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Chico ameaça Pádua com peixeira

Vereador de S.Caetano culpa articulador por derrota
na Câmara e, com a faca no pescoço, exige demissão

Por Gustavo Pinchiaro
Do Diário do Grande ABC
17/12/2014 | 07:00
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Montagem/DGABC


Articulador político da Prefeitura de São Caetano, Antonio de Pádua Tortorello relatou ter sofrido ameaça de morte por parte do vereador Chico Bento (PP), que o responsabiliza pela derrota na tentativa de chegar à presidência da Câmara, anteontem. Segundo Pádua, o progressista entrou em sua sala, nas dependências do gabinete do prefeito Paulo Pinheiro (PMDB), no Palácio da Cerâmica, colocou peixeira no pescoço e, aos gritos de “traidor”, exigiu que se exonerasse do Paço. Caso contrário, o “mataria ali mesmo”, ontem, por volta das 10h.

Em entrevista exclusiva ao Diário (leia o relato completo abaixo), Pádua detalhou, sem esconder os traumas e com a voz trêmula, os momentos de medo, tensão e ansiedade pelos quais passou em seu próprio ambiente de trabalho. O articulador alega ter sido acusado de conspirar a favor da desarticulação da candidatura de Chico Bento, que tinha apoio de Pinheiro, para favorecer a vitória de Paulo Bottura (Pros), eleito com adesão da oposição.

O caso foi registrado em BO (Boletim de Ocorrência), no 1º DP (Santo Antônio) de São Caetano, sob o número 5528/2014, com natureza de ameaça, constrangimento ilegal, sequestro e cárcere privado. Cinco testemunhas foram destacadas no registro.

Pádua contou ter chegado ao Palácio da Cerâmica por volta das 10h e foi informado pelo chefe da comissão de festejos, Wilson Caboclo, que Chico Bento o aguardava para conversa em sua sala. Quando adentrou ao local, foi pedido que seu assessor se retirasse. Em seguida, o progressista trancou a sala. “Nunca tranquei a porta, não existia chave”, destacou o político.

A partir deste momento, o vereador sacou a peixeira e colocou no pescoço de Pádua, que foi pressionado em uma janela. “Ficou quatro minutos com a faca no meu pescoço”. Chico Bento teria dito que acabaria com os traidores que provocaram sua derrota no Legislativo, um por um, e que o articulador do Paço seria o primeiro. O progressista, então, teria exigido pedido de exoneração, deixando a sala, trancado a porta e retornado com a presença de Pinheiro para formalizar a demissão.

“Ele trancou o prefeito e eu na sala e foi embora”, discorreu Pádua, que solicitou desligamento da função ao prefeito, detalhando a ameaça. A secretária de Pinheiro, a pedido de um assessor, teria destrancado a porta e liberado os dois. O articulador deixou a Prefeitura às pressas e foi se consultar com os vereadores Bottura, Flávio Rstom (PTB) e Gérsio Sartori (PTB).

O destempero de Chico Bento ficou visível quando ele declarou de maneira confusa o voto em si na sessão de anteontem, quando o placar estava seis votos a dois para Bottura. Ao término da eleição, ele esbravejou contra o presidente eleito e deixou o plenário correndo, visivelmente abalado, com destino ao Paço. Na sede da Prefeitura, o Diário tentou contato, mas o vereador correu para dentro de uma sala e trancou a porta.

Nos bastidores, a informação é que o progressista tinha apoio da maioria até domingo. O ex-prefeito e atual secretário estadual de Esporte, Lazer e Juventude, José Auricchio Júnior (PTB), articulou a migração de três votos para Bottura e virou o jogo.

Chico Bento foi orientado a não atender telefonemas e evitar lugares públicos em São Caetano. O vereador foi contatado por telefone, no gabinete e por e-mail, mas não retornou à equipe do Diário. A Prefeitura de São Caetano e o prefeito Paulo Pinheiro não se posicionaram sobre o caso.


Ato é considerado quebra de decoro e pode custar perda do mandato

A ameaça que o vereador de São Caetano Chico Bento (PP) teria feito ao articulador político do Paço, Antonio de Pádua Tortorello, poderá render cassação do mandato do progressista – pedido tem de ser apresentado por vereador.

De acordo com o especialista em Direito Eleitoral Alberto Rollo, a postura do parlamentar pode ser entendida como briga por funções profissionais e ser enquadrada como quebra de decoro parlamentar. “Se fosse uma briga decorrente da disputa de times, como Palmeiras e Corinthians, não chegaria a esse ponto. Foi desentendimento profissional. Cabe a um dos vereadores protocolar investigação por quebra de decoro”, argumentou.

A decisão do Legislativo, entretanto, será política e votada em plenário. “Não é avaliação jurídica, mas sim política e pode render a perda do mandato. Olhe o caso do (deputado federal) Jair Bolsonaro (PP-RJ), em que estão pegando no pé dele pela declaração sobre uma deputada (Maria do Rosário, PT-RS)”, lembrou Rollo. A postura de Chico Bento já indignou os 11 vereadores que contribuíram para a derrota.


