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TV Cultura resgata o teleteatro
Por Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
14/05/2005 | 15:17
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Saudade do teleteatro? A TV Cultura, mais que depressa, resgatou o modelo de teledramaturgia que fez sua fama há cerca de 30 anos e estréia neste sábado o projeto Senta que Lá Vem Comédia. O programa recicla o formato de captar em vídeo encenações teatrais e, neste primeiro instante do programa, o privilégio é das comédias. Destas, a que inaugura a série é Defeito de Família, adaptada de texto de França Júnior redigido no século XIX. Gravada no Teatro Maria Della Costa, a montagem vai ao ar neste sábado, pela emissora estatal, às 22h.

O Senta que Lá Vem Comédia espera realizar 26 telepeças, das quais oito já estão gravadas e serão exibidas ao longo deste ano, sempre aos sábados. A próxima gravação está agendada para segunda-feira que vem (16), às 21h, no Teatro Maria Della Costa (r. Paim, 72, Bela Vista, São Paulo. Tel.: 3256-9115). A montagem escolhida para a data é Greta Garbo, Quem Diria, Acabou no Irajá, baseada em texto contemporâneo de Fernando Mello e interpretada pelos atores Bárbara Paz e Dalton Vigh. O espetáculo é aberto ao público e tem entrada franca - os ingressos serão distribuídos a partir das 20h, na bilheteria do Maria Della Costa.

O inaugural Defeito de Família proporciona uma idéia do que pretende o projeto. O texto de França Júnior (1838-1890), patrono da cadeira número 12 da Academia Brasileira de Letras, condensa bem os caracteres do comediógrafo carioca que trilhou direção semelhante à de Martins Pena. Concluído em 1870, detalha os preparativos do casamento entre uma mocinha de família (Amanda Acosta), filha da cínica Gertrudes (Arlete Montenegro) e do matuto Matias (Luiz Serra), e um pretendente de bens polpudos (Cláudio Fontana). Mas por trás das vésperas dessas núpcias, rola uma patifaria das grandes, como diria o mordomo alemão Ruprecht.

É uma comédia de costumes, caricatural e com inclinações ao pastelão, mas ciosa dos vícios da sociedade que regia (e desobedecia) as normas de então. Esse núcleo familiar concentra a substância social da burguesia do século XIX. O pai é um capiau que se expressa de forma ultracoloquial, sem se avexar ao falar "mões" em vez de mãos e "alamões" no lugar de alemães. É o representante da identidade de raiz de um país, ainda virgem à padronização comportamental vinda do exterior, representada por sua mulher, defensora inflexível e hipócrita dos bons modos. A filha, enredada com um aparente amor paralelo, delega a seu casamento com um noivo endinheirado a manutenção desse modelo e da saúde financeira da família. Há também o mordomo alemão, um padrão estrangeiro a ser seguido.

Defeito de Família digere tudo isso em um texto agradável, facilitado pela direção de John Herbert nessa montagem para a TV Cultura, com trechos musicais acompanhados ao vivo pela banda de Tato Fischer. O formato desse primeiro episódio do Senta que Lá Vem Comédia tem o caráter de registro da montagem teatral; são poucos os desafios técnicos ao suporte. Mas uma vantagem há de ser sublinhada: reconhece e não tenta esconder sua natureza de teatro televisionado. Entre tomadas gerais e planos americanos, numa edição econômica, são disparadas na tela imagens da platéia que assiste ao espetáculo e o aplaude, sobretudo nas trocas de cenas. Não é teatro querendo se travestir de TV, nem TV fazendo pose, metida a besta porque conta atrás de si com uma linguagem supostamente mais nobre, a do teatro. Um bom sinal, apesar da falta de ousadia na documentação.

Daqui por diante - Após Defeito de Família, estão definidas as exibições de outras três comédias pelo projeto. No próximo dia 21, o horário está reservado para Toda Donzela Tem um Pai que É uma Fera, escrita por Gláucio Gil nos anos 60 e interpretada por Bárbara Paz, Luiz Serra e Jerusa Franco, sob direção de Roberto Lage. O Noviço, comédia-bastião de Martins Pena, é a atração do dia 28, dirigida por Antonio Petrin e com Jairo Mattos e Roseli Papadopol. Em 4 de junho, é a vez de Um Edifício Chamado 200, dirigido pelo veterano José Renato a partir do texto de Paulo Pontes, com Tuca Andrada à frente do elenco. Outras quatro montagens já estão gravadas - entre elas O Primo da Califórnia, de Joaquim Manuel de Macedo, e Os Mistérios do Sexo, de Coelho Neto - mas ainda não têm definida a ordem de exibição dentro da grade da Cultura.




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