Reitor da UFABC, Dácio Roberto Matheus fala do impacto da pandemia na universidade
Os impactos da pandemia do coronavírus, a permanente evolução das tecnologias e a inserção das comunidades nos dilemas globais impõem às instituições de ensino superior novos desafios. Na região, a UFABC (Universidade Federal do ABC) abre novos caminhos para a inovação por meio da integração com a sociedade, pela aproximação e diálogo com o poder público e atuação conjunta com o setor produtivo.
Na sexta-feira, o professor Dácio Roberto Matheus foi reconduzido ao cargo de reitor da instituição, com a professora Mônica Schröder como nova vice-reitora, para o mandato 2022 - 2026. O cenário do ensino nos últimos anos e perspectivas para o novo período foram abordados pelo reitor, que destacou a importância da volta das aulas presenciais.
Qual é a estrutura da UFABC e principais cursos oferecidos hoje?
Vamos completar, em setembro, 16 anos da criação da UFABC. Temos, aproximadamente, 15 mil alunos de graduação e perto de 2.000 alunos de pós-graduação. A universidade foi criada com um projeto pedagógico inovador no quadro do ensino superior brasileiro, com a criação dos bacharelados interdisciplinares, que são cursos nas grandes áreas do conhecimento. No nosso caso, áreas da ciência e tecnologia e das humanidades. Mais recentemente, tivemos a implantação das licenciaturas interdisciplinares, também como cursos de ingresso para formação de professores e educadores. Hoje temos um maior número de vagas nas engenharias, seguido dos bacharelados, das ciências naturais, das matemáticas e computação. E das humanidades e ciências sociais aplicadas. E nas licenciaturas também em ciências naturais e exatas e em ciências humanas.
Como é a relação da universidade e a comunidade regional?
Nossa missão é, desde sempre, a contribuição para o desenvolvimento local, regional e nacional, assim como a contribuição para o conhecimento global. Tivemos avanços importantes em nossa última gestão no relacionamento com o poder público local e também com o setor produtivo. Temos uma relação muito próxima e agora bastante consolidada com o Consórcio Intermunicipal do Grande ABC e com a Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC. Temos também nos diversos cursos de graduação, de pós-graduação desdobramentos nos projetos de extensão universitária com uma relação muito forte com organizações não governamentais e segmentos da sociedade civil.
Quais são as ações com o setor produtivo local?
A UFABC foi a proponente e incubou durante alguns anos ação que depois se transformou programa nacional em parceria com o CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) que são os doutorados acadêmicos industriais e o mestrado acadêmico de inovação. Essa é uma nova modalidade de ingresso dos dos estudantes na pós-graduação que requer que o projeto de pesquisa seja construído em parceria com o setor produtivo. Cada projeto é fruto de uma relação de cooperação da universidade com uma empresa. São anualmente mais de quarenta projetos, a grande maioria desenvolvida aqui na região. Recentemente, através da nossa Agência de Inovação e dos grupos de pesquisa da UFABC, nós criamos o primeiro núcleo Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial) uma parceria com o Ministério de Ciência e Tecnologia e as empresas para o desenvolvimento de projetos de inovação científica e tecnológica.
Como tem sido a experiência de atuação junto ao Consórcio Intermunicipal?
O Consórcio tem sido, através dos seus grupos de trabalho temáticos e multidisciplinares, um espaço interessante de interlocução e de abertura de diálogo, inclusive com as prefeituras. O Consórcio abre espaço para a discussão a respeito das questões regionais que envolvem todos os municípios e a partir daí temos tirado diversos termos de cooperação em diferentes temas relacionados ao desenvolvimento econômico e social, questões de planejamento urbano, emprego, renda e direitos humanos.
Como a UFABC atua para manter programa de formação dentro da lógica entre as demandas da sociedade e a permanente evolução tecnológica?
Essa é, na verdade, a razão de ser da UFABC. O nosso projeto pedagógico está calcado justamente nessa realidade. A formação do cidadão de hoje deve ter uma base sólida, científica e humanística, para que ele tenha condições de fazer o desenvolvimento tecnológico de seu tempo. Porque a tecnologia que nós estamos discutindo hoje não será a mesma daqui a cinco anos. Temos que humanizar as tecnologias e colocá-las a serviço da sociedade, não somente das corporações. E como se faz isso é justamente nessa relação com a sociedade, com o setor produtivo, permanentemente em conversa, em troca.
