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EUA: 'casos de antraz não são coisa de amador'
Fernão Silveira
Do Diário OnLine
17/10/2001 | 01:57
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O governo norte-americano está seguro de que a onda de ameaças envolvendo a contaminação pela bactéria antraz é obra do bioterrorismo. Mais que isso: os casos registrados até agora, especialmente a cepa encontrada no Senado, "não são coisa de amador", nas palavras de uma autoridade do governo ouvida pela rede de TV ABC.

Exames mostraram que o antraz enviado ao gabinete do senador democrata Tom Daschle é extremamente avançado e letal. Isso indica que a autoria do atentado pode ter o apoio de um governo que tem infra-estrutura para manipulação de armas biológicas. Fora os EUA, somente Rússia e Iraque estão nesse patamar, segundo especialistas. Com isso, as suspeitas sobre o país de Saddam Hussein cresceram nas últimas horas.

O governo americano e o próprio presidente George W. Bush não descartam também que Osama Bin Laden e a Al Qaeda estejam por trás da onda de envelopes contaminados que varreu o solo americano e encheu de medo todo o planeta.

Suporte estatal - "Disseram que era uma forma muito forte do antraz, uma forma muito potente que claramente foi produzida por alguém que sabia o que estava fazendo", relatou o senador Daschle à rede CNN - ele não foi contaminado pela carta com a bactéria, entregue em seu gabinete na última segunda-feira.

Para Richard Spertzel, diretor da comissão especial das Nações Unidas que inspecionou armas biológicas no Iraque, a confirmação de um segundo caso de contaminação pulmonar pelo antraz na Flórida levanta suspeitas de que o autor do ataque teve suporte de um governo internacional ou de cientistas provenientes de um Estado que disponha de arsenal químico.

Spertzel explicou à rede ABC que a contaminação pulmonar pelo antraz, a forma mais letal da doença, necessita de uma quantidade limitada de bactérias em um determinado tamanho (entre 8 mil e 10 mil esporos, variando entre um e cinco microns de diâmetro). Caso os esporos sejam menores, explica o especialista, eles serão exalados (e não inalados). Se forem maiores, correm sérios riscos de ficarem retidos em pêlos e mucosas do nariz e da traquéia.

O especialista disse à ABC que esporos nas exatas proporções requeridas pela contaminação pulmonar podem ocorrer na natureza. Mas a chance conseguir captá-los no solo, seu habitat natural, é muito pequena. Assim, conclui Spertzel, um terrorista que pretende usar o antraz para contaminar pessoas com a forma pulmonar da doença terá de cultivar a bactéria.

Outro especialista ouvido pela ABC, Bill Patrick, afirmou que "uma boa munição de antraz" requer mais aparato científico do que ele imagina que a Al Qaeda (rede terrorista do milionário Osama Bin Laden) possa oferecer. Segundo a ABC, Patrick desenvolvia armas biológicas, com antraz, para o governo dos EUA e criou um processo secreto de cultivo da bactéria.

Como russos e iraquianos dispõem do aparato científico capaz de preencher todas as especificidades para o cultivo do antraz como uma arma de disseminação da doença pulmonar, Richard Butler, o antigo chefe do setor de desarmamento das Nações Unidas, tem uma preocupação extra.

Mohammed Atta, que foi apontado pelo FBI como terrorista que teria pilotado um dos aviões na colisão com o World Trade Center, teria mantido encontros em Praga (República Theca) com agentes iraquianos. Butler admite, porém, que ainda não é possível concluir que agentes iraquianos passaram a arma biológica ao piloto egípicio. Os russos estão praticamente descartados, até pelo apoio que vêm dando aos EUA na 'campanha global contra o terror'.

Medo - Mas a ligação com Bin Laden não está completamente descartada. No começo, quando os esporos atacaram funcionários da editora de tablóides American Media (Flórida), o FBI negou qualquer ligação com os ataques a Nova York e Washington. No entanto, nesta terça-feira, o diretor do FBI, Robert Mueller, apontou similaridades entre duas correspondências infectadas pelo antraz.

Durante uma palestra a senadores, Mueller revelou que tanto a carta enviada ao democrata Tom Daschle, em Washington, quanto aquela mandada ao âncora Tom Brokaw, na rede de TV NBC, em Nova York, foram postadas na mesma agência dos Correios (em Trenton, Nova Jersey), na mesma data (18 de setembro) e escritas com a letra de uma mesma pessoa.

Mueller enfatizou que os investigadores não conseguiram descobrir a ligação entre os casos de antraz e os terroristas da Al Qaeda (a rede comandada por Osama Bin Laden). Mas ressaltou que a hipótese não pode ser descartada.

"Eu não excluiria ele (Osama Bin Laden) disso (ataques com antraz), mas não temos evidências ainda", afirmou o presidente George W. Bush. "Enquanto nós não descartarmos a ligação (dos casos de antraz) com os ataques de 11 de setembro nós não teremos bases conclusivas para afirmar que isso não é parte de uma tentativa de terrorismo", acentuou o secretário de Justiça, John Ashcroft.

Segundo a rede CNN, ambas as cartas contaminadas continham mensagens curtas e ameaçadoras. Os testes mais recentes realizados na carta enviada a Daschle confirmaram a presença da bactéria antraz. A CNN afirma ainda que especialistas apontaram a cepa presente na carta como 'especialmente pura e potente'.

Cerca de 50 pessoas que estavam no gabinete de Daschle quando a carta foi aberta foram submetidas a tratamento preventivo com antibióticos. O senador não foi infectado. "É possível que a bactéria tenha sido disseminada pelo sistema de ventilação para outras partes do escritório", explicou Daschle. "Estamos tomando todas as precauções necessárias para que se tenha certeza de que não houve disseminação", prosseguiu.

Partes de oito andares do Senado americano ficaram fechadas nesta terça-feira para que os especialistas buscassem indícios de antraz. As visitas de turistas ao Congresso americano foram suspensas. Também foi suspensa a entrega de correspondências em todo o Capitólio, complexo que abriga as Casas do Congresso americano.

O prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani, disse nesta terça-feira que equipes de investigadores continuam em busca de traços da bactéria antraz no prédio da TV ABC na cidade. Um bebê de sete meses, filho de um funcionário da emissora, contraiu a forma cutânea (menos nociva) do mal provocado pelo antraz. O FBI acredita que o garoto foi infectado após visitar o prédio, em 28 de setembro.

A polícia e autoridades sanitárias de Nova York vão promover buscas a traços de antraz nas sedes das principais empresas de jornalismo da cidade. A lista inclui as sedes da CBS, CNN, Fox News, Associated Press, The New York Post e Daily News.

Trote caro - Ascroft e Mueller disseram nesta terça-feira que cerca de 2.300 incidentes envolvendo a possibilidade de ataque por antraz foram registrados pelo FBI desde 1º de outubro. A maioria dos casos era alarme falso ou trote. "Toda ameaça é investigada com seriedade", disse o diretor do Bureau. "Não temos escolha".

Ashcroft revelou que dois homens de Connecticut, Frederick Forcellina e Joseph Faryniarz, foram indiciados por falsas declarações ligadas a ataques com antraz. Eles podem pegar cinco anos de cadeia e ter de pagar US$ 3 milhões em multas.




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