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Veja como são as duas montagens de Ricardo III em cartaz
Por Alessandro Soares
Do Diário do Grande ABC
24/06/2006 | 08:43
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Dois Ricardo, dois Shakespeare, duas narrativas, mas com a mesma intensidade. Duas peças Ricardo III, de William Shakespeare (1564-1616), estão em cartaz em São Paulo, uma no Ágora Teatro, outra no Teatro Faap. O mais vil dos vilões dos palcos recebe dois tratamentos dramatúrgicos para expor seus atos fratricidas sanguinários. As encenações, modernas, sem maneirismos moderninhos; a atuação dos protagonistas, competentes. São espelhos complementares.

Em ambas ressoa o triunfo da vontade sobre o destino, a ação individual por cima da ética, o vacilo conivente de seus pares, o cada um por si. As dramaturgias respeitam o texto com cenografia realista no Ágora e aproximações contemporâneas na Faap; ótimo figurino na Faap, excelente aproveitamento do palco em três planos no Ágora.

Ricardo diz que comete suas vilanias por ressentimento. Mas é extremamente racional ao maquinar seus assassinatos para chegar ao poder, ele que era o sétimo na linha de sucessão. Sem sujar as mãos de sangue, mata irmão, sobrinhos e ex-companheiros. A certa altura da peça um resignado ex-primeiro-ministro diz que o poder não reside em nós, mas é concedido. Portanto, pode ser tomado. Ao final, Ricardo trocaria tudo, todo o seu reino, por um cavalo.

Celso Frateschi, que adaptou e protagoniza a peça do Ágora dirigida por Roberto Lage, estava desde 2000 envolvido com a tradução e a produção do espetáculo. Jô Soares foi convidado pelo ator Marco Ricca, que protagoniza a peça na Faap, para traduzir e dirigir o espetáculo que está em produção há cinco anos.

Ricardo é um Narciso avesso de humanismo que ama a si sobretudo. Coxo, corcunda e com defeito no braço (Frateschi se vale de gestos, com poucos adereços, e Ricca, com mais adereços). Mas seduz com lábia e incentivos imorais os que lhe servem (Frateschi, ardiloso; Ricca, colérico). Os demais personagens gravitam-lhe, todos com seus momentos em cena. Entre os destaques, Renata Zhaneta, preparadora de atores da ELT (Escola Livre de Teatro de Santo André), no Ágora. É uma rainha que perde o poder, mas mantém a majestade, ao passo que Denise Fraga, na Faap, é melodramática e engasga na dicção. Glória Menezes, como rainha mãe na Faap, surpreende.

O texto de Jô Soares tem ritmo mais ágil e até um tom didático. A tradução de Frateschi é mais completa, e sua peça mais longa, mas igualmente envolvente.

Shakespeare captou a base da ética moderna e criou personagens cujas relações expõem o individualismo a todo custo. A tradução de Frateschi não ressalta semelhanças com o atual momento político do país. Optou pelo comportamento individual como um todo, político ou civil. Jô Soares abre brechas para atores jogarem cacos à platéia sobre a falta de ética entre políticos.

A peça surgiu nos primórdios do capitalismo e da era moderna, e é sobre o ocaso desta que as duas adaptações coincidentemente se debruçam.

Ricardo III – De William Shakespeare. No Ágora Teatro, com direção de Roberto Lage e adaptação de Celso Frateschi – r. Rui Barbosa, 672, Bela Vista, São Paulo. Tel.: 3284-0290 (bilheteria abre às 14h). De qui. a sáb. às 21h; dom. às 19h (170 minutos de duração, com intervalo). Ingr.: R$ 40. Até dia 27/8. Censura: 14 anos.

No Teatro Faap, com direção e adaptação de Jô Soares – r. Alagoas, 903, Pacaembu. Tel.: 3662-7233 (bilheteria abre às 14h). De qui. e sex., às 21h30; sáb. às 21h; dom. às 18h (120 minutos de duração). Ingr.: R$ 50 (qui. e sex.) e R$ 60 (sáb. e dom.). Censura: 12 anos. Até dia 27/8. Censura: 12 anos.




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