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Palavrão é nome feio
ou palavra comprida?
Juliana Ravelli
Do Diário do Grande ABC
20/03/2011 | 07:00
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Na infância, a gente costuma sair por aí repetindo tudo o que os adultos falam sem saber direito o que significa. É legal descobrir novas palavras. O problema é que nem todas podem ser pronunciadas. Os famosos palavrões não são nomes compridos, mas palavras cujos significados são considerados feios.

Esse assunto confunde a protagonista de Palavras, Palavrinhas e Palavrões (Editora FTD, 47 págs., R$ 28,90), escrito por Ana Maria Machado. No livro, a menina leva bronca dos pais e avós por falar nomes proibidos. No entanto, ninguém explica o que torna uma palavra feia ou bonita. Algumas muito esquisitas são liberadas; outras simples e pequenas são horrorosas. Afinal, o que pode ou não ser dito?

Na vida real, acontece a mesma bagunça. Beatriz de Jesus Goes, 10 anos, arregalou os olhos quando ouviu pela primeira vez ecocolordopplercardiograma, nome de um exame que deveria fazer. "Já tenho medo de médico. Quando escutei, fiquei mais assustada ainda."

BUSCA NO DICIONÁRIO - Beatriz e os amigos do 6° ano do Sesi 265, de Santo André, leram o livro e descobriram que é normal ter dúvidas. "Quando era pequena, ia ao dermatologista e perguntava o que era. Não sabia que é o médico de pele", conta Bárbara Christie da Silva Santos, 10.

A tática que Leonardo Moraes Ruiz, 11, usa para descobrir os significados é consultar o dicionário ou perguntar aos pais e professores. "Tem dicionário on-line. Se a gente não sabe o que o nome quer dizer, não consegue usá-lo direito numa frase", completa Giovanna Carlos Paulo, 10.

"É bom descobrir como escreve certo e o que significa desde a infância. Assim, tem tudo na ponta da língua quando for adulto", afirma Thiago Araújo Crispim, 10.

Não dá para saber ao certo porque cada palavra é do jeito que é. É preciso ter paciência. Enquanto a gente cresce, aprende o que quer dizer e qual o melhor momento de usá-la.

Amigo dos espertos e inteligentes

É uma baita injustiça chamar o dicionário de pai dos burros. A expressão já fez muita gente ter vergonha de consultá-lo. Na verdade, é o amigo dos espertos e dos curiosos, que querem aprender palavras novas e não gostam de escrever errado.

É importantíssimo e, por isso, não se pode esquecê-lo ao sair da escola. Além de mostrar a maneira correta de escrever as palavras e o que significam, traz outras informações úteis, como regras de ortografia e conjugação de verbos.

Bárbara da Silva Santos, 10 anos, aprende no colégio e em casa que não dá para dispensá-lo. "Vai sempre nos acompanhar. Quando minha mãe lê livro, deixa sempre o dicionário do lado dela." Alguns são feitos especialmente para o público infantil, com ilustrações e definições mais simples. Os dos adultos nem sempre são fáceis de entender.

O dicionário é escrito, em geral, por uma equipe de lexicógrafos, também chamados de dicionaristas. São eles que decidem se uma palavra tem importância suficiente para estar no livro e qual explicação ganhará. O principal critério para isso é que o termo seja bastante usado pelas pessoas no dia a dia. O trabalho dessa turma não é moleza e exige muito estudo.

Tem fábrica de palavras

Toda língua precisa renovar e aumentar constantemente o estoque de palavras. Isso acontece porque as que existem são insuficientes para explicar coisas novas. Assim, toda vez que são feitas descobertas e criam-se tecnologias, a fábrica de palavras começa a funcionar.

Também podem ser inventadas por escritores para dar sentido à determinado sentimento, por exemplo. O mineiro Guimarães Rosa é considerado grande inventor de palavras. Entre as que bolou está formudo, que significa algo muito formoso, bonito.

Em português, há duas formas principais de se formar as palavras. Uma é a composição, em que duas ou mais palavras se juntam para criar uma terceira com significado diferente. É o caso de girassol (gira+sol). A outra maneira é a derivação, na qual uma palavra ganha pedacinhos no começo ou fim (chamados prefixo, quando vem antes, e sufixo, depois; sozinhos eles não têm sentido). Infeliz (in+feliz) é uma delas.

