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Alimentação de rua vai de acarajé a yakissoba na região

Em seis cidades, há pelo menos 1.401 ambulantes, com produtos para todos os gostos e bolsos

Bia Moço
Do Diário do Grande ABC
10/02/2019 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


 Cheiro atraente, preços que cabem no bolso e facilidade. Os três itens, atrelados à fome e à pressa do dia a dia, resultam na intensa procura pela tradicional comida de rua. O cardápio é variado: milho, pastel, salgados, lanches, acarajé, o famoso churrasquinho grego e até o novato yakissoba, com valores que variam de R$ 2,50 (um pão de queijo) a R$ 15 (yakissoba). Em seis cidades – exceto Rio Grande da Serra –, são pelo menos 1.401 ambulantes autorizados pelas administrações, concentrados, em sua maioria, nas áreas centrais, em torno de estações de ônibus e trem. A única ressalva, conforme especialistas, é avaliar os riscos que a praticidade pode trazer à saúde, principalmente em relação à contaminação.

A equipe do Diário percorreu as cidades do Grande ABC em busca das opções ofertadas pelo setor. Além dos terminais de transporte público, os centros comerciais e portas de faculdade são as principais escolhas dos ambulantes.

Caíque da Silva Nóbrega, 26 anos, garante oferecer o “melhor churrasco grego” de Santo André. O ponto comercial, a poucos metros da Estação Prefeito Celso Daniel da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), é bastante movimentado. Durante 20 minutos em que a equipe do Diário permaneceu no local, pelo menos 15 pessoas pararam para almoçar. “O movimento da estação é intenso, principalmente às 12h e às 18h. É venda garantida”, comemora o vendedor.

O cheiro da carne normalmente cumpre o papel de atrair a população, no entanto, quando o movimento está devagar, Nóbrega solta a voz para “chamar a freguesia”. Pelo valor de R$ 4 o consumidor compra um lanche de pão francês recheado com carne e vinagrete e tem direito a duas opções de suco. O vendedor garante que higiene é a principal preocupação.

“Além de usar luva e boné, para não cair cabelo, mantenho o espaço limpo.” O comerciante acredita que seu churrasco é diferenciado pelo tempero e qualidade. “Uso bife de fraldinha ou capa de filé, intercalo o espeto com cenoura, pimentão e tomate, e tenho tempero só meu.”

Para burlar a falta de licença da Prefeitura, ele atua na porta de uma lanchonete. O aluguel do ponto é de R$ 700 por semana, e seu faturamento líquido gira em torno de R$ 1.200. Das 8h às 21h, são vendidos cerca de 300 lanches, todos os dias, o equivalente a 30 quilos de carne, que ele compra no açougue ao lado. Já o pãozinho é fruto de encomenda, com entregas três vezes por dia.

O vendedor Fábio Fernandes, 28, é cliente fiel. Tanto que já se tornou amigo de Nóbrega. Ao não poupar elogios, o consumidor garante que vale a pena. “Não tenho costume de comer na rua, principalmente por questões de higiene e segurança alimentar. Mas neste churrasco eu confio. É rápido, barato. Compro e vou comendo no caminho para o trabalho. Não tem contratempo.”

O aposentado Alcindo Castilho, 73, parou na barraca de Nóbrega para fazer uma boquinha antes de ir para consulta médica. “Senti o cheiro e deu vontade. Está aprovado”, afirma. Questionado sobre a higiene da comida de rua, ele diz que tem medo das bactérias que pode pegar pela mão. “Acredito que nossa mão é o problema. A culpa de infecção alimentar, por exemplo, é muito mais nossa, que não nos higienizarmos antes da alimentação.”

Especialista em nutrição destaca cuidados para evitar contaminação
Embora a população busque praticidade, especialista afirma que não dá para deixar de lado os riscos da alimentação de rua, em especial o de contaminação. Conforme a nutricionista Carla Caratin, nem sempre os comerciantes respeitam os critérios definidos pela vigilância sanitária, como higiene das mãos, temperatura e prazo de validade dos produtos.<EM>

Segundo ela, se o preparador do alimento estiver com virose, por exemplo, pode passar a doença ao consumidor por meio do produto. “Pensando na higiene do manipulador, temos uma questão importante, que são as mãos. Dependendo da estrutura que essa pessoa tem, não há local para lavagem correta. Em alguns casos, a mesma mão que pegou o dinheiro, manipula o alimento.”

