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Cartas ainda é o meio de comunicação mais acessível
Por Luciana Sereno
Do Diário do Grande ABC
01/02/2003 | 17:10
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A rotina é a mesma há dez anos. A cada 15 dias o metalúrgico Nivaldo Silva Martins, 26 anos, vai de bicicleta depositar na caixa dos Correios uma carta endereçada aos pais que ficaram na Bahia. Desde que chegou ao Grande ABC, Martins nunca mais voltou para sua terra natal. A comunicação com a família resume-se à troca de correspondência. É por meio das cartas, inclusive, que o metalúrgico se emocionou ao saber que a cirurgia pela qual a mãe passou havia dado certo e que ela estava bem de saúde. “Eu lia e chorava de felicidade pelo resultado e por saber que a operação só foi possível porque eu consegui juntar o dinheiro e mandar para ela.” O dinheiro também seguiu para a Bahia por meio dos Correios.

Mesmo diante de novas tecnologias, avanços da Internet e da telefonia, a carta continua sendo o meio de comunicação mais acessível para a população. Além disso, as cartas chegam a lugares ainda inexplorados pelos cabos de transmissão de linhas telefônicas ou de computadores. São ainda o único meio de chegar a endereços onde até mesmo a energia elétrica ainda não chegou.

Das 270 mil cartas, entre pessoais e jurídicas, que saem dos 45 postos do Grande ABC por dia, pelo menos 12,1% (32.660) são endereçadas a Estados do Nordeste do Brasil (ver quadro ao lado). Em média, outras 120 seguem para o exterior, as demais circulam pelas outras regiões brasileiras. Segundo estatísticas dos Correios, Bahia, Ceará e Pernambuco são os principais destinos das cartas enviadas ao Nordeste. Por dia, seguem para esses Estados 8.520, 7.680 e 7.560 correspondências, respectivamente.

O volume mostra, portanto, que a alternativa ainda é bem usada e mantém diferenciais se comparada à eficácia dos e-mails ou dos telefonemas. Para muitas pessoas, a carta é a melhor forma de expressar os verdadeiros sentimentos. “A principal diferença entre escrever e telefonar é que quando a gente liga fala o básico e fica mais preocupada com a conta no fim do mês do que com o que está falando. Na carta, dá para escrever o quanto quiser e por isso a emoção fica mais forte. A gente consegue dar detalhes”, disse a empregada doméstica Elisabeth Soares de Assis, 32.

Há um ano, ela chegou a Santo André. Veio do Recife “apenas para conhecer” e acabou ficando depois que o filho decidiu encontrá-la por aqui. No Nordeste ficaram a mãe e as cunhadas e o contato resume-se hoje a cartas imensas e telefonemas relâmpagos. Foi por carta que, na última quarta-feira, Elisabeth comunicou a mãe que o plano de passar o feriado de Carnaval em família, lá no Recife, foi adiado para as festas de fim de ano. “Nunca chorei tanto para escrever como dessa vez.” Elisabeth conta que jamais teria sentido a mesma sensação se tivesse passado a notícia por telefone. Certamente, no intuito de economizar, a doméstica não despenderia tempo com as explicações que, na carta, puderam ser minuciosas.

Aliado – Quem está prestes a ter o posto do Correio como um grande aliado para “matar” a saudade é a modelista Edelvina Gutierrez, 53. “Meu filho vai se casar e mudar para a Bahia. A família da noiva é de lá e eles já me avisaram da intenção.” Como em 23 anos nunca ficou distante do filho por tantos quilômetros e por estar acostumada a trocar confidências com o rapaz, Edelvina já sabe que terá que encontrar alternativas para manter a união e continuar dividindo com o filho os acontecimentos do dia-a-dia. “É claro que a gente vai se falar por telefone, mas não tenho dúvidas de que os grandes bate-papos serão por carta.”




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