Entrevista. Antonio de Pádua Tortorello, articulador político da Prefeitura de São Caetano

Como ocorreu o episódio?
Por volta das 10h, cheguei à Prefeitura. O Wilson Caboclo (presidente da comissão de festejos) me disse que o Chico Bento queria falar comigo e me levou até a minha sala. Lá estava o professor Eduardo Maldonado, meu assessor. O Caboclo pediu para o Maldonado sair. Ele saiu e a porta foi trancada. Achei estranho, porque não existe chave. Nunca tinha trancado a porta.

A chave não fica com a secretária do prefeito?
É, fica com a Tereza. Ele (Chico) trancou a porta e me tacou uma peixeira no pescoço. Falou assim: ‘Vou acabar com todos os traidores e o primeiro é você. Você vai pedir demissão, se não vou te matar aqui. Vou lá chamar o doutor Paulo e você vai pedir demissão’. Ficou com a faca no meu pescoço por quatro minutos. Ele me encostou em um vidro que tem lá. Eu só pedia calma, dizendo que não participei da articulação. Mas ele dizia que sim, que tinha uma relação com os traidores. Dizia que ia atrás de um por um. Então ele saiu e me trancou na sala.

Saiu com a peixeira na mão?
Não, ele guardou embaixo da blusa. Ele voltou com o doutor Paulo dois minutos depois. Ficou do lado de fora e trancou a porta. Nessa hora, relatei ao prefeito tudo que tinha acontecido. O Chico Bento entregou a chave para uma tal de Vera e foi embora. O Maldonado viu pelo vidro e foi chamar a Tereza, que abriu a porta. É um fato lamentável para São Caetano e para o Grande ABC.

E o que o prefeito disse?
‘Vamos com calma, vamos ver direito, verificar o que está acontecendo’. Acabou nisso.

Então o sr. foi acusado de ser o culpado pela derrota dele?
Ele me acusou de ser um dos culpados da derrota dele na Câmara. Não tive nada a ver com isso. Ali o Paulo (Bottura) é meu amigo. O Chico Bento eu considerava amigo. Estou em assessoria e jamais iria trair o prefeito. Jamais.

Quais foram os passos do sr. ao deixar o Paço?
Fui conversar com o presidente eleito da Câmara, o Paulo Bottura, e com os vereadores Flávio Rstom (PTB) e Gérsio Sartori (PTB), que são meus amigos. Pedi conselho para tomar um posicionamento. Neste momento, recebi um telefonema do (secretário de Governo e Saúde) Sallum (Kalil Neto) dizendo que o prefeito queria conversar comigo na Prefeitura. Não voltei, fiquei com receio de voltar e encontrar esse rapaz (Chico) de novo.

O sr. registrou BO (Boletim de Ocorrência)? Quer investigação?
É claro, fiz o BO e não posso voltar atrás. É terrível. Fiquei em estado lamentável.

Se sente ameaçado?
Lógico que me sinto ameaçado, e muito. Fui encostado em um vidro com uma peixeira no pescoço durante quatro minutos e ele estava completamente fora de si.

Temeu perder a vida? Tem medo de voltar à Prefeitura? Seria necessário escolta policial?
Lógico que eu temi. Estou com medo, sim. Sem escolta eu não voltaria à Prefeitura.

Qual a idade do senhor e quantos anos trabalhou no Paço?
Estou com 73 anos. E tenho 54 anos de vida pública. Nunca vi uma coisa dessa. Trabalhei com 11 prefeitos e (não vivenciei) nada parecido.

O sr. acha que ele tem condições de continuar no Legislativo ou deveria perder o mandato por quebra de decoro?
Acho que a Câmara deve apurar. É fato muito grave.

Faltou articulação na eleição à presidência do Legislativo?
Eu sou o articulador e só fiquei sabendo do nome do Chico Bento na sexta-feira à tarde, quando estava tudo consumado. É lógico que faltou articulação. Normalmente, o prefeito fala um nome para o articulador e ele trabalha esse nome. Mas não foi feito assim. Na quinta-feira alertei o prefeito sobre o movimento que estava acontecendo. Fiquei sabendo disso por meio do vereador Severo (Neto, PSB). O doutor Paulo falou para não ficar preocupado, tirou uma listinha do bolso e disse: ‘Já conversei com todos os vereadores e está tudo em ordem’.

Então foi o prefeito quem conduziu a articulação?
Ele conduziu pessoalmente. O Paulo é uma pessoa pura e na pureza acreditou na palavra dos vereadores. Só que Câmara não funciona assim. É preciso articulação pesada. É articulação de 30 a 40 dias. Ele conversava com vereadores, pedia o voto. Segundo os vereadores, foi dito que dariam a governabilidade a ele, não prometeram o voto.

O governo falhou?
Houve uma falha. Não sou o culpado. Se quiserem colocar a culpa, tudo bem, mas não participei de nada. O meu trabalho de articulação se resumia a encaminhar pedido dos vereadores. Coisas como poda de árvore, vaga de escola. Fazia os pedidos por escrito e encaminhava para os secretários. Minha capacidade de articulação não é aproveitada.

O sr. segue no cargo, pretende conversar com o Pinheiro?
Entreguei o cargo ao prefeito. Isso depende do Paulo Pinheiro aceitar demissão que foi imposta por ameaça. Vai ter de dizer sim. Só vou conversar depois de aclarada toda essa situação. Não tem mais clima. 




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