A contaminação biológica pode ocorrer por meio de bactérias e fungos, caso haja espirros por perto, temperatura errada e descumprimento do prazo de validade. Já a química é quando, por exemplo, o detergente não é devidamente retirado dos utensílios. Há ainda a física, quando cabelo, saliva ou folhas caem no produto. “Vale ressaltar que estes riscos também estão presentes em restaurantes e estabelecimentos comerciais. Não temos como ter controle do que ocorre na cozinha destes espaços”, diz Carla.

Venda de acarajé se mantém por 5 gerações
“Minha família vive do acarajé há 150 anos”. Foi com essa frase que Vanda Marques Pereira, 65 anos, resumiu a paixão por vender comida baiana em frente à Estação Ribeirão Pires da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), no Centro da cidade. Vinda de Salvador, na Bahia, há sete anos, a Baiana do Acarajé, como é conhecida pela população, afirma que não se imagina fazendo outra coisa na vida a não ser “alimentando e levando bênçãos” a quem come de sua especialidade.

Com sorriso no rosto e simpatia, a Baiana do Acarajé não fica um minuto parada. Cerca de 30 pessoas compraram a comida dela em menos de 15 minutos. “Não estou dando nem conta de preparar tantos acarajés”, brinca, enquanto conta, emocionada, a história de sua família. “Minha tataravó foi escrava, e fazia acarajé na senzala com o resto de feijão fradinho que sobrava. Minha bisavó aprendeu com a mãe e, dessa forma, a receita foi passando de geração em geração. A venda do acarajé foi o que sustentou pelo menos cinco gerações da minha família”, relembrou.

No ponto a baiana vende também abaré, outra comida típica de seu Estado natal. Os dois produtos são igualmente consumidos. Com valores de R$ 7 o item pequeno e R$ 10 o grande, não há quem não aprove.

Vanda possui alvará para o funcionamento de sua tenda, mas apela para que a Prefeitura ceda espaço maior para que ela possa ampliar os serviços. “Uso tudo fresquinho. Chego aqui às 14h, porque de manhã preparo todos os ingredientes. No fim do dia, o que sobra eu descarto. Prezo muito pela qualidade dos produtos e pelo bem estar da minha freguesia.”

A operadora de telemarketing Jéssica Souza, 27, conta que come toda semana na barraca da “tia”. “Antes de ela ter licença municipal, a Prefeitura a tirou daqui. Fizemos até abaixo-assinado para trazer a tia de volta.”

Em São Caetano, pedidos de licença triplicaram entre 2016 e 2018
Para o funcionamento legal, os comerciantes precisam buscar autorização municipal. Em São Caetano, por exemplo, o número de pedidos de licença triplicou entre 2016 e 2018, passando de 90 para 270. A administração realizou, recentemente, edital de chamamento para ambulantes e promete analisar os inscritos nos próximos dias.

A Prefeitura de Santo André afirmou que, entre 2016 e 2018, concedeu 184 licenças. Já São Bernardo conta com 423 ambulantes cadastrados no ramo alimentício. A Prefeitura afirma que emitiu, desde o início da gestão, 13 licenças. Os comerciantes que não possuem licença são notificados para cessar as atividades sob pena de apreensão de mercadorias e equipamentos. A fiscalização é feita diariamente. Em 2018, foram 126 notificações de profissionais irregulares e 18 apreensões de mercadoria.

Diadema conta com 392 licenças que permitem aos empreendedores populares venderem produtos alimentícios nas ruas. De 2017 para 2018 o cadastro subiu em 39 comerciantes. Mauá possui 123 licenças. Ribeirão Pires não emitiu autorizações entre 2018 e 2019. Atualmente, estão licenciados nove ambulantes no segmento.

A Prefeitura de Rio Grande da Serra não informou os dados até o fechamento desta edição.




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