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Quando falta amor de mãe
Rodrigo Cipriano
Do Diário do Grande ABC
23/07/2006 | 08:05
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Os primeiros sintomas são o isolamento social e a queda da auto-estima. Quase sempre, os ingredientes vêm acompanhados por um cenário de instabilidades financeira e no relacionamento com o marido. Um histórico de maus-tratos na família agrava o quadro. A equação pode resultar em uma mãe negligente. Conjunto de características dificilmente é notado quando os primeiros sinais se manifestam e, na maioria dos casos, só são descobertos tarde demais. Foi o que aconteceu com a dona-de-casa de Santo André, Jerusa Demétrio da Silva, 31, condenada a 16 anos de prisão por ter entregue o filho, de 4 anos, à própria sorte.

Bruno Demétrio Rodrigues foi trancado em seu quarto, a maçaneta da porta arrancada e a única janela do cômodo possuía grades. Sem alimento, ele passou a se alimentar das próprias fezes. Fraco, não saía da cama. Formaram escaras em suas costas, feridas típicas de pessoas em estado de coma. Bruno emagreceu e desenvolveu um quadro de desnutrição que o levou à morte, em 1998. A condenação da mãe ocorreu na semana passada.

Segundo a psicóloga Lígia Caravieiri, coordenadora regional do Crami (Centro de Atendimento aos Maus-Tratos na Infância), quando uma mãe não matricula seu filho na escola ou deixa de levá-lo a uma unidade de saúde para acompanhamento médico, ela já está sendo é negligente. “Essa é uma modalidade de maus-tratos subnotificada (confira ao lado as classificações de abuso), até porque muitas vezes os pais passaram pelas mesmas privações”, afirmou Lígia, que é especialista em violência doméstica. O psiquiatra Danilo Baltieri, professor da Faculdade de Medicina do ABC, completa dizendo que a intensidade da negligência evolui aos poucos.

No mês passado, 34 casos de negligência eram monitorados pelo Crami São Bernardo, número correspondente a 5% do total de atendimentos. Todos os registros tiveram a mãe como protagonista. A tese é reforçada por um levantamento nacional feito pelo Sipia (Sistema de Informações para Infância). O banco de dados desenvolvido pela Secretaria Especial de Direitos Humanos do Ministério da Justiça, com base em informações repassadas pelos conselhos tutelares municipais aponta a mãe como a principal violadora dos diretos da criança, com 147.546 denúncias entre janeiro de 1999 até a tarde da última sexta-feira. Logo atrás aparece o pai, com 133.863 queixas.

O problema não é só brasileiro. Um estudo elaborado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) em 2000 revelou que 57 mil jovens com menos de 15 anos haviam morrido em todo mundo, vítimas de abuso ou abandono.

Casos de mães que matam os filhos são mais comuns do que se imagina. Em maio desse ano, uma mulher de 23 anos foi presa em Agudos, interior de São Paulo, acusada de asfixiar a filha recém-nascida. Ela ateou fogo no corpo do bebê e enterrou a ossada no quintal de casa. Tudo porque queria esconder a gravidez do marido. Em fevereiro, a vendedora Simone Cassiano da Silva ficou famosa após ter sido acusada de atirar a filha na Lagoa da Pampulha, em Minas Gerais. A criança foi encontrada boiando, amarrado a um tronco de madeira.

Um dos casos mais famosos de maus-tratos ocorreu em Holywood e teve como protagonista Joan Crawford, ganhadora do Oscar de melhor atriz. Uma biografia não-autorizada assinada por uma de suas filhas adotivas, que mais tarde se transformou em filme, revela os horrores aos quais a garota e seu irmão eram submetidos. Surras, crises de histeria, castigos desmedidos. Apesar dos abusos cometidos pela estrela de cinema, as crianças ainda eram obrigadas a chamá-la de mamãezinha querida, apelido que dá título à história.




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