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Desafios, alegrias e frustrações pelo mundo do futebol

Jogadores deixam Brasil ainda jovens e enfrentam muitas adversidades atrás de futuro melhor

João Victor Romoli
Especial para o Diário
22/10/2018 | 07:00
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Arquivo Pessoal


Atuar no futebol europeu. Esse é o sonho da maioria dos jovens que começam a jogar no Brasil. O desejo vem de criança e virou rotina, principalmente, nas categorias de base dos clubes, que esperam por propostas para poder liberá-los a agremiações de fora do País.

Tudo isso, porém, é cercado de incógnitas, já que muitos têm de arriscar, superar a enganação de alguns empresários e vencer a dificuldade da adaptação. A região, por exemplo, conta com diversos jogadores que passaram por testes na Europa e se firmaram. Outros, no entanto, foram reprovados ou ainda estão em período de avaliação.

Esse último, aliás, é o caso de Vinícius Moraes, meia de 17 anos, que está há dez dias treinando no juvenil do Porto, de Portugal. O atleta, que pertence ao Mauá FC, tem suas despesas pagas pelo clube europeu. “Eu estava treinando normalmente no Mauá FC quando surgiu o interesse. É o sonho de qualquer jovem. Logo fui atrás de passaporte e da autorização para viajar, e está tudo tranquilo. Estou em uma casa que o Porto disponibilizou e a alimentação está paga também”, disse o jovem, que disputou o Paulista Sub-17 desta temporada pelo clube do Grande ABC. Moraes terá de esperar, uma vez que o resultado do teste sairá somente no início do ano que vem.

Ele, aliás, espera repetir o feito de Pedro Marlon do Prado Rodrigues, 18, ex-morador de São Bernardo e que conquistou espaço no Getafe, da Espanha. Após quatro anos no Palmeiras, o volante está no juvenil da equipe europeia desde o ano passado.

“Tive algumas propostas de clubes do Brasil, mas, como todo garoto, o sonho é jogar na Europa. Além disso, conciliou com o desejo da minha família de querer se mudar para cá. Foi um impulso a mais. Aqui eles têm costume diferente, já que no Brasil é tudo em alojamento. O pessoal que estava intermediando a negociação tinha espaço preparado para mim. Uma casa para os atletas, além de transporte e moradia”, contou o jogador, que chegou a disputar a Copa Diarinho de Futebol Society e a Copa Ouro pelo São Bernardo, além de futsal no Mesc (Movimento de Expansão Social Católica), em São Bernardo, e futebol de campo no CAD (Clube Atlético Diadema).

“O Grande ABC é um lugar de onde sempre saem grandes jogadores. Foram bons períodos. Estava em casa. Acho que até por isso minha adaptação na Espanha foi um pouco complicada. São companheiros novos, metodologia diferente. Tem que se adaptar ao clima, já que é muito frio. A cultura, a língua, tudo é muito dificil. Demorei uns três, quatro meses para pegar o jeito. No Palmeiras eu já viajava para fora (Itália, Japão e Holanda). Tive um pouco de medo de não dar certo do jeito que eu pensava, principalmente por não ter amigos por perto”, completou.

A Espanha, ao lado de Portugal, são considerados os países que mais abrem as portas aos jovens talentos. Casos mais comuns são de jogadores que têm a primeira oportunidade nas divisões intermediárias de um país e evoluem com as temporadas.

Outro destaque é o meio-campo Tales Lovalho, 17, também de São Bernardo e o mais novo dos atletas citados. Ele atua no Moscardo, clube espanhol com rótulo de revelar jogadores para o país. Indicado por técnicos com quem trabalhou no Brasil, ele contou que sua chegada teve diversas complicações e destacou que só permaneceu porque não queria sair fracassado.

“Cheguei na Espanha em 2017. Minha adaptação foi muito complicada. A cultura nova e a saudade da família pesaram. Não conhecia nada. Só vim pelo meu sonho. Sempre ultrapassei essas barreiras, tinha desejo. Mas, realmente, tive muito medo de não dar certo. Não queria voltar como fracassado para o Brasil”, falou Tales, que atuou por quatro anos no Clube Atlético Diadema, além do Flamengo de Guarulhos, em 2015.

