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Região tem por dia ao menos uma denúncia ligada a LGBTs
Por Matheus Angioleto
Especial para o Diário
22/05/2017 | 07:00
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Celso Luiz/DGABC


Segundo levantamento feito pela ONG ABCD’S (Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual), pelo menos uma denúncia de homofobia e transfobia (preconceito contra pessoas transgêneras, transexuais e travestis) foi feita por dia no Grande ABC neste ano. Os dados ainda apontam que nos quatro primeiros meses de 2017 já foram contabilizadas 132 notificações.

De 2012 a 2017, mesmo sem o término do ano, o aumento é de 633% no número de casos. Há cinco anos, por exemplo, foram 18 registros, saltando para 61 em 2013. No ano passado foram 146 denúncias. Os dados integram levantamento de denúncias recebidas pela ONG, as quais são posteriormente oficializadas por boletim de ocorrência ou por meio da lei estadual número 10.948/01, a qual proíbe a discriminação e trata de punições administrativas por meio de advertência ou multa.

Segundo o levantamento, neste ano foram 26 denúncias relacionadas à transfobia, sendo sete em Santo André, 14 em São Bernardo, uma em Mauá e duas em São Caetano, além de 67 ocorrências a respeito de outdoor instalado em Santo André à época do Dia Internacional da Mulher, o qual associava imagem de mulher posicionada em frente a um mictório masculino – o que remete a indivíduo travesti ou transexual – ao crime de pirataria. O Diário noticiou o caso em março.

Já em relação à homofobia, os casos somam 40, sendo 18 em Santo André, 13 em São Bernardo, dois em Diadema, quatro em São Caetano e três em Mauá. Não há registros de denúncias contra o público LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) em Ribeirão Pires e em Rio Grande da Serra.

No shopping, no Centro da cidade, na rua, no ônibus. Não importa o local. Todos os dias militantes da causa LGBT sabem que podem sofrer algum tipo de perseguição ou ser alvo de chacota. O apoio da família e de amigos para lidar com a realidade e superar o problema é fundamental na sequência da vida. “Fui trabalhar e me proibiram de entrar com cabelo solto, bota, calça mais apertada, colares e lente de contato. Em toda a minha história foi o momento em que mais sofri com isso, porque já tinha construído nome na cidade por conta de meu trabalho social”, afirma Márcio Araújo, 38 anos, homossexual e coordenador do Fundo Social de Solidariedade de Mauá.

Nordestino, cabeleireiro e militante da causa LGBT. Deixou a casa em que vivia aos 12 anos para morar com a irmã. Aos 16, veio a São Paulo viver com o irmão, e há 18 se considera ‘são-caetanense-baiano’. João Carlos, 42, mais conhecido como Morango, contou nunca ter sofrido preconceito. Ele mantém personagem drag, conhecida como Moranguete Braga. “Nunca sofri ato homofóbico físico nem verbal. Aos poucos, a vida foi me engajando. Falo sempre a amigos a respeito das atitudes que devem ser tomadas”, aponta.

“Sou transgênera. Desde os 7 anos tenho comportamento feminino, porém, sou biologicamente masculina. Sofri preconceitos verbais nos ensinos Fundamental e Médio. Chamavam-me de ‘viadinho’. Hoje, estou no primeiro semestre de Engenharia Civil, sou a primeira trans da minha faculdade e me aceitam tranquilamente”, diz, orgulhosa, Gabriella Santos Lima, 31, que há 14 mantém salão de beleza em Rio Grande.

Criminalização da homofobia é medida urgente no País

Para especialistas, a criminalização da homofobia e transfobia é pauta urgente. A ausência de leis de proteção à comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) é fator que agrava o problema. Dados do GGB (Grupo Gay da Bahia), com base em estimativas, apontam que em 2016 foram 343 mortes de pessoas que integram este grupo no País. No quadrimestre deste ano já são 117, com a maioria entre travestis e transexuais.

No Estado, segundo dados da SSP (Secretaria da Segurança Pública), de novembro de 2015 até dia 28 de fevereiro de 2017 foram registrados 1.465 casos de intolerância com motivação de homofobia e transfobia, sendo que as alegações mais comuns são injúria, ameaça, lesão corporal, difamação e violência doméstica. Em 2016, dos 139 inquéritos instaurados pela Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância), do DHPP (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa), 18% eram relacionados a homofobia.

Para a presidente da comissão de diversidade sexual da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo, Adriana Galvão de Moura Abílio, o problema é a não criminalização da homofobia até o momento. “Precisa estar expresso que foi motivado pelo ódio ao Grupo LGBT, mas não colocam porque não tem crime de homofobia. É detalhado como se fosse lesão corporal grave. A maioria dos casos ocorre por conta do ódio ou aversão”, aponta.

A ausência deste ponto no Código Penal, na visão da especialista, atrapalha a reunião de estatísticas por parte das autoridades. Para Adriana, o preconceito na hora da revelação das agressões às autoridades e a falta de tipificação do crime são os dois pontos primordiais. “Está na hora de o Brasil criminalizar homofobia para mostrar que temos dados e que o número de pessoas agredidas é grande”, avalia.

“A legislação teria de estar bem clara. O tratamento (das vítimas) vai depender do delegado que presidirá a instauração do inquérito e da situação que a pessoa chega (na delegacia). Às vezes, o próprio delegado acaba tendo preconceito. O que a gente precisa realmente é legislação específica para o crime, assim como para mulheres tem o feminicídio (assassinato de mulheres)”, avalia a especialista em Direito Penal Célia Regina Nilander de Souza, que defende a tipificação de condutas de ódio em futura reforma do Código Penal.

A Secretaria da Segurança Pública do Estado destacou, em nota, que colocou em prática diversas políticas públicas visando ao atendimento à população LGBT, incluindo campo com o nome social nos boletins de ocorrência e a inclusão da motivação, relacionada à intolerância ou à discriminação, com opção de homofobia ou transfobia, desde 2015.

Consórcio ainda não definiu projeto

Demanda citada como fundamental para filtrar as necessidades específicas das sete cidades, a pesquisa que pretende visitar e mapear a população LGBT da região não sairá do papel tão cedo.

Segundo o Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, a iniciativa citada durante encontro de discussões de políticas públicas era pleito da antiga composição do então Grupo Temático LGBT, mas não há nenhum tipo de contratação referente à questão.

“A partir deste ano, a entidade regional transformou o Grupo Temático em Grupo de Trabalho, com integrantes indicados pelos prefeitos dos sete municípios. Neste momento, o coordenador e o suplente do novo GT ainda não foram eleitos, e o pleito não foi formalizado novamente”, informou a entidade, por nota.




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