Política Titulo Entrevista
Fundação mira caráter
técnico, diz presidente

Marco Antonio Santos Silva quer reduzir o caráter
político, da FUABC, marca registrada do antecessor

Por Beto Silva
Raphael Rocha
23/03/2014 | 06:31
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Ricardo Trida/DGABC


Presidente da FUABC (Fundação do ABC) há 60 dias – vai até dezembro de 2015, Marco Antonio Santos Silva (PMDB) tem clara linha de trabalho em sua mente: deixar a instituição com aspecto técnico e reduzir ao máximo o caráter político, marca registrada de seu antecessor no cargo, Maurício Mindrisz (PT). Ex-reitor da USCS (Universidade Municipal de São Caetano) e indicado pela cidade para gerir a entidade de orçamento de R$ 1,3 bilhão, ele afirma que a profissionalização da fundação é vital para planos de expansão e melhor qualidade dos serviços prestados em seis das sete cidades do Grande ABC e em municípios como Bertioga e Praia Grande. “Esse momento tem de ser mais técnico, porque já passamos pelo político”, afirma o novo presidente, em entrevista exclusiva ao Diário. Ele diz que encontrou a FUABC em estágio interessante, mas com receita administrativa baixa. Do R$ 1,3 bilhão de orçamento bruto, apenas R$ 15 milhões ficam com a fundação para manutenção dos espaços e das estruturas física e administrativa. Marco Antonio garante ainda que haverá reavaliações dos quadros de funcionários e de contratos firmados por Mindrisz, como o com a KLL Consultoria e Avaliação Educacional, pertencente a Klinger Luiz de Oliveira Sousa (PT). Segundo o peemedebista, há relatório mensal de análise da atuação da KLL, que por contrato recebe R$ 25 mil por mês para coordenar projeto de transformar a FMABC (Faculdade de Medicina do ABC) em centro universitário. Outra indicação política herdada por ele da gestão Mindrisz, a nomeação de Adriana Helena de Almeida para chefiar a Central de Convênios também está sob avaliação.

DIÁRIO – Quais mudanças o sr. projeta fazer em seu mandato?
MARCO ANTONIO – Pegamos a fundação em estágio interessante, de crescimento, bem reconhecida pelos municípios onde atua. O que incomoda um pouco, e é onde pretendemos fazer pequena evolução, é nossa receita. Temos faturamento alto, de R$ 1,3 bilhão. Mas temos receita de mantenedora muito pequena. Está em torno de R$ 14 milhões, R$ 15 milhões. De maneira devagar, sem forçar para cima das mantidas, precisamos divagar esse assunto. Nós, em função de termos isenção da parte patronal do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), passamos o ano de 2013 com benefício de R$ 212 milhões (quantia essa que não precisa ser recolhida pela FUABC à Previdência, por ter caráter público, embora seja entidade privada). Numa folha de pagamento que tivemos, acabamos dando esse benefício. Mesmo com tudo isso, ficamos apenas com R$ 14 milhões (de receita). Essa relação está discrepante.

DIÁRIO – Para incrementar esse orçamento é necessário cobrar mais das mantidas? Essa discussão já foi feita?
MARCO ANTONIO – Tem de aumentar a taxa de rateio. Hoje a taxa (de repasse à FUABC) tem um valor fixo e uma quantia variável (dependendo do tamanho do serviço prestado pela FUABC na unidade atendida). A discussão já foi feita. Passamos esse cenário.

DIÁRIO – A arrecadação total, de R$ 1,3 bilhão, pode ser aumentada? A entidade está preparada para aumentar sua capacidade de serviços?
MARCO ANTONIO – Estamos preparando para isso. Para crescer, precisamos estruturar um pouco mais. Temos área bem estruturada, como softwares. Mas precisamos estruturar na área de recursos humanos. Temos perto de 16 mil funcionários distribuídos por todas as mantidas. Esse número é forte. Também temos de estruturar a parte de gestão de outros softwares de gestão hospitalar integrados e a auditoria. Aprovamos na curadoria mais cargos de auditoria, para que a mantenedora tenha mais presença nas mantidas. Começaremos a fazer seleção para esses funcionários.
DIÁRIO – O orçamento da FUABC é maior do que a maioria das prefeituras da região. Qual o tamanho da sua responsabilidade em gerir a fundação?
MARCO ANTONIO – É grande. Por isso tenho feito gestão de parceria junto às mantidas. Esses superintendentes que são nomeados pela fundação têm de estar mais presentes aqui. Por isso procuro mais auditoria, para ter controle de tudo. Se perder o controle, o negócio desanda.