Em relação ao período de pandemia do coronavírus, como foi e como tem sido a atuação da UFABC?
Ainda na pandemia. Ela ainda não acabou. E esse é um problema. Nossa gestão começou em 2018. Logo em março de 2020 nós tivemos que decretar o distanciamento físico das pessoas, mas muito rapidamente nós nos reorganizamos, tanto academicamente, quanto administrativamente, nos valendo de tecnologias. O Sistema de Gestão Acadêmica foi crucial e nos deu todo o suporte para que a gente não paralisasse as nossas ações. Também tivemos o esforço de reorganização de todo corpo técnico e dirigente para poder manter a universidade funcionando naquilo que chamamos de ensino remoto emergencial. Infelizmente, o que era uma reorganização provisória para superar aquela primeira onda se transformou no que todos conhecemos e ainda estamos vivendo. Retomamos agora (com as atividades presenciais nos campi) e o grande desafio é a retomada ainda com a pandemia não totalmente sob controle e com novas incertezas. Essa gestão foi um grande desafio, mas fizemos uma coisa muito importante que é a universidade não ter parado um dia sequer. Continuamos formando nossos alunos.
É possível avaliar impactos das restrições ao ensino presencial dos últimos anos?
A gente ainda não consegue avaliar exatamente o quanto essas mudanças todas comprometem a qualidade do ensino. Com certeza comprometem, como comprometeram a vida de todos nós. Na educação, relação interpessoal é fundamental. Embora conectados, a gente acaba perdendo a qualidade das relações. Por isso sempre tivemos a preocupação com o retorno ao presencial, só que a responsabilidade com evidências colocadas foram maiores. Por mais de dois anos ficamos impossibilitados de ter este retorno sem colocar em risco a saúde das pessoas. Conseguimos desenvolver bem na maioria das disciplinas e auferir o rendimento dos alunos. Mas, sem dúvida, fica caracterizado agora, no retorno, que a qualidade das relações são muito diferenciadas na presencialidade. A educação não se dá só na relação professor-aluno. Ela se dá também na relação aluno-aluno, que ficou muito comprometida nesse período de ensino remoto, com as pessoas isoladas em suas casas, em seus pontos de internet. O conhecimento se faz na troca das relações.
O papel social da universidade ganha novo significado com a pandemia?
A percepção da sociedade sobre a universidade mudou. Fomos todos mergulhados no mesmo contexto de pandemia, mas as populações vulneráveis ficaram em condições muito mais desvantajosas. Nessa medida, a própria universidade voltou todas as suas capacidades para entender e ajudar nesse problema. Do ponto de vista científico, nós desenvolvemos mais de 80 projetos de pesquisa, na busca de medicamentos, busca de testes diagnósticos, adaptando o conhecimento já existente.
Quais os principais avanços dos últimos anos e ações previstas para o novo período de reitoria?
Nós tivemos grandes avanços no aprimoramento normativo, de várias regulações da universidade com a inovação, nessa relação com as empresas, com o setor público e a sociedade em geral. Regulamentamos, por exemplo, o Marco Legal da Inovação, que é uma lei de 2016, e temos avançado bastante nisso, o que permite estabelecer parcerias de forma mais célere. A implementação do mestrado acadêmico de inovação, em complementação e sequência ao doutorado acadêmico industrial, que já estava implantado. A criação das licenciaturas interdisciplinares, reforçando o papel e o compromisso da UFABC com a formação de educadores e com o ensino básico. As políticas de inclusão de grupos vulneráveis na graduação e na pós-graduação e uma busca permanente das políticas de permanência. Parte disso ainda são desafios para o futuro, assim como ampliar parcerias com outras instituições de ensino na execução e desenvolvimento de nosso projeto pedagógico interdisciplinar. Tivemos desenvolvimento importante nas relações internacionais, e aí cabe aprofundar essas nossas relações, ampliando grupos de pesquisa parceiros, para discutir problemas comuns com outras comunidades e sociedade para que a gente possa desenvolver pesquisa e extensão em conjunto.
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