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Mais de 77 mil pessoas venceram a Covid-19 no Grande ABC

Pacientes relatam momentos de angústia, com desconfortos físicos e emocionais, e alertam sobre os cuidados para evitar doença

Por Aline Melo
Do Diário do Grande ABC
20/12/2020 | 00:01
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Nario Barbosa/DGABC


Falta de ar. Cansaço. Febre. Fraqueza. Falta de olfato e paladar. Medo de morrer. Esses são alguns dos sintomas relatados por quem teve a Covid-19, doença que já contaminou 94.828 pessoas e ocasionou 3.332 mortes no Grande ABC. Apesar desses tristes números, mais de 77 mil pacientes já venceram a luta contra o novo coronavírus e relatam os momentos que passaram entre o diagnóstico e a cura. Os dados se referem até o dia 18 de dezembro.

A assistente pedagógica Elena Silvia Mioto, 54 anos, mora em São Caetano e teve o diagnóstico de Covid-19 em agosto, após realizar um teste do tipo PCR (aquele se faz com o cotonete). Havia a estimativa que ela tivesse se contaminado há uma semana, então fez mais uma semana de isolamento, mesmo sem qualquer sintoma. Para sua surpresa, em novembro, passou a ter sintomas da doença e após acionar o serviço municipal de atendimento domiciliar foi internada com a saturação baixa. Em oito dias, um novo exame PCR teve resultado positivo para a doença.

A tomografia e o exame de sangue confirmaram a doença e um falso positivo da primeira vez. Foram 17 dias de internação na UTI (Unidade de Terapia Intensiva), falta de apetite, saudades dos familiares e amigos e inicialmente uma intranquilidade, que foi passando, relata Elena, com bons pensamentos e o atendimento carinhoso da equipe médica. A fé também foi uma grande aliada. “Rezava toda hora e me lembrava de toda minha vida, dos meus pais, dos meus tios que já estão no plano espiritual, do amor que sempre tive pelas minhas crianças. Deus nos devolve aquilo que mais amamos.”

A falta de ar constante foi das coisas mais difíceis e só não foi necessária a entubação graças ao empenho dos fisioterapeutas, afirma Elena. Mais uma vez, a fé esteve ao lado da assistente pedagógica, que passou a acompanhar diariamente à missas pela TV. “Essa experiência me deixou a importância dos cuidados com a nossa saúde. Hoje vejo tudo diferente, serei uma defensora do ar. Covid não é brincadeira e eu peço, por favor, que as pessoas se cuidem”, conclui.

Não são apenas as pessoas mais velhas que sentem com intensidade os efeitos da doença. A publicitária Caroline Oliveira, 23, moradora de Mauá, recebeu o resultado positivo em 27 de outubro, mas há pelo menos cinco dias vinha apresentando sintomas. A jovem não chegou a ficar internada, mas teve muito cansaço, falta de ar e dores nas costas ao respirar. Os medicamentos que tomou eram muito fortes e acabaram afetando demais seu estômago, então mal conseguia me alimentar. Em pouco mais de duas semanas emagreceu cinco quilos.

Carol avalia que o momento mais desafiador esteve relacionado à sensação de fraqueza e falta de ar, quando mal conseguia ficar em pé e tomava banho com auxílio da mãe. Em uma ocasião, julgou que pudesse tomar banho sozinha, mas quase desmaiou no banheiro. “Isso acabou me abalando bastante, porque há poucos dias eu estava ótima e de repente me ver nessa situação foi bem triste”, relembra. Para a jovem, o aprendizado dessa situação toda foi dar mais valor à pequenas coisas como ter ar nos pulmões pra cantar uma música que gosta, ou conseguir andar normalmente pela casa. “Além disso, valorizo ainda mais o ato de cuidar de mim, da minha saúde e de quem eu amo”, finaliza.


Moradora de Diadema, a jornalista Hannah Assis, 25, teve Covid-19 em maio. Os pais e a irmã também se infectaram, mas ela desenvolveu a forma mais grave da doença. Com 30% do pulmão comprometido, passou sete dias internada e tarefas simples como subir escadas ou fazer conferências se tornaram grandes desafios. Após um mês de recuperação com tratamento medicamentoso e de fisioterapia, restou a certeza de que é preciso dar valor para o convívio familiar e para cuidar de si mesma. “Muita gente ainda duvida, porque os números acabam, para muitos, se tornando meras estatísticas, mas já são mais de 180 mil brasileiros que perderam a vida. A Covid-19 e´ real e evitar aglomeração, higienizar as mãos e usar máscara é um pacto de responsabilidade coletiva.” 

