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Preconceito é hipótese para crime contra homossexual em Diadema
Fabiana Chiachiri
Do Diário do Grande ABC
18/10/2005 | 08:19
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O auxiliar de limpeza Joseval Souza Matos, 28 anos, foi assassinado na madrugada de segunda-feira, na região central de Diadema, com um tiro no pulmão. O crime ainda não foi esclarecido pela polícia, mas os amigos da vítima, que testemunharam o assassinato, afirmam que o motivo teria sido preconceito pelo fato de Joseval ser homossexual.

De acordo com o contador Ed Carlos Caetano dos Santos, 28 anos, ele e seus amigos Claudinei da Silva, 29, Cristiano Lucio de Souza, 32, e Joseval – todos homossexuais – estavam em um videokê localizado na avenida Alda quando um grupo de três amigos entraram no local. “Estávamos sentados em uma mesa quando o Japonês e mais dois caras chegaram. Eles nos cumprimentaram e foram cantar uma música. Ao final, todos que estavam no local aplaudiram o Japonês. Ouvi um dos amigos dele se referindo a nós dizendo ‘as meninas gostaram de você‘. Acho que ele ficou ofendido”, diz Ed Carlos, que conhecia a vítima há seis meses.

Depois de pagarem a conta, os quatro amigos foram para o carro de Claudinei – um Palio preto – para ir embora. “Quando descíamos a avenida, percebemos o Japonês e seus amigos andando pela calçada. Ninguém mexeu com eles. Foi tudo muito rápido. Quando percebemos, o Japonês começou a atirar. Ouvi três disparos. O vidro da frente e da porta do passageiro quebraram. Ele atirou para machucar”, afirma Ed Carlos.

Após perceberem que Joseval havia se ferido, os amigos o levaram até o Pronto-Socorro Central de Diadema. “Ele disse que tinha sido atingido e o levamos direto para o hospital. Ele estava pálido, mas não escorreu uma gota de sangue. A enfermeira disse que ele tinha sofrido uma parada cardíaca. Só depois é que os médicos perceberam que ele havia sido baleado”, diz Ed Carlos.

A família da vítima estava inconformada com o crime. De acordo com a cunhada do auxiliar de limpeza, a dona-de-casa Verônica França Matos, 22 anos, Joseval era uma pessoa muito alegre. “Nunca deu problema para os pais. Adorava as sobrinhas e, sempre que podia, passava o Carnaval na Bahia, sua terra natal”, diz. A vítima morava com a família no Jardim São Judas, em Diadema, e trabalha para uma empresa em São Paulo.

Para o delegado Flávio Augusto Rodrigues, da Delegacia de Homicídios de Diadema, ainda é cedo para dizer qualquer coisa sobre o crime. “Ainda estou ouvindo as testemunhas. Não sabia que ele era homossexual. Nenhuma hipótese está descartada”, afirma.

Lei seca – De acordo com a secretária de Defesa Social de Diadema, Regina de Luca Miki, o videokê onde os dois grupos se reuniram antes do crime possuía alvará para funcionar de madrugada. “Já cassei a licença da casa, baseada no boletim de ocorrência. Se o local oferece insegurança, perde o alvará. O local poderá funcionar, mas tem de baixar as portas às 23h. Esse foi o primeiro homicídio registrado na região central da cidade este ano”, diz.

O fechamento de bares das 23h às 6h foi instituído pela lei seca, criada em Diadema em julho de 2002, com o objetivo de diminuir os homicídios na cidade. Segundo estudos feitos pela Secretaria de Defesa Social do município, cerca de 60% dos assassinatos de Diadema acontecem nesse período e grande parte é resultado de brigas dentro ou ao redor de bares.

Diadema tem cerca de 1,2 mil bares legalizados e, estima-se, cerca de 2,8 mil clandestinos. Alguns estabelecimentos podem requerer uma licença especial para funcionar após as 23h, mas terão de cumprir uma série de requisitos, como atestado de vistoria do Corpo de Bombeiros, possuir seguranças, ter uma entrada fechada e com isolamento acústico, entre outras especificações que serão avaliadas pela Prefeitura. “O mais importante é estar localizado em área de baixa criminalidade. A lei é rígida. Mesmo os estabelecimentos que possuem a licença são monitorados pelos fiscais da Prefeitura periodicamente”, afirma Regina.

Desde que a lei seca foi implementada, as taxas de homicídios estão diminuindo gradativamente em Diadema e a cidade chegou a ser citada positivamente este ano como exemplo no combate ao crime em relatório da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura). No primeiro semestre deste ano, Diadema registrou queda de 34,21% nos homicídios, ante o mesmo período do ano passado. No último mês de setembro, foram registrados três casos de homicídios na cidade, o que representa uma queda de 37,5% com relação ao mesmo período do ano passado.

Homofobia – Em agosto do ano passado, o estudante Rodrigo Monteiro Sakavicius, 23 anos, foi morto por dois falsos guias de turismo em Paranapiacaba, porque era homossexual. Robson Gonçalves da Silva, 22, e Fabiano Maia Eleno, 21, que foram presos no dia 12 de novembro, confessaram a autoria do crime e disseram que mataram o estudante porque não suportaram o jeito efeminado de Sakavicius.

“Isso não pode continuar assim. Enquanto não for criada uma lei contra a homofobia, os homossexuais continuarão morrendo”, diz o presidente da ONG (Organização Não Governamental) ABCDS (Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual), Marcelo Gouveia Gil.

Outro caso que ganhou repercussão nacional foi o de adestrador de cães Edson Néris da Silva, 35 anos. Ele foi espancado e morto por um grupo de 30 skinheads na praça da República, em São Paulo, em fevereiro de 2000. O digitador Dario Pereira Neto, 34, amigo da vítima, conseguiu escapar do espancamento e disse à polícia que o motivo do crime foi o fato de o adestrador ser homossexual. No dia seguinte, 18 integrantes do grupo Carecas do ABC foram presos em flagrante em um bar do Bixiga acusados do crime. Sete deles foram condenados.



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