Além de criadas com recursos da própria língua, podem ser importadas de outros idiomas. É o que ocorre com clube (vêm do inglês) e turnê (do francês).

Todo mundo pode inventar

Quem disse que a gente não pode inventar palavras? Qualquer pessoa consegue fazer isso. Em uma família ou turma de amigos é natural alguém criar nome ou expressão que só tem significado para aquele grupo. A diferença é que esses termos não são encontrados no dicionário.

Os curitibanos, por exemplo, chamam salsicha de vina. Na vida real e até na ficção, isso ocorre com frequência. No livro Marcelo, Martelo, Marmelo, de Ruth Rocha, ele quer saber por que as coisas ganharam os nomes que têm - todo mundo já teve essa dúvida. Insatisfeito com as respostas dos adultos, cria um monte de palavras; para o menino, leite é suco de vaca e casa vira moradeira. Tem sentido, não?

Supercalifragilisticexpialidoso. Já ouviu essa? Ficou famosa no mundo todo ao ser dita pela babá Mary Poppins, a divertida protagonista do livro escrito pela autraliana Pamela Travers, em 1934, que virou filme da Disney, em 1964. Ela significa que algo é tão espetacular e diferente que não há uma única palavra para descrevê-lo.

Você já inventou palavras? Experimente. É brincadeira divertida.

Saiba mais

- Aurélio Buarque de Holanda foi importante dicionarista brasileiro. Criou jeito próprio de fazer dicionário e descobrir palavras. Andava sempre com um caderninho e lápis no bolso. Se escutava algo diferente, anotava e pedia para a pessoa explicar o que significava. Tinha biblioteca gigantesca e sempre fazia anotações nos livros. Após morrer em 1989, equipe liderada por sua mulher continua esse trabalho.

- Quando uma nova palavra surge não vai direto para o dicionário. Em geral, demora um tempinho. Os lexicógrafos observam se ela não é rapidamente esquecida. Tuitar, que vem do nome próprio Twitter, já virou palavra da língua portuguesa. Isso aconteceu porque passou a ser muito usada pelas pessoas. O mesmo ocorreu com gilete, que antes era marca e, agora, refere-se a qualquer lâmina de barbear.

- Não dá para saber ao certo por que cada coisa tem determinado nome. Descobrir o segredo de todas as palavras é difícil; cada língua tem cerca de 500 mil! Em geral, as pessoas conhecem só 5.000. Mas a história de algumas é conhecida. A principal cidade de um país ou Estado é chamada de capital porque vem de caput, que significa cabeça em latim; ou seja, tem a mesma importância dessa parte do corpo.

- Em cada região e até Estado há palavras que não são encontradas nos demais. Isso porque os lugares recebem influências culturais diferentes. O banco (feito de madeira para sentar) que os paulistas conhecem é chamado de tamborete em Minas Gerais. Mesmo sendo tão grande, o Brasil tem só uma língua oficial. Alguns países têm mais de uma. Na África do Sul, por exemplo, há 11 línguas oficiais.

Compridonas

Há muitas compridas e estranhas, como HIPOPOTOMONSTROSESQUIPEDALIOFOBIA (33 letras) que indica o medo excessivo de palavras grandes. Se não prestar atenção, é fácil escrevê-las de modo errado. Confira algumas com maior número de letras. Em geral, estão ligadas à medicina:

PNEUMOULTRAMICROSCOPICOSSILICOVULCANOCONIÓTICO (46 letras) - é quem tem a doença PNEUMOULTRAMICROSCOPICOSSILICOVULCANOCONIOSE (44 letras), causada por cinzas de vulcão

PARACLOROBENZILPIRROLIDINONETILBENZIMIDAZOL (43 letras) - é uma substância presente em medicamentos

OFTALMOTORRINOLARINGOLOGISTA (28 letras) - é o médico que cuida dos olhos, ouvidos, nariz e garganta

ESTRICNINOMONOSSULFÔNICO (24 letras) - é substância química

ANTICONSTITUCIONALIDADE (23 letras) - é quando não se obedece as regras impostas pela constituição

Consultoria de Valéria Zelik, editora do Dicionário Aurélio, Francisco Platão Savioli, professor da ECA e supervisor de gramática, texto e redação do Anglo Vestibulares, e Célia Leão, consultora de etiqueta




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