Cultura & Lazer Titulo
Novo espetáculo de Gerald Thomas estréia no Sesc
Por Do Diário do Grande ABC
12/12/1999 | 14:44
Compartilhar notícia


Gerald Thomas volta aos palcos brasileiros na direçao e concepçao do espetáculo Ventriloquist, que estréia na quarta-feira no Teatro Sesc Vila Mariana, em Sao Paulo, e integra a vasta programaçao do 1.999 Reticências. Patrocinado pelo Sesc, o evento, iniciado em outubro, vem promovendo curtas temporadas de espetáculos de teatro, dança e música do Brasil e do exterior.

Na segunda semana de ensaio, o diretor já tinha esboçado os primeiros 30 minutos de espetáculo trabalhando com um elenco de dez atores numa das salas da Oficina Cultural Oswald de Andrade. "Por enquanto ainda nao posso falar muita coisa, porque tudo está em processo," disse Thomas em entrevista à reportagem. "O espetáculo já está preparado para viajar, daí o título em inglês", explicou. Ventriloquist ou ventríloquo é aquele que tem a capacidade de falar sem mover os lábios, de forma a parecer que outro fala. "Essa nao deixa de ser a dialética do ator, alguém que fala por um personagem", diz Thomas. No espetáculo, as falas dos atores serao gravadas e dubladas; um falará com a voz do outro.

Analogia ampla - Mas Thomas garante estar usando a analogia de forma mais ampla, para além do trabalho do ator. "Se o prolongamento da vida de uma obra inanimada depende da animaçao de alguém, isso é uma forma de ventriloquismo, ainda que nao tao óbvio quanto sentar um boneco no colo e fingir que ele está falando", diz. "Eu sou um ventriloquista porque falo por pessoas que nao estao mais aqui, falo por Beckett, por Shakespeare, por Aldous Huxley", diz. "É difícil perceber onde começa a minha obra e termina a de Beckett, onde termina Beckett e começa a de Huxley".

Isso significa que vem aí um espetáculo auto-referenciado, um palco cheio de citaçoes? "De jeito nenhum", garante Thomas. Ele critica o isolamento do artista ocorrido a partir do momento que o conceito ficou mais importante do que a obra, a idéia mais importante que a emoçao por ela transmitida. "O artista subiu ao Monte Sinai e ficou lá nao voltou mais", diz.

No ensaio, os atores contam com poucos adereços, bonecos de plástico e uma escada. Num determinado momento, um trio de atrizes move-se repetindo um trecho da peça Valsa nº 6, de Nélson Rodrigues. No alto da escada, destaca-se a atriz Muriel Matalon. "Vai ser revelada uma talentosíssima atriz brasileira", garante Gerald.

Movimentando-se em torno da escada, o elenco representa um bando de bêbados pontificando num fim de festa. Uma ressaca de fim de século? Apesar da apropriaçao do texto do dramaturgo carioca, Thomas garante nao estar criando um espetáculo cheio de citaçoes. "Acho que esse momento da arte chegou ao fim; eu sou um dos que nao pára de falar da autofagia da arte contemporânea". Mas ele nao nega já ter aderido a essa prática. "Também fiz isso e foi importante num certo momento, mas acho que agora tudo isso acabou, esses pequenos códigos, essas bulas para ver teatro".

Ventriloquist seria entao um passo à frente, apontaria para um novo caminho? "Essa é a idéia, mas com a consciência de que essa doença também me afetou", diz. "Interessa-me focalizar o momento em que Moisés sobe ao Monte Sinai e o seu povo fica embaixo adorando o bezerro de ouro", afirma. "Em Ventriloquist estou falando de Aarao e Moisés, que todo mundo sabe quem sao: um acredita que deus está num templo coberto de ouro e o outro que só existe dentro da gente; é só fazer um pequeno esforço mental e transferir isso para a arte".

Segundo Gerald, o artista moderno é uma espécie de Moisés, portador da promessa de liberaçao da arte do condicionamento estético que ocorreu neste século de dissecaçao da arte pela arte. "Eu acho que a arte deveria voltar a ter a beleza e a poesia da dor numa sociedade que está acostumada a excluir a dor de qualquer maneira, a tentar apagar qualquer tipo de inocência, de resposta espontânea do público". Ventriloquist - Concepçao, direçao e trilha sonora de Gerald Thomas. Duraçao: 2h15, sem intervalo. De quarta a sábado, às 21 horas; domingo, às 19 horas. R$ 15,00. Teatro do Sesc Vila Mariana. Rua Pelotas, 141, tel. 5080-3000.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;