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Pesquisadores da região relatam incertezas sobre futuro de bolsas

Mestrandos e doutorandos temem que cortes federais afetem a conclusão de seus trabalhos

Flávia Kurotori
Do Diário do Grande ABC
23/09/2019 | 07:00
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Celso Luiz/DGABC


Incerteza. Este é o sentimento que paira entre os pesquisadores do Grande ABC que dependem de bolsa do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), agência de incentivo à pesquisa ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, e da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), fundação do Ministério da Educação. Ainda que os valores tenham sido pagos normalmente até o momento, eles temem pelo depósito de outubro, que é referente aos trabalhos realizados neste mês.

“É desesperador porque a gente não sabe se vai receber ou não, já que o CNPq está praticamente nocauteado e todas as notícias deixam a gente com muito medo de não conseguir prosseguir com o desenvolvimento da pesquisa”, afirma Bruna Rocha Almeida, biomédica de Santo André, que desenvolve pesquisa de doutorado na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). 

A pesquisadora analisa como o sistema humano interage com o fungo causador da paracoccidioidomicose, micose existente apenas na América Latina, sendo 80% dos casos no Brasil, e que pode causar infecção generalizada. Segundo ela, caso o benefício seja cortado, o estudo será suspenso. “Neste caso, não consigo ir para o laboratório, então vou ter que interromper a pesquisa, ou seja, todo dinheiro público que já foi investido nela será perdido”, explica. A pesquisa é financiada desde dezembro de 2018, com vigência até novembro de 2022.

Mestranda em evolução e diversidade na UFABC (Universidade Federal do ABC), a bióloga da Capital Michaella Andrade está em situação parecida. Recebendo auxílio via CNPq, ele analisa o cenário como “complexo”. “Tenho medo em relação à continuidade da pesquisa porque, caso suspendam a bolsa, não vou chegar nem aos resultados parciais que devo apresentar em dezembro próximo”, relata. “Eu teria vínculo até maio do ano que vem, mas está tudo incerto.”

Pesquisadora da UFABC por meio da Capes, Mariana Moga de Moura e Silva, educadora musical da Capital, realiza seu trabalho de mestrado em neurociência e cognição, analisando a voz cantada no âmbito cerebral. “Os estudos que desenvolvemos beneficiam não apenas a universidade, mas toda a sociedade, então, é um trabalho que fazemos para resolver problemas e melhorar a vida da população”, observa. “Comecei em fevereiro deste ano e terminaria em fevereiro de 2021, ou seja, eu ainda teria o ano que vem inteiro pela frente, mas não sei como será”, conta Mariana. “É muito triste porque não sei se vou precisar abrir mão de tudo ou se vou poder continuar.” 

CENÁRIO 

De acordo com a Lei Orçamentária Anual, aprovada em 2018, o CNPq poderia gastar R$ 787 milhões em 2019, sendo que para suprir todos os auxílios até o fim do ano, seria necessário R$ 1,58 bilhão. A pasta responsável afirma que o pagamento dos próximos meses depende da liberação de orçamento extra pelo Ministério da Economia, o que “estaria próximo de acontecer”, segundo o secretário de Orçamento, George Soares.

Já a Capes garantiu, no dia 11, oferta até 2020 de 3.182 novas bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado, que fazem parte de 5.613 benefícios que não seriam renovados pelo Ministério da Educação. Após liberação de R$ 600 milhões pela pasta chefiada por Paulo Guedes, o orçamento da fundação passou a ser de R$ 3,05 bilhões no próximo ano.Sexta-feira, o governo anunciou descontingenciamento de R$ 8,3 milhões. Destes, R$ 1,99 bi seria para a Educação e parte pode ser destinada à Capes.

Caso auxílio seja cortado, bolsistas também sofrerão prejuízos pessoais

Um dos requisitos para receber auxílio do CNPq ou da Capes é dedicar-se integralmente à pesquisa. Assim, interessados deixam empregos de carteira assinada, tornando a bolsa – que varia entre R$ 1.500 e R$ 7.000, dependendo da modalidade e nível de especialização – a única fonte de renda. “Pesquisa requer dedicação exclusiva, então estas pessoas terão um prejuízo enorme e ficarão desempregadas”, assinala Flávia Calé, presidente da ANPG (Associação Nacional de Pós-graduandos). 

Além disso, em todo o mundo o índice de desemprego entre pessoas pós-graduadas é, em média, de 2%. No Brasil, é de 25%. “Estamos em um País que não absorve este tipo de mão de obra, o que afasta mestres e doutores para outros países”, salienta Luiz Henrique Santana, doutorando no programa de psicologia da USP (Universidade de São Paulo), bolsista do CNPq e morador da Capital.

“Temos o desafio de mostrar a importância da ciência e evitar os cortes e estes prejuízos”, finaliza Flávia.




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