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'Forças políticas' forjaram as notas
Bruno Ribeiro
Do Diário do Grande ABC
11/05/2008 | 07:05
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Falando pausadamente e sempre olhando nos olhos do entrevistador, o reitor e presidente da Fundação Santo André, Odair Bermelho, negou as acusações que pesam contra ele, deu uma longa explicação sobre os motivos da viagem para o Maranhão e apresentou seus pontos de vista sobre a falta de alunos em diversos cursos da entidade e sobre a oposição que a reitoria sofre. Confira abaixo os principais trechos da entrevista.

DIÁRIO - O Sr. fez essa viagem para o Maranhão?

ODAIR BERMELHO - Fiz. Mas vou explicar o porquê desse roteiro. Minha antiga chefe de gabinete e o marido dela, também professor da Fundação, têm muita ligação com as vias campesinas e com o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra) e ambos me propuseram que eu trouxesse para a Fundação um curso para os assentados do MST, que seria uma novidade para a região e o País. Passei a pensar na idéia. Culminou que, no período em que fecharíamos acordo com o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e com o MST, haveria a reunião da SBPC (Sociedade Brasileira de Pesquisa Científica). Essa professora perguntou o que eu achava de levar essa experiência para a SBPC, no Ceará. Concordei. Mas a SBPC informou que não seria possível apresentar um curso que ainda seria implementado, e que seria interessante que nós fôssemos ao congresso conhecer a dinâmica da SBPC. Era um mês de julho e aconteceu o seguinte: havia um funcionário, nosso auditor, e em conversas descobri que ele iria para Fernando de Noronha. Falei ‘estou indo para o Ceará', e ele me perguntou se eu não queria ir junto para Noronha. Combinamos de nos encontrar e, de lá, eu segui para o Ceará. De fato, foi o que ocorreu. Já viajei muito com funcionários da Fundação. Quando era para cumprir o roteiro oficial, os gastos eram da Fundação. Se fazíamos outro roteiro, os gastos eram por nossa conta. Na SBPC, primeiro fui ver o que estava acontecendo em Fortaleza. Fiquei sabendo que, naquela época, havia uma pessoa chamada Bruno da Costa de Albuquerque Maranhão, - cuja família era muito tradicional - que havia fundado o MLST (Movimento de Libertação dos Sem-Terra), com mais de 100 assentamentos. Para mim, era interessante conhecer esses assentamentos. Então fui para o Maranhão. Fui com o auditor da Fundação. Fizemos o trajeto todo por terra. Percorri o Maranhão e fui descendo até o Piauí. Cheguei até a cidade de Tutóia, e voltei por dentro do Piauí, procurando assentamentos. Aí voltei para o Maranhão, depois para o Ceará e, então fui à São Paulo, decidido a fechar o convênio do curso para os assentados. E então trouxe a prestação de contas.

DIÁRIO - Esse roteiro é a justificativa para os altos custos de refeições e táxis durante a viagem?

BERMELHO - Eu trouxe a minha prestação de contas, que foi assinada pelo pró-reitor da época e pelo chefe do departamento financeiro. Se houve alguma adulteração, foi lá no setor financeiro. Se uma nota é falsificada, o financeiro não deixaria passar. Se houve adulteração, não fui eu quem fiz. Não faria adulteração em uma nota fiscal no valor de R$ 300. A viagem de um mês eu realmente fiz. Mas não estive em uma jornada da Universidade Federal do Maranhão e não falsifiquei um recibo. Aquelas assinaturas podem até ser minhas, mas eu não confirmo.

DIÁRIO - Então o sr. atribui a quê essas falsificações?

BERMELHO - Desde o ano passado, com aquela invasão toda, as forças políticas atuantes na Fundação são grandes. E forças políticas buscam o poder. Eu atribuo isso a essas forças políticas, mas não vou dizer que são grupos de professores ou funcionários. Na invasão, que durou três meses, havia muita gente de fora (da Fundação). Desde que você tem a reitoria invadida e gente que não é daqui, pode aconteceu de tudo.

