A revolta dos delegados foi o tom de uma assembléia realizada pela categoria na última quinta-feira, onde os participantes decidiram elaborar, nesta semana, um documento que será encaminhado ao presidente Fernando Henrique Cardoso para alertar sobre os riscos de uma crise envolvendo as instituiçoes policiais caso o governo e a comissao nao abram espaço para a polícia nas discussoes. Coelho Neto, que é também delegado federal no exercício da funçao, sustenta que a principal meta da comissao é desqualificar a polícia e usurpar as funçoes dos delegados para transferí-la a procuradores da República e promotores. Ele alega que, com todos os seus defeitos, a polícia é uma instituiçao transparente, enquanto o Ministério Público nao sofre nenhum tipo de fiscalizaçao.
A comissao, presidida pela professora de direito processual da Universidade de Sao Paulo (USP), Ada Pelegrino Grinover - que também é doutora pela Universidade de Milao -, foi criada no início do ano pelo Ministério da Justiça - na gestao de José Carlos Dias - e confirmada em maio, pelo atual ministro, José Gregori. É formada por advogados, membros do Ministério Público, juízes aposentados e professores de direito. Seus integrantes deverao entregar ao governo o novo esboço do CPP até novembro. Depois, as propostas serao transformadas em projeto de lei e encaminhadas ao Congresso.
Coelho Neto diz que por raiva e preconceito em relaçao a polícia, a comissao alijou os delegados de qualquer debate sobre uma matéria que definirá a forma de apuraçao dos crimes no país. O novo código poderá terminar com a figura do inquérito policial e transferir a coordenaçao das investigaçoes a procuradores e promotores. Os policiais - incluindo delegados, agentes federais e investigadores - se transformariam, segundo ele, numa espécie de apêndice do Ministério Público.
"Será que nós vamos aceitar essas mudanças de braços cruzados?", diz Coelho Neto. Ele nao tem dúvidas de que, se o perfil da comissao nao for modificado para garantir a participaçao dos policiais nas discussoes, a insatisfaçao desembocará numa crise de conseqüências imprevisíveis. O delegado sustenta que, pelo perfil da comissao, o novo CPP "será endereçado ao enfraquecimento das provas de uma investigaçao e se transformará num instrumento de impunidade".
Os policiais querem também derrubar a necessidade de ordem judicial para realizar buscas em casa de suspeitos - a medida ficaria sob a responsabilidade de um delegado, que responderia judicialmente no caso de ocorrer arbitrariedades - e restabelecer o critério da identificaçao criminal de indiciados, que foi abolida pela Constituiçao de 1988. Coelho Neto diz que as ordem judicial emperra as investigaçoes e a falta de identificaçao - conhecido na gíria policial como o ato de tocar piano - tem levado muitos inocentes para a cadeia. Há muitos casos de cidadaos que perdem ou têm seus documentos roubados e acabam sendo condenados no lugar dos verdadeiros bandidos.
Os delegados paulistas se reúnem novamente esta semana para elaborar o documento a ser enviado ao presidente Fernando Henrique Cardoso e discutir uma medida judicial pedindo que os federais possam debater publicamente as posiçoes da categoria. O recurso será contra a própria Polícia Federal, cujo estatuto interno, proíbe policiais de participar de reunioes ou dar entrevistas. "Queremos quebrar uma barreira interna e garantir o direito de manifestaçao dos policiais federais", diz o delegado Armando Coelho Neto.
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