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Morre padre Mahon, ícone contra ditadura

Francês, pároco atuou por 55 anos no Grande ABC, combateu o regime militar e lutou pelo Centreville

Por Raphael Rocha
Do Diário do Grande ABC
16/05/2018 | 07:00
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Uma das principais figuras da Igreja Católica no movimento contra a ditadura militar no Grande ABC, o padre José Mahon morreu ontem, aos 92 anos, na França, seu país natal. Mahon, que atuou na Diocese de Santo André por 55 anos, entre 1961 e 2016, lutava contra leucemia.

Nascido na cidade de Roubaix, Norte da França, Mahon foi ordenado sacerdote em 1951. Dez anos depois, veio para Santo André com grupo de voluntários franceses, onde conheceu dom Jorge Marcos de Oliveira, conhecido como bispo operário. Ele se estabeleceu no bairro Santa Terezinha e trabalhou na Villares no início da década de 1960 – a empresa, anos depois, acolheria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Com o golpe militar de 1964, Mahon ficou ao lado de parte da Igreja que foi contrária ao movimento dos militares. Tanto que, no auge da repressão da ditadura, escondia perseguidos do regime nas paróquias onde atuava – além de Santa Terezinha, passou pela Vila Guaraciaba, ainda em Santo André, e Parque das Américas e Jardim Zaíra, em Mauá. Por sua postura, chegou a ser detido sete vezes.

Mahon também ficou conhecido pela luta da regularização do Centreville, em Santo André. Ele esteve presente nas primeiras ocupações no bairro andreense, inclusive morando nos prédios abandonados – o projeto original era a construção de bairro de alto padrão no município, nos moldes de Alphaville. Ficou responsável pela Capela Nossa Senhora da Esperança.

O jornalista do Diário e historiador Ademir Medici lembra-se do dia em que Mahon participou do 12º Congresso de História em Mauá e, à ocasião, recordou o canto contra João Baptista Figueiredo, o último presidente do regime militar. “Na entrevista gravada ele disse que seria sepultado no Memorial Jardim Santo André, em Vila Humaitá, perto da sua última paróquia, a periférica Vila Guaraciaba. Depois se despediu e voltou para a Europa”, rememora Medici.

Mahon voltou à França em setembro de 2016, com diversas homenagens. Uma delas foi conduzida pelo bispo dom Pedro Carlos Cipollini, da Diocese de Santo André. “Padre Mahon foi entre nós um lutador pela causa do reino de Deus. Como recomenda o Apóstolo São Paulo: insistiu a tempo e fora de tempo, quer agrade ou desagrade, lutou pela justiça e o direito dos pobres e sofredores. Em um tempo difícil, durante a noite escura da ditadura militar e das greves operárias no Grande ABC, ele foi uma coluna de ferro levantada por Deus na nossa Igreja para defender os pobres.”

Coordenador do Centro de Memória da região, Cido Faria conviveu com padre Mahon ainda em sua juventude. “Quando fui exilado, na ditadura, o padre Mahon foi me visitar quando fui para a Suécia. Falei com ele pela última vez no meu aniversário, no dia 6 de abril. Ele, sem ser radical, sempre denunciou os abusos da ditadura. Sempre trabalhou contra a má distribuição de riqueza no País.” 




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