DIÁRIO – As prefeituras hoje têm dificuldades em contratar médicos. O sr. tem esse problema na FUABC?
MARCO ANTONIO – Uma das facilidades está na contratação. Em função de ser fundação de direito privado, permite regime de contratação diferente de prefeitura, que é administração pública. (Numa gestão pública) Você faz concurso, fica vinculado, não pode mandar embora, tem salário preso. Fica muito preso. Na fundação você tem liberdade. Quando a fundação entra, tem mais liberdade e tem mais resultado.

DIÁRIO – A impressão que se tem é que, sem a FUABC, os municípios param na área da Saúde. Essa visão é correta?
MARCO ANTONIO – Hoje param. A gestão da fundação é para ter a facilidade disso. Alguns continuam com parte da gestão de funcionários públicos. O ideal seria que não tivesse isso. Quando você está falando de gestão privada, a gestão fica mais ágil, sem tanta dependência quanto na gestão pública. Se precisar de um médico, imagine a dificuldade em se contratar, com concurso público. Mas você tem de ter boa gestão, controles e indicadores. Vamos trabalhar em cima de indicadores. O Grande ABC terá indicadores, de índices de internação, número de exames. Estamos compilando. Está em fase de estudo. Quando fecharmos, teremos comparação com outros Estados, regiões. Se houver hospital com melhores indicadores, veremos o que estão fazendo. Os indicadores são importantes para melhorar a Saúde.

DIÁRIO – Qual a leitura o sr. faz dessa complicada relação entre médicos e gestão pública?
MARCO ANTONIO – É engessado. O salário baixo. Você tem demanda de mercado muito alta. A estabilidade também é atraso. Quando o profissional passa a ser estável, acha que é dono do lugar. A produtividade dele cai. A fundação não tem estabilidade. Se o médico não produzir o que achamos devido, demitimos. Essa é a grande vantagem da fundação. A gestão é bem mais rápida. Mas existe dificuldade em contratar médicos. Até na fundação. Algumas áreas da Medicina a dificuldade é maior. Pediatria, por exemplo. Os problemas da Saúde são número pequeno de faculdades e tempo longo de curso.

DIÁRIO – Há planos de expansão da oferta de serviços? Ingressar em Diadema, por exemplo?
MARCO ANTONIO – Pode pegar. Exemplo é São Bernardo, com o Hospital das Clínicas. Está até reformulando. Lá tínhamos três mantidas e agora há o complexo. Com regimento novo e forma mais consistente. Com Diadema estamos conversando. Não há foco e estamos conversando.

DIÁRIO – No passado, a FUABC administrava o Quarteirão da Saúde, mas o contrato foi rompido por falta de pagamento. Esse problema ainda existe com outras administrações?
MARCO ANTONIO – Existe falta de pagamento ainda. Você faz contrato de gestão lá e prefeituras não repassam tudo, faltam partes. E as mantidas começam a ficar devendo. É um problema. Por isso estamos instituindo auditoria mais presente. A dívida está em torno de R$ 120 milhões, mas tem dinheiro em caixa. Hoje o que falamos é que a Saúde no Grande ABC não sobrevive sem intervenção da fundação. A facilidade em gestão da fundação é muito grande. E temos de ampliar isso. Dar mais ferramenta para a mantida fazer bom trabalho.

DIÁRIO – É possível as gestões municipais adotarem salário regional de médicos?
MARCO ANTONIO – Estamos trabalhando nesse sentido. Existe hoje controle bom para que não haja disputa entre cidades. Estamos tentando com nossas mantidas ter regulação melhor. A fundação tem condição de regular esse assunto. Podemos fazer com que não ocorra essa briga. Dá para atrair até gente de fora, de Santos, de São Paulo. Tem de remunerar bem e cobrar (resultados) bem.

