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Polícia investiga morte de
menino viciado em drogas

Família diz que o garoto de 12 anos não conseguiu vaga de
internação; ele foi encontrado morto na lavanderia de casa

Maíra Sanches e Rafael Ribeiro
04/11/2012 | 07:00
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A Polícia Civil de Santo André investiga a morte do estudante Iuri Jonathan dos Santos Castro, 12 anos, encontrado morto na lavanderia de casa em 1º de outubro, sem escoriações. O menor, que era viciado em drogas desde 2010, morava com os pais e o irmão de 16 anos em uma casa humilde localizada no Jardim Irene.

Um dos principais pontos apurados pela polícia é se o poder público foi negligente quanto a garantir ao menino tratamento para dependência química.

A dona de casa Selma Terezinha dos Santos, 34 anos, mãe de Iuri, diz que a Prefeitura de Santo André descumpriu ordem judicial que pedia a internação mesmo contra a vontade do garoto.“Quando precisei, não me ajudaram. Meu filho foi assassinado”, aponta.

Em dezembro de 2011, de acordo com Selma e o Conselho Tutelar, a família decidiu mover ação judicial para pedir internação compulsória da criança. O despacho foi feito pela juíza da Vara da Infância e Juventude, Daniela de Carvalho Duarte, no processo 1971/2011, que corre em segredo de Justiça. A Prefeitura, no entanto, afirma que não recebeu nenhuma notificação judicial sobre o caso. O Ministério Público não comentou.

Santo André – assim como as outras cidades da região – não possui serviço de internação específico para crianças e adolescentes usuários de drogas. O Caps (Centro de Atenção Psicossocial) Infantil oferece acolhimento de curta duração, por 72 horas.

HISTÓRICO

Desde que começou a se envolver com maconha – primeira droga que experimentou – em poucos meses Iuri passou a apresentar desvios de comportamento que preocuparam a família. Ainda em 2010, experimentou cocaína e crack. Ausentou-se por alguns dias de casa, chegou a furtar objetos na rua e em casa, e reaparecia sem avisar. “Cansei de procurá-lo nas ‘bocas’ (de fumo) das favelas”, diz a mãe, Selma Terezinha dos Santos, 34.

Em 2011, o Conselho Tutelar interveio no caso, após assistentes sociais da Prefeitura terem abordado o garoto próximo a viadutos da cidade, especialmente na região central, onde ficava nas madrugadas. Iuri passou a frequentar abrigos municipais para menores de idade, dos quais fugia regularmente. Às vezes, voltava para casa e retomava a rotina. Depois, passava semanas ao lado da família e desaparecia novamente. “Ele chegou a ficar 22 dias longe”, revela a mãe.

De acordo com a Prefeitura, Iuri passa por atendimento na rede pública desde 2007. E, desde então, tem histórico de abandono do tratamento. Em julho deste ano, o conselho alertou a família de que o adolescente estava cometendo furtos para manter o vício e pediu indicação médica para internação, com ciência e autorização da mãe. Psiquiatra da rede de Saúde mental solicitou agendamento de consulta para avaliar o caso. Em 24 de julho, a profissional fez relatório à Defensoria Pública solicitando internação compulsória do garoto.

Iuri não compareceu à consulta marcada para agosto, ainda segundo o município. Isso porque, em precário estado de saúde e abaixo do peso, foi internado no Hospital Mário Covas, em Santo André, com sintomas de overdose. Passou duas semanas em recuperação da intoxicação sofrida.

O menino prometeu voltar à escola em breve e dizia estar com saudades dos amigos. “Era uma criança querida, espontânea e cantava maravilhosamente bem. Ele dizia que queria parar (de usar drogas), mas acabou morrendo antes”, conta a psicóloga da Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) Mônica Cristina Valente, que acompanhava a rotina escolar do garoto. Iuri estudava na unidade desde 2010 e era fã de música sertaneja. Nascido prematuro, o garoto foi diagnosticado com rebaixamento mental leve.

Depois que deixou o hospital, não retornou mais para o abrigo. Voltou a morar com os pais e parou de sumir. Estava bem, mas a mãe desconfiou que ainda apresentava sinais de abstinência, como agitação e tremedeira.

A família vive com lembranças positivas, que sobreviveram ao drama dos últimos dois anos. As trancas que colocou nas portas hoje ficam abertas. Bens como celular, agora, estão expostos. “Foram muitas vezes que peguei o Iuri sujo, drogado, querendo me bater. Mas não vou falar mal do meu filho. Só digo que sua morte não será em vão. Quero apenas que ele descanse em paz.”

INVESTIGAÇÃO

O delegado Marcos Alexandre Cattani, titular do 6º DP (Vila Mazzei) da cidade, onde o caso foi registrado, disse que aguarda a conclusão do laudo do IML (Instituto Médico Legal) e da perícia para dar seguimento ao inquérito. “Por entender o que a mãe está passando, optei por esperar todos os laudos para ouvi-la.”

Cattani ainda não teve acesso ao pedido do judiciário sobre a internação do menino em clínica, mas garante que, se não houve resposta da Prefeitura, a Polícia Civil pode agir. “Se for comprovada a omissão, vamos cobrar.”.

Assim como ele, o defensor público Marcelo Carneiro Novaes acredita que o caso do menino expõe a precariedade do sistema público em abrigar dependentes químicos. “O Estado não está preparado e não tem condições de abrigar os menores dependentes. A falta de preocupação é evidente.”

 




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