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Zezé Motta quer papéis melhores para os negros
Rodrigo Teixeira
Da TV Press
04/04/2004 | 20:01
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Em 36 anos de TV, Zezé Motta já variou bastante os tipos de personagens que viveu. Em sua 15º novela, Metamorphoses, da Record, a atriz interpreta a primeira médica da carreira, a anestesista Prazeres da Anunciação. Marcada por ter feito a escrava Xica da Silva, da Manchete, no cinema e várias mães-de-santo, como a Ricardina de Porto dos Milagres, da Globo, Zezé ressalta a importância das novelas não terem atores negros apenas na pele de subalternos. “Ter negros em papéis de médicos e profissionais liberais aumenta a estima da comunidade negra. As escalações estão mais democráticas neste sentido”, avalia.

Zezé estreou em Beto Rockfeller, na Tupi, em 1968. A atriz carioca interpretava uma empregada doméstica, mas a personagem era especial porque tinha uma história própria. “Ela não ficava só servindo cafezinho. Tinha dilemas também e isso que é importante”, acredita.

Para trabalhar em Metamorphoses, a atriz mudou-se para São Paulo e garante que já se adaptou à cidade que serviu de palco para sua estréia no teatro, em 1967, na polêmica peça Roda Viva, de autoria de Chico Buarque e dirigida por José Celso Martinez. “Em São Paulo me dedico ao trabalho e mesmo quando saio para a rua é pensando na novela, como ir retocar os cabelos brancos”, explica a atriz, que completa 60 anos em junho.

TV PRESS – O que a motivou a fazer Metamorphoses?
ZEZÉ MOTTA – Em primeiro lugar, ser dirigida pela Tizuka (Yamazaki), com quem fiz Kananga do Japão, na extinta Manchete. Ficamos amigas e juramos que um dia iríamos voltar a trabalhar juntas. Por isso, quando veio o convite, nem titubeei. Segundo porque estamos abrindo uma nova porta para a dramaturgia nacional, o que é muito positivo. E terceiro porque considero a própria Metamorphoses interessante. Acho apropriado a novela discutir a ética na cirurgia plástica e curioso falar da máfia japonesa, a Yakuza, que eu nem sabia que existia também no Brasil.

TV PRESS – Como se preparou para viver a primeira médica da carreira?
ZEZÉ – Confesso que na primeira sinopse a Prazeres era uma instrumentadora, tipo uma chefe de enfermagem. No meio do caminho, mudaram de idéia e a personagem virou uma médica. Então passei uma semana conversando com a nossa assessoria para assuntos ligados à medicina. Também presenciei médicos preparando curativos e cheguei a acompanhar uma cirurgia. Na verdade, considero este trabalho uma vitória.

TV PRESS – Por quê?
ZEZÉ – Porque para a comunidade negra ver atores negros como médicos e advogados em novelas é bom para a auto-estima. As emissoras argumentavam que reproduziam a vida real, mas na vida real também existem médicos negros. Não são muitos, mas existem. Na minha família tem um. Recebo cartas de mulheres negras dizendo que estão batalhando e que, se eu consegui, elas também irão. A minha palavra sempre é perseverança. Durante minha carreira tenho me dedicado a cobrar melhores papéis para os negros e me sinto coroada. Está havendo uma preocupação de dividir melhor os papéis entre os atores. Acho que é pouco ainda, mas avançamos. Inclusive com a Taís Araújo, que é negra, protagonizando uma novela da Globo.

TV PRESS – Existe um preconceito em relação a novelas produzidas fora da Globo?
ZEZÉ – Com certeza. As novelas da Globo também passam por mudanças de sinopse e autores e não causam tanto alvoroço. Eu procuro ficar de fora destas questões e me concentrar no trabalho de atriz. Mas existe um preconceito sim, tanto da mídia quanto do público. Achei até engraçado um dia em que duas pessoas perguntaram o que estava fazendo em São Paulo. Falei que estava trabalhando na novela da Record e ouvi um “vou rezar para você voltar para a Globo”. Achei muito engraçado.

TV PRESS – Você começou fazendo uma empregada em novelas e agora vive uma médica.
ZEZÉ – Mas a Zezé de Beto Rockfeller não ficava só servindo cafezinho. Ela tinha uma história própria, namorava o mordomo, dava festas quando os patrões saíam, era uma personagem cômica e até macumba fazia. Então, a questão não é fazer uma empregada, mas ficar a reboque dos outros personagens, sem história própria.




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