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Divisa de Sto.André com capital é ‘faixa de gaza’ da região
Por Gabriel Batista
Do Diário do Grande ABC
21/02/2005 | 13:39
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A principal linha de confronto entre polícia e bandidos na Região Metropolitana está na divisa do 2º subdistrito de Santo André com a zona Leste da capital. Em 2004, o fogo cruzado na ‘faixa de gaza’ do Grande ABC resultou na morte de 41 civis pela polícia. Uma morte a cada 10 dias. Para a PM, esse número indica que os criminosos que agem em cerca de 10 bairros no limite do município estão acima da média no quesito ousadia. Para o comandante do Policiamento Metropolitano, coronel Reinaldo de Oliveira Rocco, a cidade que mais preocupa a corporação hoje é Santo André, por oferecer atrativos aos ladrões, como ter rico pólo comercial e uma das cinco maiores frotas de carros do Estado. No ano passado, foram mais de 10 mil roubos de veículos, embora tenham caído 25% em comparação a 2000. Os dados de Santo André quando somados aos dos outros municípios da região encarecem o seguro de veículos no ABC até 38%, segundo corretores.

O número de homicídios também caiu na região entre 2000 e 2004 – 44,03% no Grande ABC e 42,85% em Santo André –, mas a criminalidade é implacável nos limites do Jardim Elba, favela paulistana conhecida pelo tráfico de drogas e o alto índice de violência. O comandante do Policiamento Metropolitano afirma que Santo André é a cidade onde há mais confrontos da polícia com ladrões, seguida de Guarulhos e Osasco. “O que me causa mais preocupação são os roubos e furtos de veículos, que em Santo André correspondem a 65% dos casos registrados na Região Metropolitana”, diz o coronel Rocco.

A falta de segurança da população que vive nos bairros do 2º subdistrito – Camilópolis, Utinga, Parque Novo Oratório, Capuava, entre outros – impede que os indicadores de criminalidade na região sejam melhores. Dentre os 75 principais municípios do Estado (que representam 80% do Produto Interno Bruto de São Paulo), Santo André está com a infeliz 72ª colocação, segundo ranking do Ieme (Instituto de Estudos Metropolitanos) que cruza as várias estatísticas de criminalidade.

As estatísticas, porém, não podem relatar a insegurança de quem está em meio ao fogo cruzado. Cláudia (nome fictício) sente que vive em perigo. Ela não é personagem do velho oeste americano nem mora no Oriente Médio. Mas habita região de incessante bangue-bangue. O endereço da comerciante é a avenida Sapopemba, bairro Camilópolis, Santo André.

Ela comprou um terreno no bairro há 10 anos, quando mal imaginava qual seria o futuro da divisa Santo André-São Paulo. Construiu a casa e mudou-se há um ano, tempo suficiente para perder a conta dos tiroteios que ouviu. “Ouço freqüentemente disparos bem ao lado de casa.”

Em 2004, 41 pessoas morreram em Santo André em confronto com a polícia. O número supera em dobro o de mortos pela polícia em São Bernardo e São Caetano juntas: 18. “Isso me deprime, desgasta. Uma simples tarefa de chegar em casa e abrir a garagem é motivo de preocupação. Nem chá de erva cidreira resolve”, diz Cláudia.

Santo André baixou em 2004 6,8% os embates finalizados em morte de suspeitos na cidade em comparação a 2003. Índice baixo se comparado à média do Grande ABC, que passou de 97 para 74 casos semelhantes no período. Uma queda de 23,7%, enquanto a capital apresentou diminuição de 39% e o Estado, 27,5%. Segundo a Polícia Militar, Santo André se tornou a principal preocupação da corporação na Região Metropolitana. Em outras palavras, os criminosos que agem em Santo André literalmente abrem fogo contra a polícia, segundo a versão dos milicianos.

Sustos – Histórias de gente que presenciou tiroteios são comuns no Camilópolis, apenas um dos bairros de Santo André na divisa com a capital. “Uma vez meu marido estava sentado num degrau na calçada conversando com o vizinho. De repente, eles ouviram tiros e em seguida perceberam que uma bala acertou a parede atrás deles, a um metro de onde estavam”, diz a dona de casa Madalena (nome fictício), 50 anos, que vive há 13 anos na avenida João Pessoa.

“Vivemos uma fase de violência atrevida e sofisticada. É lógico que isso assusta o policial e principalmente quem vive nesses locais. O Estado necessita de agentes altamente treinados para lidar com a situação”, diz Dirceu de Mello, diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) e ex-presidente do Tribunal de Justiça do Estado.

Rota de fuga – Segundo a PM, criminosos da capital engrossaram o contingente da bandidagem no Grande ABC de dois anos para cá. Por isso, o front acirrou um estrito combate na divisa com São Paulo. A região virou opção predileta dos ladrões paulistanos porque o policiamento foi reforçado e equipado nas zonas Leste e Sul da capital nos últimos anos.

“Esse pessoal vem a Santo André para roubar carros e levá-los para desmanches em São Mateus (zona Leste) ou usá-los na prática de outros crimes na capital”, explica o major José Quesada Farina, do CPAM-6 (Comando de Policiamento de Área Metropolitana 6).

Esses criminosos geralmente chegam à região em motocicletas ou até mesmo em ônibus intermunicipais. Segundo o delegado seccional de Santo André, Luiz Alberto Ferreira de Souza, o ladrão se beneficia das rotas de fuga do ABC para a capital. São vias expressas que os levam rapidamente para fora da região: avenidas dos Estados, das Nações, Presidente Costa e Silva e rua Oratório.

Além disso, moradores da divisa afirmam que a polícia do Grande ABC não ultrapassa os limites da região. Esse hábito favoreceria os criminosos, que podem desaparecer com o carro assim que atravessam a divisa. O major Jorge Luiz Alves, chefe geral de Comunicação da Polícia Militar, diz que a orientação do comando não é abandonar cercos em razão de limites de município e que não tem conhecimento desse tipo de prática.

Outro ponto a favor dos ladrões é que a rede de rádio da PM do ABC é separada da freqüência da capital. Até a polícia de São Paulo tomar conhecimento da perseguição interrompida, o veículo já foi abandonado ou está num desmanche. Segundo o major Jorge Luiz Alves, os sistemas mundiais de rádio têm limites por área. “Uma unificação congestionaria a rede. Só na capital são cerca de 30 freqüências diferentes.”

A PM de Santo André espera o ingresso de 155 policiais na instituição. Isso ajudaria a combater a criminalidade na divisa com a zona Leste, segundo o comandante metropolitano da PM, coronel Reinaldo de Oliveira Rocco. O reforço aos batalhões  deve chegar neste ano.

Entretanto, na visão do especialista em Direito Penal da PUC-SP Dirceu de Mello a solução é clássica. “Só com acesso geral às bases sociais e investimento em educação.”



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