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Vale-refeiçao da polícia só dá para uma coxinha
Sérgio Saraiva
Da Redaçao
26/03/2000 | 19:52
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O vale-refeiçao dos policiais civis e militares mal dá para comprar o mais barato dos lanches de qualquer padaria, a coxinha de galinha. Vale apenas R$ 2, sem reajuste desde o início do Plano Real. E ainda por cima, nem sempre ele é aceito pelos comerciantes, que nem todos conhecem as marcas adotadas, como Social-Cheque ou CBA. Por isso, o bônus de alimentaçao dos policiais ganhou entre eles o apelidado de vale-coxinha.

Na Polícia Civil, o vale é distribuído apenas para os investigadores de 3ª, 4ª e 5ª classe, sendo suprimido nas demais categorias da carreira. Apenas soldados, cabos e 2º e 3ª sargentos operacionais, que nao ficam aquartelados, recebem o benefício na Polícia Militar. Esses sao exatamente os homens de frente, das patrulhas, os que vao às ruas para combater a criminalidade.

Na Padaria Central, de Santo André, a própria coxinha do apelido custa R$ 1,50, o que nao dá sequer o direito de acrescentar um refrigerante. Local muito freqüentado por policiais, o estabelecimento oferece poucos produtos que podem ser pagos com o bônus de alimentaçao. Ciente da situaçao, o proprietário Elias Alberto Gomes, 51 anos, prefere oferecer pelo menos o cafezinho como cortesia. "Eu prefiro pagar pelo que bebo e como, mas nao está dando", afirmou um policial.

As opçoes nao sao muitas. Um suco de laranja, por exemplo, custa R$ 1,50, mesmo preço de um pedaço de pizza, e uma vitamina R$ 1,90. O sanduíche com mortadela, o mais barato, custa R$ 1,90, já estourando o valor do vale. O vale-coxinha garante a compra de dez paezinhos de 50 g, mas só se for para levar para casa. O cafezinho (expresso) com pao e manteiga custa R$ 1,30.

Acreditar, no entanto, que um policial de plantao consiga matar sua fome com tal poder aquisitivo é o mesmo que admitir que um trabalhador possa sobreviver com um salário mínimo. Uma refeiçao um pouco melhor, o chamado PC (bife, dois ovos, pao e salada), custa R$ 4,50. Um PF (prato-feito), em bares e lanchonetes, custa entre R$ 3 e R$ 3,50. Em restaurantes por quilo, o custo médio das refeiçoes fica em torno de R$ 6 a R$ 7, valor médio dos tíquetes-refeiçao dos funcionários de empresas privadas.

"Eu prefiro reunir dois ou três amigos, uma vez por mês, e pagar com os vales um jantar em restaurante barato", garante um orgulhoso investigador solteiro. Proibido pela Secretaria de Segurança de dar entrevistas, ele pediu para nao ser identificado. Em média, um investigador de 5ª classe recebe 15 vales por mês, num total de R$ 30. "É um vale para cada dia trabalhado. Seu for pagar um lanche, sempre vou ter de completar com dinheiro", disse ele. Em geral, as jornadas de trabalho dos policiais sao de 12 horas ininterruptas.

Um policial casado, que também nao pode ser identificado, usa os vales para pagar os lanches dos filhos na escola. Um terceiro prefere deixar o vale-coxinha para a esposa pagar a conta no açougue; enquanto outro abate sua conta de cafezinho no bar da esquina. O constrangimento de usar os vales é geral. O apelido e as piadas nao atenuam um clima de insatisfaçao.




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