Idade estourada fez meia ter dúvida

Márcio Ferrari, de São Bernardo, viveu situação diferente às de muitos atletas jovens que estão na Europa. O meia só conseguiu assinar contrato fora do País no ano passado, quando já tinha 21 anos. Como muitos que sonham ser jogadores de futebol, ele passava por momento de incerteza e a saída do Brasil aconteceu ‘no limite’.

A oportunidade, aliás, veio na Terceira Divisão de Portugal, quando assinou contrato com o Vizela. Após se destacar, o atleta se transferiu para o Montalegre, clube da mesma divisão – atuou em quatro jogos na temporada profissional e marcou um gol pela Taça de Portugal, diante do Peniche.

“Aconteceu na hora certa. Fiz minha base por 13 anos no Corinthians e fiquei sem contrato em março do ano passado. Mas, por meio dos meu representantes, que me deram muito apoio, consegui essa transferência. É o sonho de todos os jogadores chegar à Europa. Estou na Terceira Divisão aqui em Portugal, e agora preciso dar um passo por vez para chegar ao alto nível”, projetou o atleta são-bernardense.

O desespero de ficar sem clube em idade estourada foi decisivo para que Márcio aceitasse o desafio de atuar em Portugal, que tem o mesmo idioma do Brasil. Mesmo assim, ele precisou da ajuda de seus agentes no início dessa aventura.

“No começo, meus empresários alugaram casa para mim. Passaram período junto e me acompanharam até os primeiros treinamentos. Depois, o clube disponibilizou casa, além de restaurante para almoçar e jantar. Foi importante, porque todos nós temos que nos adaptar o mais rápido possível para enfrentar os desafios. O futebol aqui é muito diferente ao do Brasil, muito intenso e agressivo. O clima aqui é complicado. Peguei -1°C para treinar”, disse o meia.

Empresário explica mudanças e admite ver golpes em garotos da base

Principais responsáveis por abrir portas aos jovens na Europa, os empresários ainda têm a profissão colocada em xeque. Isso porque acreditar em sucesso fora do País se torna quase aposta diante de casos de enganação e de golpes em atletas.

Até por isso, hoje, para ser agente-Fifa, é obrigatório ter ficha e cadastro na CBF, ficando com título de intermediário de negociações. “O regulamento mudou. Nenhuma pessoa física pode possuir parte de direitos. É permitido prestar serviços a clubes e atletas. Não posso trabalhar pelos dois na mesma transferência”, disse o empresário Alexandre Oliveira, dono da Planet Soccer.

Até pela desconfiança, o agente admitiu que existem golpes no futebol. “O que mais vejo é agente fazendo promessas para garotos da base, tentando iludir. Acho que fica muita loteria. De alguns tempos para cá essa profissão ficou mal explicada. Só querem ganhar dinheiro”, afirmou.

Andreenses atribuem fracasso ao idioma

Apesar de diversas situações de sucesso, o futebol brasileiro também acumula frustrações. Esse foi o caso da dupla de atacantes do Santo André, neste ano. David Ribeiro e Matheus Santiago, ambos aos 21 anos, passaram por um mês de testes no Basaksehir, da Turquia, mas não foram aprovados. Com isso, tiveram de retornar à equipe andreense, na qual entraram em campo novamente pela Copa Paulista.

Ao Diário, David admitiu tristeza por não ter ficado na Europa, sonho que tem desde criança. “Para falar a verdade, foi uma frustração. Fiquei triste por não ter permanecido lá. Todo jogador sonha atuar no Exterior. Mas foi experiência ótima, aprendi algumas coisas do futebol europeu, coisas táticas. É trabalhar para ter oportunidade novamente.

Levantar a cabeça. Não posso me abalar, senão é pior”, afirmou o atleta, que, ao lado de Matheus Santiago, contou com hotel e refeições pagas pelo clube turco.

Os dois participaram de treinamentos em todos os dias da semana, o que se tornou um dos fatos predominantes para a não permanência. Santiago contou que o idioma ultrapassou o esforço feito dentro de campo.

“A dificuldade foi a questão da comunicação. O técnico tentava explicar questões para a gente, mas não conseguia por causa do idioma. Fico chateado porque dei meu melhor e, infelizmente, não deu certo. Eu o David tentamos fazer o máximo para ficar e é claro que voltamos chateados”, lamentou o jogador, que chegou a atuar por dois anos pelo Ludogorets Razgrad, da Bulgária. 




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