Setecidades Titulo
Falsos seqüestradores agem via telefone
Por Artur Rodrigues
Do Diário do Grande ABC
27/10/2005 | 08:36
Compartilhar notícia


O seqüestro não foi real. O medo sim. Pelo telefone, a empresária A.S., 35 anos, moradora do bairro Jardim, em Santo André, foi informada terça-feira de que os dois filhos, de 10 e 15 anos, estavam em poder de criminosos. Depositaria R$ 3 mil em uma conta bancária ou os filhos morreriam, ameaçava o falso seqüestrador. Mais de uma hora depois, vinha outra ligação, mais tranquilizadora, da irmã. Os filhos estavam na escola, bem, como ela os havia deixado pela manhã. Por pouco, não foi vítima do golpe que, segundo delegados da região, aumenta em número de casos no fim do ano.

"Atendi o telefone e um homem disse que estava com meus filhos. Deu vários detalhes: onde estudavam, como eram, nome, idade, tudo", lembra a empresária. Mais tarde, ela descobriria o porquê de o criminoso saber tanto sobre a vida da família. Uma funcionária que trabalha na casa da empresária havia recebido outra ligação.

"Disseram para ela que meu marido estava estatelado no meio da Perimetral e começaram a perguntar várias coisas", relata. A empregada, ingenuamente, deu munição para os criminosos, que têm a conversa como a maior arma.

O sotaque carioca e o tumulto de vozes ao fundo ouvidos por A. é comum nesse tipo de crime. Os falsos seqüestradores ligam de cadeias – muitas no Rio de Janeiro (mais tarde, a empresária descobriria que a conta dada pelos criminosos era de uma agência do Banco do Brasil do Rio). Há também quem faça a ligação da região mesmo. Sempre de celular. As vozes do outro lado da linha têm em comum o dom de apavorar.

"Ele dizia que ia mandar o dedo do meu filho e a orelha da minha filha", lembra a empresária. O discurso convence. Tanto que convenceu outra mulher do mesmo prédio a gastar R$ 1,6 mil em créditos de celular pré-pago. A vítima não foi localizada pela reportagem, mas sua história já virou exemplo no condomínio de alto padrão de Santo André. Ali, os ouvidos já estão calejados. "Eu fico até com medo quando o telefone toca", confessa A.

Quando tudo acabou, a mãe abraçou os filhos com vontade. Os criminosos, possivelmente atrás das grades, descobriram dois dos três pontos fracos de A.. No braço, ela tem o nome dos três filhos (10, 15 e 17 anos) tatuados. No celular, a foto reúne as duas meninas e o menino sorrindo. A empresária confessa que mesmo sabendo do golpe ainda se assustaria com aquela voz. "Estou sem dormir desde ontem (terça-feira) à tarde."

Fim de ano – O delegado seccional de Santo André, Luiz Alberto de Souza Ferreira, destaca que esse tipo de crime tende a aumentar no fim do ano. Época em que, para ele, "todo mundo quer levar vantagem". Ferreira aconselha as pessoas a não entrar em pânico e denunciar. "Em centenas de casos parecidos, as ameaças nunca se concretizaram", afirma o seccional. Segundo ele, há poucos registros de casos semelhantes por falta de hábito da população.

"O grande problema é não conseguir identificar o aparelho por causa da grande quantidade de recursos que a telefonia de hoje disponibiliza para o usuário", afirma o delegado seccional de São Bernardo, Marco Antônio de Paula Santos. O delegado, porém, aponta que a mesma tecnologia que ajuda os criminosos ajuda a polícia. "Há operadoras que trabalham com 10, 15 metros de certeza na localização."

Ele destaca que com a facilidade ao acesso a celulares pré-pagos surgiu uma série de outros crimes. "Tem gente que liga dizendo: ‘Eu sei que você tem um amante’, e depois chantageia a pessoa", conta o delegado.

Arma – Com um celular em mãos, alguns criminosos conseguiram dar muito mais prejuízo do que outros que estavam armados. Um exemplo é Luis Carlos Bravim, líder da quadrilha do carro zero, que atuava há três anos vendendo por telefone carros que não existiam a pessoas que não faziam questão de vê-los antes de depositar o dinheiro.

O acusado, preso neste mês junto com um comparsa pela polícia de São Bernardo, movimentou cerca de 300 mil nos primeiros meses deste ano, segundo a polícia. O grupo transferia ligações de linhas fixas para celulares. Mais dificuldade para a investigação, que teve de cruzar informações para chegar ao paradeiro da quadrilha, em Jundiaí, interior do Estado.

O papo de Bravim rendeu um patrimônio bruto (da organização) de R$ 400 mil, afirma a polícia. Fora a casa, em um condomínio fechado em Alphaville, que vale cerca de R$ 1 milhão. Um homem chegou a depositar de uma só vez R$ 89 mil na conta da quadrilha.

Não caia no golpe

- Desconfie de ligações feitas a cobrar.

- Em seqüestros reais, geralmente, as ligações são rápidas. O contrário ocorre no golpe do seqüestro. Os criminosos obrigam a pessoa a ficar no telefone até que o dinheiro seja depositado.

- Muitas ligações são feitas de cadeias do Rio de Janeiro. Então, desconfie do sotaque.

- Os criminosos costumam ligar na hora de almoço. Como muitos saem para comer fora, fica mais difícil achar o parente.

- Não negocie. Peça para alguém chamar a polícia.

- Não se impressione de imediato com o fato de que os criminosos saibam informações sobre parentes. Peça, antes, para que alguém ligue para o local onde o familiar costuma ficar.

- Se for vítima do golpe, faça um boletim de ocorrência. Se alguém tivesse feito isso antes, poderia ter evitado que você fosse a próxima vítima.

Outros crimes pelo telefone

Venda de carro

l Estelionatário se passa por funcionário de uma montadora ou concessionária para vender carro zero. Oferece vantagens na venda do carro e pede depósito de entrada na conta bancária.

Empresário de futebol

l Em setembro, foram presos dois homens em Santo André acusados de dar um golpe no jogador Dedimar, do Santo André. Eles teriam se passado pelo ex-jogador e empresário Rui Ramos e o jogador depositou R$ 25 mil, que seriam destinados a um projeto social.

Amante

l A polícia chegou a registrar casos na região de ligações em que o golpista diz que sabe que a pessoa tem amante. Então, ocorre a chantagem.

Telefônica

l Golpistas ligam se dizendo funcionários da Telefônica. Pedem para que a vítima siga algumas instruções para resolver determinado problema. A linha acaba sendo bloqueada e transferida para os estelionatários.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;