Convívio com a doença acentuou ansiedade

Um dos sintomas comuns relatados por pacientes que tiveram a Covid-19 foi a ansiedade. Professora e moradora de Santo André, Sandra (nome fictício), 42 anos, teve a doença em agosto. A munícipe já se trata há dois anos de transtorno de ansiedade generalizada. Tanto que inicialmente, achou que a falta de ar fosse mais uma crise. Resolveu procurar o médico porque faz parte do grupo de risco e confirmou a contaminação pelo novo coronavírus.

Com o diagnóstico positivo, o filho de 6 anos foi ficar com os pais da professora, que narra que todos os dias de sua recuperação foram de muita angústia, ansiedade e pavor, questionando as pessoas com quem tinha tido contato para saber se elas apresentavam algum sintoma. Vivenciou, sozinha, fortes crises de ansiedade. “Tinha tontura, muita falta de ar que eu não sabia se era da Covid ou do transtorno, além de medo. Medo de morrer, medo de matar alguém”, relembra.

A professora relata que mesmo após ter sido curada, segue com muito medo de se contaminar novamente, de contaminar outras pessoas. Segue fazendo isolamento, sem comer fora, evitando até pedir comida, porque o receio ainda é muito grande. “Quando vejo aglomeração tenho crises de ansiedade, mesmo que eu passe de carro em frente a um bar, na hora tenho que me controlar de alguma forma porque o medo só aumenta”, finaliza.

A psicóloga Vivian Carvalho, moradora de São Caetano, 43, foi diagnosticada em 17 de novembro. Apesar de não ter ficado internada, sentiu-se muito mal por cerca de cinco dias.

As crises de ansiedade foram frequentes, pelo desconhecimento do que poderia acontecer e por muitos relatos de tantas pessoas que não se recuperaram. “O maior desafio foi lidar com o medo. Um pavor de ter que ser entubada e uma revolta vendo tantas pessoas saindo, não se cuidando, enquanto eu, que tomei todos os cuidados, acabei de me contaminando”, afirma.

Desde março, Viviam sai de casa apenas para trabalhar, e depois da doença, tem tentado melhorar a sua alimentação e se afastar de tudo o que contribui para o aumento da sua ansiedade. “O grande aprendizado é que ninguém é imune. Parece que a situação está longe de você, mas de repente acontece, ela bate na nossa porta e temos que lidar com isso”, pontua. “A gente tem que se cuidar e tudo que as pessoas puderem fazer para tratar da imunidade, da mente, é muito importante. Quem passou por esse período, mesmo não tendo Covid, mas não aprendeu nada com isso, é uma pena”, conclui. 

Quarta onda será de transtornos psicológicos

Especialistas da área de psicologia e psiquiatria afirmam que a sociedade deve viver a chamada quarta onda de Covid-19, mas não de casos da doença e sim de transtornos psicológicos. Ansiedade, medo e até quatros de depressão tem sido relatados, tanto por quem enfrentou a doença, tanto por quem não se contaminou.
Psicólogo clínico e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie em Campinas, Marcelo Santos destaca que desde março, no início da pandemia, a saúde mental das pessoas vem sofrendo constantes desgastes. Além do medo da doença, todos se afastaram do convívio social, muitos passam mais horas trabalhando de casa, tudo somado à grande quantidade de notícias ruins que são divulgadas diariamente.

“As pessoas ficaram mais preocupadas com o futuro e mais inseguras com o seu presente. Se preocupam com a limpeza, temem o contágio, ser internado, entubado. Ao passo que quem teve a doença, se apega ao presente. Querem viajar, viver, recuperar um tempo que parece perdido. A doença foi um catalisador de mudanças para algumas pessoas”, cita. Tudo isso, avalia o especialista, joga luz sobre a importância da saúde mental, que por muito tempo foi negligenciada.

O psicólogo Roberto Debski destaca que a sensação de perda de controle, e consequente ansiedade e estresse foi a tônica deste ano, além de outras consequências como o aumento dos casos de depressão e suicídios. “Sempre que há situações altamente traumáticas, sequelas psicológicas podem acontecer, levando as pessoas a se sentirem vulneráveis, frágeis, cheias de incertezas e medos. Trabalhar estas questões e buscar aumentar a resiliência se faz fundamental para a superação”, opina.

Psicanalista e pós-graduado em neurociência, Gregor Osipoff afirma que é importante ter bons pensamentos e boas práticas de saúde, para que haja não só a recuperação física, mas também a emocional. “Quando as pessoas têm um sofrimento com uma sobrecarga emocional muito grande, é preciso procurar profissionais especializados na área para poder ter uma escuta. As pessoas precisam falar e ser ouvidas”, alerta.




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