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Falsa igreja aplica golpes em Sto.André
Bruno Ribeiro
Marco Borba
Do Diário do Grande ABC
30/07/2006 | 03:43
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A Igreja Internacional da Promessa, no Centro de Santo André, se aproveita do desespero de seus ‘fiéis‘ para vender milagres. No discurso dos falsos bispos, entidades de Umbanda viram demônios que destruirão a vida de qualquer um que não coloque a mão no bolso para ‘desfazer o trabalho‘. Há quem tenha perdido quase R$ 50 mil para a falsa instituição religiosa. O Diário comprovou o caso de charlatanismo.

O repórter inventou uma história triste e freqüentou a igreja para confirmar a veracidade das denúncias. Um dos bispos não precisou de muito tempo para diagnostigar os problemas fictícios como conseqüência da atuação do Exu-Caveira, uma entidade da Umbanda. A solução do problema seria um trabalho espiritual utilizando cinco velas especiais. As velas precisariam ser encomendadas na própria igreja, ao preço total de R$ 500 (R$ 100 cada uma). Nas lojas do ramo, esse tipo de vela (28 dias) custa cerca de R$ 20.

A igreja é internacional. Mas a única sede conhecida da entidade, na rua Carlos de Campos, próximo ao terminal de trólebus da cidade, fica em um prédio sem regulamentação na Prefeitura e sem alvará de funcionamento. Em uma das denúncias recebidas pelo jornal, que virou inquérito criminal, a família acusa a igreja de ter conseguido R$ 47 mil por meio de estelionato. No outro golpe, as vítimas, com medo, preferiram não registrar nenhuma ocorrência. Alegam ter perdido R$ 25 mil. As denúncias citavam o bispo Carlos Roberto de Miranda, que trabalha em uma rádio da Capital. Outro homem tentou aplicar o golpe na reportagem. O que leva a crer que bispos não faltam no templo da instituição.

A reportagem visitou o local na última quarta-feira, às 14h (horário do culto, segundo a placa da entrada), mas foi aconselhada a tratar diretamente com o bispo. Foi aí que se percebeu o quão espontâneas eram as doações. “Para falar com o bispo, pedimos uma contribuição de R$ 20 para nossa rádio”, disse a moça no balcão do fim da escadaria. A reportagem insistiu, mas não teve escolha. Teve de pagar e recebeu recibo. A moça colheu dados preliminares, como estado civil, situação trabalhista, local de residência e idade. Todos os dados foram inventados.

Na sala das consultas, atrás das cadeiras dos fiéis, outro homem, com jeito de segurança. Pela descrição feita por vítimas, é o bispo Carlos Roberto de Miranda. Depois do pagamento (depositado na urna do altar), o bispo chamou o repórter. O homem usava camisa de manga curta, gravata e uma espécie de batina por cima. Perguntou o que trazia o suposto fiel até o templo.

A história inventada foi sobre um pai doente e um irmão supostamente viciado em cocaína (leia diálogo na página 6). O bispo mordeu a isca. “Esses problemas foram causados por um Exu-Caveira que colocaram na sua casa”, disse o bispo. Ele alegou que, para retirar a entidade da vida do repórter, era preciso realizar um trabalho, utilizando, entre outros itens, cinco velas fornecidas pela igreja. Era preciso freqüentar um culto realizado no domingo.

O repórter saiu da igreja alegando ter de ir ao banco retirar o dinheiro. Quando voltou, dizendo que não havia conseguido sacar e que demoraria um pouco mais, o bispo não desistiu. “Quando você saiu daqui, apresentei seu problema a Deus. Você não vai chorar mais”. E depois insistiu para trazer o dinheiro o mais rápido possível.

Estelionato, artigo 171 do Código Penal, tem pena de um a cinco anos de prisão. Consiste em “obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio ou tratamento”. O promotor criminal Amaro José Thomé, da 1º Vara Criminal de Santo André, diz que é comum que golpistas se apóiem na liberdade religiosa garantida pela Constituição para praticar crimes de estelionato impunemente.

Perseguição – Após ser procurado pela reportagem, na sexta-feira, o presidente da Igreja, que se identificou como Carlos Roberto de Miranda, disse que sofre perseguição religiosa. Alegou que o próprio repórter é quem acenderia as velas, e que ele poderia as ter comprado em qualquer lugar. Por isso, não viu nada de errado na ação. Segundo o bispo, o preço da vela é o praticado no mercado. Sobre a falta de regularização e alvará de funcionamento junto à Prefeitura, voltou a usar o argumento da perseguição religiosa. Depois, desligou o telefone.



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