DIÁRIO – A FUABC hoje trabalha com salário padronizado?
MARCO ANTONIO – Trabalhamos. Devemos soltar em um mês plano de carreira global. Natural que não dá para fazer de uma vez, mas estamos fazendo para ter algo mais integrado, com mais facilidade de trabalhar. Os municípios que vierem coma gente terão de aderir a esse plano de carreira. Precisamos equalizar isso para crescer.

DIÁRIO – A administração passada ficou marcada por seu caráter político. Em seu discurso de posse, o sr. afirmou que deixaria a FUABC num ritmo mais técnico. Já tem conseguido colocar isso em prática?
MARCO ANTONIO – Continuo afirmando que minha gestão, em função deste crescimento, precisa estar marcada por área profissional. Somos instituídos por três municípios: Santo André, São Bernardo e São Caetano. Não quer dizer que você tenha de ter funcionários vinculados a mais municípios. A gestão da fundação tem de ser técnica, próxima da administração privada. Por isso é fundação de direito privado. Estamos completando 60 dias e não mexi em nada ainda. A fundação precisa prestar serviço. Não posso trocar todo corpo diretivo, haveria risco de parar. Se o presidente anterior (Maurício Mindrisz, PT) tinha esse aspecto mais político, de repente era importante naquele momento. Agora, o momento tem de ser mais técnico, porque já passamos pelo político. Cada processo foi importante para chegarmos a este aspecto que a fundação está. Agora, você precisa profissionalizar, ser mais técnico, as pessoas têm de ter gestão maior, pensar na fundação em instituição forte, bem gerida, com recursos para isso. Sei que tenho de trocar algumas pessoas em função destes 60 dias. Fiz análise. Algumas áreas têm de trocar; outras, fortalecer. Na auditoria vou fortalecer. É importante porque o número de mantidas cresceu.

DIÁRIO – Como ficará a Central de Convênios, um dos principais setores da fundação, hoje sob comando de Adriana Helena de Almeida, filha do ex-prefeito de São Bernardo Maurício Soares (PT)?
MARCO ANTONIO – É um caso que estamos avaliando. Realmente foi indicação política de São Bernardo, mas não há garantia nenhuma de permanência. Pedi que fizesse levantamento de seu setor. A partir daí decidiremos o que fazer.

DIÁRIO – Um dos contratos mais polêmicos firmados pela antiga gestão foi com a empresa KLL Consultoria e Avaliação Educacional Ltda, de Klinger Luiz de Oliveira Sousa (PT). Esse acordo será mantido ou revisto?
MARCO ANTONIO – Estamos acompanhando mês a mês. Há relatórios mensais sobre evolução do trabalho pelo qual foi contratado. Ele (Klinger) foi contratado para transformar a faculdade em centro universitário. Não sei se é contratação política, não fui eu quem fiz. Mas vou analisar esses contratos, mês a mês. Toda vez que assino a fatura tenho relatório. Neste momento fizemos regimento do centro universitário. Deu trabalho. Quando chegar próximo ao encerramento do contrato, precisaremos ouvir da Faculdade (de Medicina do ABC) se o trabalho está sendo benfeito, se temos de encerrar ou renovar. É importante ter esse conceito. Talvez daria um passo atrás (se cortar o contrato). Temos de analisar se aquilo traz ou não prejuízo. Se não tiver prejuízo e houver empresa nas mesmas condições, podemos trazer. Se houver prejuízo, devemos manter, desde que a empresa (KLL) mantenha suas obrigações. Contrato deles vence em maio, salvo engano. Quem vai me dizer isso é o Adilson (Casemiro Pires, gestor da Faculdade de Medicina). Valores é outra conversa. Posso negociar.

DIÁRIO – Qual previsão para seu time de confiança iniciar atuação na FUABC?
MARCO ANTONIO – Em abril deveremos estar com pessoas indicadas por nós. Estamos conversando internamente. Pode haver mudanças de lugares. De repente a pessoa que faz a gestão política é necessária em outro setor. O que preservo é integridade com a fundação. As pessoas que estão aqui precisam ser tecnicamente boas, vestir a camisa da fundação. Não há imposição de ninguém para colocar alguém goela abaixo.
 




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