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Historiador do ABC traça perfil de catadores
Por Danilo Angrimani
Do Diário do Grande ABC
27/12/2003 | 16:50
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O professor de História da Fundação Santo André José Amilton de Souza, 42 anos, defendeu tese de doutorado sobre os catadores/carrinheiros de Santo André na PUC (Pontifícia Universidade Católica). A pesquisa é inédita na região. Em seu trabalho, Souza faz um histórico dessa atividade na cidade, traça um perfil das pessoas que catam ferro-velho e mostra que a coleta seletiva beneficiou apenas alguns carrinheiros, que foram aproveitados em cooperativas de reciclagem de lixo. “A grande maioria continua puxando carroças na rua. São personagens economicamente anacrônicos, que foram deixados de fora da inclusão social e da distribuição de renda.”

Para realizar seu trabalho, iniciado em 1998 e concluído este ano, Souza entrevistou 80 catadores e aproveitou 34 depoimentos. Ele conta que na década de 1940 Santo André já possuía catadores, que ficavam em lixões. Mas os carrinheiros só começam a se tornar mais comuns a partir dos anos 80. “Eles inauguram o mercado da coleta seletiva em Santo André.”

A maioria é migrante, que chegou ao Grande ABC nas décadas de 1980 e 1990, foi atingido pelas ondas recessivas de desemprego contínuo e não conseguiu lugar no mercado de trabalho formal. “Alguns até tinham emprego, mas perderam, e outros viviam de bicos na construção civil.”

Parte deles vive na periferia da cidade e tem uma relação familiar: “Mora em barraco, na favela, e cata ferro-velho na vizinhança”. O outro grupo perdeu os vínculos familiares. “São pessoas mais sujeitas à droga, álcool. Vivem de maneira degradada.”

O professor diz que faltam políticas públicas para resgatar essas pessoas, que ganham “R$ 5 por dia” para fazer “trabalhos anacrônicos, incompatíveis com uma economia avançada, ligada pela Internet e outros avanços científicos”. Esses trabalhadores, segundo o pesquisador, representam a ponta econômica mais fraca de uma longa cadeia de alta lucratividade.

Souza defende a inclusão do catador no processo de coleta seletiva implantado na cidade. Quando a Prefeitura contrata uma empresa para fazer a coleta seletiva, mantém a economia centralizada, explica o professor. “Santo André poderia ter feito como a Prefeitura de Oviedo, na Espanha, que, em vez de contratar uma empreiteira, colocou essas pessoas no mercado formal de forma organizada, descentralizando a distribuição de renda.”

Os caminhões dessa coleta seletiva, sugere o professor, poderiam ser coloridos. “Certamente gaveria uma adesão maior da população. Os moradores têm uma relação de sociabilidade e solidariedade com os catadores, embora também haja pessoas que os consideram apenas vagabundos.”

Emoção – Souza revela que o momento de maior emoção, durante a elaboração de sua tese, ocorreu quando ele entrevistava um catador na avenida dos Estados: “Ele estava me contando como era sua vida na roça e fazia uma comparação com a atividade de catador. Ele sabia verbalizar o que sentia e, em sua leitura, ele achava que tinha se tornado um animal, que vivia de sua força física. Um homem-cavalo. Ele começou a chorar quando refletiu sobre isso.”

Mesmo assim, Souza não utilizou, em seu trabalho, os termos “homem-cavalo”, nem “trabalhador informal” para se referir aos catadores. “Procurei caracterizá-los como pertencentes a uma categoria específica de trabalhadores”.




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