DIÁRIO - Mas o sr. recebeu os reembolsos dessas notas?

BERMELHO - Isso eu não sei. Estou pedindo os extratos das contas, mas eles não vêm de um dia para o outro. São extratos e microfilmes dos cheques. O departamento financeiro avisava que havia reembolsos e eu mandava depositar na conta. Mas não ficava conferindo. Confiava que os funcionários fariam os pagamentos. Não ficava olhando a conta para ver se depositaram R$ 100 ou R$ 200.

DIÁRIO - E por que manter o silêncio (que durou seis meses) sobre todas as acusações?

BERMELHO - Estive com o promotor da Curadoria de Fundações do Ministério Público, Airton Grazioli, e ele disse que era melhor não me manifestar à imprensa. Para mim, teria sido melhor falar. Como o promotor estava investigando a Fundação, quem seria eu para contrariá-lo?

DIÁRIO - Como o sr. vê a investigação criminal promovida pelo Gaerco?

BERMELHO - Muito tranqüilamente. As contas da Fundação têm aprovação do Tribunal de Contas do Estado e do Ministério Público. Sofrem controle da Câmara Municipal e da Prefeitura. Se as contas não estiverem em ordem, serão barradas.

DIÁRIO - E os pedidos de afastamento, mesmo que temporário, que vêm até do prefeito João Avamileno (PT)?

BERMELHO - Aí vejo uma questão muito importante, que é a autonomia universitária. Sou um reitor eleito e tenho um mandato. O prefeito quem me nomeia, mas quem me destitui é o MP após ouvir o Conselho Diretor. Se eu me afastar, estou partindo do princípio que tenho alguma culpa. Permanecendo, reafirmo a presunção de que sou inocente até que se prove o contrário.

DIÁRIO - O senhor tem sofrido uma forte oposição de grupos da Fundação. Existe uma saída para essa situação?

BERMELHO - Oposição existe, pois as forças políticas atuantes na Fundação são grandes. As pessoas aqui são muito politizadas. É ingenuidade pensar que não haverá uma reitoria sem oposição na Fundação. Tenho 33 anos de serviços na educação, fiz parte de greves e até fui preso por uma noite. Tenho um filho que se formou na Escola Politécnica que invadiu a reitoria da faculdade dele. Eu tenho essa noção e compreendo essa oposição. Minha saída é o diálogo. Mas, por conta das pessoas que vêm de fora, muitas vezes isso é impraticável. Não é interessante para elas.

DIÁRIO - E o que fazer com a Fundação Santo André? Como trazer mais estudantes para o colégio e para os cursos que sofrem esvaziamento?

BERMELHO - Acho que tudo isso denigre a imagem da instituição. Mas que ela ainda sobrevive, e bem, por conta da tradição que tem. Essa tradição se criou pelo corpo docente e a qualidade de ensino. Não podemos esquecer que há uma crise no mercado. Há curso com carga horária reduzida e a preços que seriam impraticáveis sem deixar de lado a qualidade. Aliado a um outro problema que atinge a Fafil em cheio: as licenciaturas. É sabido que professor é mal-remunerado. Aí os alunos não procuram mais os cursos. Paradoxalmente, os cursos da Faeco (Faculdade de Administração e Economia) e da Faeng (Faculdade de Engenharia) são muito procurados, porque a busca do mercado é grande e a remuneração é boa. Temos de tentar modernizar os cursos da Fafil para atrair alunos. Minha gestão é pautada pela abertura e manutenção de cursos. E não pelo fechamento. Da mesma forma, acho que o colégio não se atualizou, e a gente já colocou para o Conselho Diretor o encerramento desse modelo, com a abertura de um colégio acoplado à modernidade da Faeng, ouvindo a comunidade. Nosso País pede uma formação de tecnólogos. Temos de mesclar a formação cidadã que o colégio tem com uma formação de tecnólogos.




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