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Aedes transgênico é alternativa

Empresa aposta na produção do inseto contra transmissão da dengue, zika vírus e chikungunya

Vanessa de Oliveira
Do Diário do Grande ABC
28/03/2016 | 07:00
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Divulgação


Por mais impossível que pareça, existe ‘Aedes aegypti do bem’. Esse é o nome dado a um projeto desenvolvido pela Oxitec, empresa britânica com fábrica em Campinas, no Interior paulista, que produz o mosquito geneticamente modificado. No último dia 18, a OMS (Organização Mundial da Saúde) publicou recomendação de uso do inseto transgênico como alternativa ao combate do transmissor da dengue, zika vírus e chikungunya.

O posicionamento integra as conclusões do VCAG (Grupo Consultivo de Controle de Vetor, na sigla em inglês), que se reuniu nos dias 14 e 15 de março para discutir o uso de novas ferramentas de controle de vetor em face ao surto de zika vírus na América Latina.

A fêmea do inseto é a responsável por picar as pessoas, já que precisa de sangue para a produção de ovos. A linhagem transgênica, denominada OX531A, foi criada em 2002, quando ovos do Aedes aegypti receberam microinjeção de DNA com dois genes. Um deles causa a sobreprodução da proteína tTAV, que, em grandes quantidades, é mortal para o desenvolvimento do mosquito e não permite que ele atinja a fase adulta, ou seja, capaz de voar e se reproduzir. Para impedir que os insetos geneticamente modificado morram antes da fase adulta, eles são colocados, enquanto larvas, em contato com a tetraciclina, substância que impede a atividade do transativador, responsável por controlar a expressão da proteína tTAV. Na fase de pupa (estágio intermediário entre a larva e o adulto), as fêmeas são descartadas.

“Quando o mosquito transgênico macho é liberado no ambiente, ele vai copular com a fêmea, transmitindo o gene que produz a proteína tTAV. Ela vai botar os ovos, mas a larva morrerá antes de virar adulto”, explica Guilherme Trivellato, gerente do Projeto Aedes do Bem da Oxitec, em Piracicaba. Segundo ele, o processo desde o recolhimento do ovo até a soltura do mosquito leva de dez a 11 dias. Estudos mostraram que o OX513A vive de dois a quatro dias na natureza.

A ação já foi testada em países como Malásia, nas Ilhas Caiman e no Panamá. No Brasil, o Aedes aegypti do Bem recebeu permissão da CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) para realizar projetos em todo o território nacional. A comercialização, no entanto, só pode ser feita após o registro comercial junto à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). “A Anvisa está acostumada a trabalhar com remédio, vacina, mas nunca teve que avaliar um mosquito transgênico. Jogamos um abacaxi no colo deles”, fala Trivellato.

De acordo com o órgão nacional, a documentação apresentada pela empresa está sendo analisada “em caráter prioritário, inclusive com consultas a outras instâncias reguladoras internacionais que tratam de temas técnicos semelhantes”. A Anvisa acrescenta que está sendo avaliada sua competência para tratar do assunto e, em caso positivo, o seu enquadramento regulatório.

Caso seja aprovada a comercialização, Trivellato diz não saber precisar quanto custariam os mosquitos transgênicos. “A ideia é vender solução, eles funcionam como ferramenta. A quantidade varia de lugar para lugar e vários fatores influenciam no custo.”

Iniciativa já apresenta bons resultados em Piracicaba

A cidade de Piracicaba, no Interior paulista, é pioneira no Estado na utilização do Aedes aegypti do Bem. O município conheceu a tecnologia em 2014, durante evento voltado a gestores da Saúde e iniciou as tratativas com a empresa Oxitec para aplicar o mosquito em um bairro da cidade, de forma experimental.

O projeto-piloto, que está sendo realizado no Cecap/Eldorado, área com 5.500 habitantes, teve início em março de 2015 e a soltura dos mosquitos aconteceu em 30 de abril. Segundo a Prefeitura, até o dia 4 de março de 2016 foram liberados 36 milhões de mosquitos geneticamente modificados naquela região. “As liberações oscilaram entre 800 mil e 1 milhão de mosquitos por semana”, fala a administração municipal, em nota.

Segundo a Secretaria de Saúde da cidade, em janeiro foi registrada uma redução de 82% das larvas selvagens do Aedes aegypti na área tratada, na comparação com a área controle (Jardim Alvorada). “No ano-dengue 2014/2015, houve 132 casos da doença na área tratada. Já no ano-dengue 2015/16, até o momento são quatro casos confirmados da doença”, ressalta.

O primeiro ano do projeto custou R$ 150 mil ao município. A empresa salienta que a parceria com a Prefeitura não se trata de uma venda do mosquito, mas que a cidade “está fazendo contribuição para ajudar a arcar com os custos do projeto.”

A administração diz que, “diante do sucesso da experiência”, irá realizar por mais um ano o teste na região do Cecap/Eldorado, até para obter dados mais confiáveis e que permitam a análise do desempenho do mosquito no período chuvoso, além de ampliar o uso da tecnologia na região central do município, abrangendo uma área de 60 mil habitantes.

Em janeiro, a Prefeitura assinou protocolo de intenções com a Oxitec e, em contrapartida, a empresa irá construir biofábrica no município com capacidade para produzir 60 milhões de mosquitos por semana.

Testes com o inseto transgênico também foram feitos nas cidades de Juazeiro e Jacobina, na Bahia.




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