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A arte oculta do afinador de instrumentos
Nelson Albuquerque
Do Diário do Grande ABC
25/08/2001 | 16:02
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Fim do espetáculo, aplausos para o artista. Uma generosa parte dessa calorosa manifestação do público pode muito bem ser creditada a um profissional oculto: o afinador e reparador de instrumentos. Seu trabalho silencioso garante que o músico demonstre talento por meio de sons de boa qualidade. O serviço não é glamouroso como o do palco, mas tem lá seus reconhecimentos e não apresenta tantos concorrentes no mercado.

No Grande ABC esses profissionais são raros, mesmo com orquestras em três cidades, músicos espalhados em bandas e conjuntos e alunos em várias escolas. “Talvez não perceberam que o mercado aqui é crescente”, diz Dorothéia Elke Gruber, 30 anos, violinista da Sinfônica de Santo André e professora na Fundarte (Fundação das Artes) de São Caetano.

Em instrumentos como o violino, o próprio artista faz a afinação e providencia a troca de cordas e pequenos acessórios. Os maiores consertos ficam por conta da mão-de-obra especializada, o chamado luthier. “Não vivemos sem eles”, afirma a violinista, que garante não lembrar dos reparadores só nos momentos ruins, como no caso de uma tampa descolada. “Pensamos neles também quando o instrumento é elogiado. Sempre querem saber quem faz a manutenção”, diz. Não são pessoas famosas, mas os afinadores que conseguem reconhecimento entre os artistas.

O piano – pesado e com uma mecânica complexa – exige maiores cuidados. São mais de 220 cordas presas da cravelha a uma harpa feita em ferro fundido, que pesa cerca de 200 quilos. “A pressão de encordoamento chega a mais de 18 mil kg”, afirma o técnico Olívio Valarini, 43 anos, de São Paulo.

Valarini, que fez especialização na Alemanha entre 1979 e 1982, é responsável pela afinação do Steinway & Sons, comprado em 1998 por meio da campanha regional Um Piano Para o Grande ABC e que fica abrigado no Teatro Municipal de Santo André. Foi ele quem preparou o instrumento para as apresentações de Nelson Freire, Arnaldo Cohen e José Feghali no teatro. “A afinação tem de ser feita no ensaio e refeita para o concerto”, diz.

Segundo ele, na hora do serviço, vários aspectos são levados em conta para não comprometer a performance do artista. “A temperatura, a umidade do ar e o calor das luzes interferem nas peças metálicas. Outro detalhe é afinar de acordo com as características da orquestra que vai acompanhar”, afirma Valarini.

O trabalho dos afinadores de piano demora entre uma e duas horas, o mesmo tempo de um concerto ou mais. No intervalo do espetáculo, quando estão de plantão, esses profissionais sobem ao palco para rápidas “limpezas” em alguma nota distorcida. Seus serviços podem custar entre R$ 150 e R$ 300 e também atendem a clientes particulares.

Mercado – A concorrência entre os afinadores de piano não é grande e fica ainda menor na área de concertos e teatros. “Cabem nos dedos de uma mão”, diz o técnico José Luiz da Silva, 41 anos, de São Paulo. Entre seus clientes no Grande ABC estão a Fundação das Artes e o Teatro Paulo Machado de Carvalho, ambos de São Caetano.

“O período entre uma afinação e outra depende do apuro do próprio instrumentista. Normalmente, em uma casa, esse prazo deve ser de seis meses, mesmo que o piano não seja muito usado”, afirma Silva. Para um espetáculo, o trabalho tem de ser bastante confiável: “É preciso dar segurança ao artista”.

O oboé (instrumento de sopro feito de madeira) não é nada popular, mas também conta com oficinas de reparação. Um dos exemplares mais caros chega a custar US$ 6 mil e uma reforma geral pode ficar em até R$ 2 mil.

Ex-músico da Sinfônica andreense, o oboísta Marcos Mincov, 43 anos, toca agora na Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo, mesma cidade onde mantém sua oficina ao lado do também oboísta Roberto de Araújo. “A técnica que usamos foi desenvolvida pelo Roberto, que trabalhou com isso na Alemanha”, afirma Mincov.

O serviço, nesse caso, inclui ajustes nos furos e correções na madeira, que se deformam com o tempo, entre outros detalhes. “A pessoa que toca faz sua própria afinação”, diz. Os sócios estão com a loja em reforma para atender mais clientes e donos de outros instrumentos de sopro, como o fagote.




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