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Erro leva jovem inocente à cadeia
Illenia Negrin
Do Diário do Grande ABC
05/07/2005 | 08:53
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O ajudante de funilaria Emerson de Souza Marcelino, 24 anos, passou exatos 27 dias preso no CDP (Centro de Detenção Provisória) de Mauá sem haver cometido qualquer crime. Solto na segunda-feira à tarde depois de quase um mês trancado numa cela superlotada – que tem capacidade para 12 homens e abrigava 42 –, o jovem foi encarcerado ao ser confundido com um fugitivo da cadeia pública de Itanhaém, cidade do litoral paulista.

Souza foi detido na madrugada do dia 8 de junho, ao voltar da casa de um amigo. Já estava perto do bairro onde mora, o Parque das Américas, quando foi parado por uma blitz de rotina da Polícia Militar. Desceu da moto, entregou os documentos e acreditava não haver qualquer irregularidade. Até que o policial pediu que o acompanhasse até a delegacia. Pelo número do RG, o delegado plantonista do 1º DP de Mauá, Renato Camacho, confirmou que se tratava de um foragido e deu ordem de prisão ao rapaz. Souza passou a noite numa cela provisória e foi transferido no dia seguinte ao CDP do município, apesar de alegar inocência.

“Fui acusado de vários roubos. Jurava que era inocente. Mas como eu ia provar que não tinha cometido aquele monte de crimes? Fiquei desesperado”, lembra Souza. A advogada Vivian Alves do Nascimento, depois de indas e vindas ao Fórum de Itanhaém, conseguiu provar que, na verdade, seu cliente havia sido prejudicado por um erro no prontuário.

Segundo ela, funcionários da Justiça do litoral atribuíram ao jovem de Mauá todos os crimes praticados por outro rapaz, Emerson da Silva Marcelino. Além do nome parecido – a única diferença é o sobrenome do meio – os dois têm a mesma idade, 24 anos. Nasceram na mesma cidade, São Bernardo. Têm a mesma cor de pele: branca. E o mesmo nome de pai: Francisco Marcelino. Sem contar que o nome das mães de ambos também são parecidos: a do verdadeiro foragido –  Eliana Aparecida da Silva Marcelino, e a do preso injustamente – Aparecida de Souza Marcelino.

Tantas coincidências – ou um “baita azar”, nas palavras do próprio Souza – fizeram com que os números dos RGs fosse trocados. Ao puxar a ficha de Souza, todos os crimes de Silva estavam listados. Já na ficha de Silva, não consta sequer um acidente de trânsito.

A advogada conta que teve de enfrentar uma peregrinação para conseguir provar que Souza não era Silva. “A Justiça de Itanhaém em nenhum momento demonstrou boa vontade com o meu cliente. Pedi inúmeras vezes que revissem os dados e não fui atendida”, conta Vivian. Ela, então, resolveu agir por conta própria. No processo judicial que apontava Souza como foragido, conseguiu as impressões digitais de Silva. Pediu ao IIRGD (Instituto de Identificação Ricardo Gunbeton Daunt), da Secretaria Estadual de Segurança Pública, que confrontasse com as impressões do jovem de Mauá que estava preso. O resultado: não eram da mesma pessoa.

No final da tarde de segunda-feira, Souza ganhou a liberdade. Muito abatido, foi recebido pela família na porta do CDP. Disse estar aliviado por conseguir provar que era inocente. Mas que o fato de ter sido solto não ameniza o mês de vida que passou detido. “Vou tentar retomar a minha vida. Mas quero que se faça justiça. Admitir o erro não é suficiente para mim.”

O jovem conta que passou 10 dias sem direito a banho de sol, trancado na cela. Só depois de ser transferido para outro pavilhão teve acesso às horas fora do quadrado apertado e frio em que dormia. Banho, só de água gelada. Comida, às vezes boa. “Só de vez em quando”. Jurava que era inocente, mas só os companheiros de cadeia – além dos parentes – o levavam a sério. “Eles falavam que eu não tinha o menor jeito de bandido.”

A advogada de Souza diz que vai processar o Estado pelos danos morais sofridos pelo jovem. Pedirá indenização de, pelo menos, R$ 500 mil. O delegado e diretor interino do IIRGD, Virgílio Guerreiro Neto, garante que o erro será apurado. “Pode ter sido um erro nosso, de troca de prontuários. Mas pode ser um erro da Justiça e das delegacias. Ao procurar pelos dados de Silva, encontraram os de Souza. Como são muito parecidos, acreditaram se tratar da mesma pessoa. Vamos investigar e os responsáveis devem ser punidos.”




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