo 220 horas mensais, conseguem adquirir em produtos e serviços.

DESIGUALDADE

Na avaliação do coordenador do Conjuscs, Jefferson José da Conceição, responsável pelos comparativos, contribuiriam para reduzir essa distância entre o poder de compra de cada uma das faixas mudanças estruturais tanto na iniciativa privada como na esfera pública. “Discutir política de cargos e salários nas empresas não é tarefa fácil, ainda mais em tempos de pandemia, em que as dificuldades financeiras são maiores. Mas seria preciso que a diferença de salário entre o cargo de diretor e presidente não fosse tão escandalosa frente ao valor de entrada da companhia, pago às funções mais humildes. E, sem transparência, isso dificilmente seria feito”, diz o coordenador, referindo-se ao fato de que países desenvolvidos praticam cultura de divulgação dos vencimentos por função, que não são segredo a ninguém, e evitam que, por exemplo, inclusive pessoas que ocupem o mesmo cargo tenham rendimentos distintos.

Da Conceição também pondera que, com a reforma tributária, a ampliação das faixas do Imposto de Renda e a atualização da tabela, a cobrança de impostos sobre a renda seria mais justa. “A reforma teria de trazer, ainda, a taxação maior sobre bens supérfluos e a desoneração de itens essenciais, como alimentos, o que facilitaria o acesso daqueles que têm menor rendimento, e consumiria menos horas de trabalho”, aponta. “Dentro deste contexto, a incidência de impostos sobre heranças e fortunas de forma mais coerente, ao colocar mais tributo sobre a maior renda, contribuiria ao processo. Temos um dos piores níveis de desigualdade do mundo, e a pandemia só expõe mais essa dura realidade.”

Por isso, segundo ele, o pagamento do auxílio emergencial tem papel importante no momento de redução significativa da renda familiar.


Apenas para abastecer com gasolina, são necessários 5 dias

Considerando que o morador do Grande ABC receba o rendimento médio mensal da região, de R$ 3.234,89, o valor de sua hora trabalhada é de R$ 14,70, já que ao longo de um mês sua jornada chega a 220 horas. O dado integra levantamento do novo indicador que mensura o poder aquisitivo conforme as horas trabalhadas desenvolvido pelo Conjuscs.

Para abastecer o carro com 125 litros de gasolina comum para rodar 1.000 quilômetros por mês na região, considerando que o litro na bomba sai, em média, por R$ 5,19, e encher o tanque custa R$ 648,75, o trabalhador do Grande ABC precisa ‘investir’ cinco dias de trabalho ou 44,12 horas.

Se o objetivo for alugar apartamento no Litoral Paulista por quatro dias de feriado prolongado, ao custo de R$ 1.000, o profissional deve desembolsar o equivalente ao trabalho de quase oito dias (7,73) ou 68,01 horas.

Já para adquirir um smartphone de R$ 1.500, são necessários quase 12 dias de labuta (11,59) ou 102,01 horas de serviço.

A alimentação fora de casa também pesa no bolso. Quatro almoços fora de casa no mês, no Grande ABC, requerem pouco mais de um dia (1,24) ou 10,88 horas trabalhadas. O combo de um lanche tradicional do McDonald’s, vendido por R$ 26,90, vale 21% do dia de serviço ou quase duas horas (1,83).

Para arcar com contas básicas mensais, como a compra de um botijão de gás de 13 quilos, comercializado em média por R$ 90 na região, é preciso trabalhar por 6,43 horas ou dedicar 73% do dia de serviço.

Considerando o consumo de uma casa da região, de 288 kw/h durante o mês de dezembro, de R$ 245,96, quando a bandeira vermelha era cobrada no nível dois, o que deixava a conta de luz mais cara, o ‘preço’ equivalia a quase dois dias de labor (1,90) ou 16,73 horas.

A conta de água no mesmo período, por sua vez, de R$ 243,71 tomando como base consumo de 24 m³ no mês, requerem também outros dois dias de trabalho (1,88) ou 16,57 horas trabalhadas.

Para contratar pacote mensal básico que inclua 120 mega de internet com wi-fi, telefone e canais de TV a cabo, ao custo de R$ 169,78, conforme valor coletado no mês passado, é preciso dedicar pouco mais de um dia de labuta (1,31) ou 11,55 horas.
 




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