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Marcílio Moraes mistura trama clássica à história
Luzdalva Silva Magi
Especial para o Diário
30/04/2011 | 07:16
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Divulgação


Cada dia que passa os espetáculos teatrais ficam mais distantes do cidadão comum, seja pelo preço ou por qualquer outra condição, o fato é que nem todo mundo pode se dar ao luxo de frequentar teatros. O cinema também vai se tornando programa classe A, salvo raras exceções e eventos promocionais. As famílias se voltam para a televisão, preferem a programação da TV aberta mesmo sendo assinantes de TVs a cabo. As novelas ocupam salas e se tornam discussão obrigatória em vários lugares, por isso vamos conversar com Marcílio Moraes, autor da novela 'Ribeirão do Tempo' (CF50que termina na segunda-feira na Record), um talento que resgata os autores clássicos em se tratando de assuntos novelescos.

Tornei-me telespectadora de 'Ribeirão do Tempo' pelo ar bucólico e verossimilhante e por a trama ser como algo enigmático e filosófico. Como surgiu o título?

MARCÍLIO MORAES - Você acertou quando se referiu a "algo filosófico". Em filosofia existe essa associação entre a ideia do fluir do tempo e a ideia de um rio. Fala-se em "rio do tempo". Como eu gosto de filosofia e a novela que eu havia inventado tinha a ver com o passar do tempo, resolvi nomear a cidade imaginária onde a trama se passaria de 'Ribeirão do Tempo'.

Em minha leitura, a novela é colagem folhetinesca dos momentos políticos e de figuras que passaram por nossa história. A leitura procede?

MORAES - Sua leitura procede sim. De fato, 'Ribeirão do Tempo' junta numa associação livre e descompromissada, fatos, momentos e figuras da nossa história política. Tudo sob uma luz satírica e irônica.

Em um mundo globalizado no qual quase tudo é normal, desenvolver uma trama política, com preocupações ambientais, cheia de romance sem apelo ao sexo banal, foi desafiador?

MORAES - 'Ribeirão do Tempo', embora pareça simples, foi uma trama muito complicada e trabalhosa de desenvolver. Porque, acima dos personagens individuais, eu tinha um personagem coletivo, o conjunto da cidade, para lidar. E foi opção dramatúrgica fazer uma novela sem truques e sem apelações. Só mesmo a história daquela gente, sem estereótipos, fluindo ao sabor, não mais da pena, como se dizia antigamente, mas do teclado do computador. Foi um desafio enorme.

Quanto de Collor existe em Nicolau e quanto de Lula podemos encontrar no Querêncio?

MORAES - Por favor, não me comprometa (risos). Prefiro dizer que os personagens políticos da novela têm um pouco de todos os políticos brasileiros, sem especificar nenhum.

Seu trabalho resgata a ideia clássica dos célebres Janete Clair, Dias Gomes e Ivani Ribeiro, no qual a qualidade flui naturalmente sem apelações, semelhante à literatura, pode-se dizer que o senhor retomou os clássicos?

MORAES - Obrigado por me colocar em companhias tão ilustres. Os três são autores pelos quais tenho a maior admiração. O que posso dizer é que me sentiria extremamente gratificado e orgulhoso se 'Ribeirão do Tempo' viesse a ser considerada uma "retomada dos clássicos". Seria uma consagração. Mas eu não posso responder à pergunta. Só o público, incluídos aí a imprensa, os intelectuais etc, tem essa resposta.

Fale um pouco das suas influências e experiências como escritor, principalmente no campo da teledramaturgia.

MORAES - Comecei pela literatura. Estudei Letras e meu sonho inicial era ser romancista ou contista. Publiquei alguns contos e depois fui atraído pelo teatro. Era a época da ditadura. Minha primeira peça, que se chamava 'Só Engorda Quem Negocia' foi proibida pela censura. Mas com a segunda, 'Mumu, a Vaca Metafísica', ganhei um prêmio nacional e me lancei como dramaturgo. A peça era um misto de teatro do absurdo com teatro épico e funcionou muito bem naquela época em que se precisava falar por metáforas. Isto em 1975. Escrevi outras peças e na década de 1980 entrei na televisão, chamado pelo Dias Gomes para colaborar em 'Roque Santeiro'. Como influências, eu citaria o próprio Dias Gomes, Becket, Brecht e a literatura universal, em particular o romancista russo Dostoiévski, por quem sou fascinado, e cujo romance 'Os Demônios' foi uma das fontes inspiradoras de 'Ribeirão do Tempo'.

Luzdalva Silva Magi é poeta e professora, formada em Letras pelo Centro Universitário Fundação Santo André e autora de artigos na revista Conhecimento Prático de Literatura.




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