Setecidades Titulo Um dia de Cada Vez – Por Dentro de um Hospital de Campanha
Um hospital e muitas histórias de batalhas pela vida

Último capítulo da série de reportagens sobre a estrutura montada no Dell’Antonia traz retratos da luta contra o vírus

Por Bia Moço
Do Diário do Grande ABC
08/02/2021 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


Nos últimos nove dias o Diário contou em suas páginas parte do que acontece dentro do hospital de campanha do Complexo Esportivo Pedro Dell’Antonia, em Santo André. Parte, porque a complexidade da estrutura montada para atender à demanda de pacientes com Covid exige muito mais espaço e é o que vai acontecer nas próximas semanas, quando o jornal vai continuar retratando as histórias vividas ali.

A ideia da série Um dia de Cada Vez – Por Dentro de um Hospital de Campanha foi documentar a história sendo escrita sob nossos olhos. Ali é um dos principais centros de combate ao novo coronavírus, inimigo invisível que já vitimou mais de 2,3 milhões de pessoas em todo o mundo, superou a marca de 230 mil óbitos no Brasil, destes, 4.201 nas sete cidades do Grande ABC.

Além dos números grandiosos que compõem o hospital de campanha, retratados no capítulo de estreia, a série de reportagens contou a rotina dos médicos, falou com pacientes como Michele Batista da Costa, 23 anos, que emocionou ao relatar que debochava da Covid, estava arrependida e lutava para viver, registrou a emoção da alta hospitalar, a importância da equipe multidisciplinar à disposição dos pacientes, mostrou a estrutura de alimentação do equipamento e a logística entre os centros médicos andreenses, além de documentar a importância da estrutura do hospital de campanha, que foi a primeira do tipo montada na região, em abril de 2020. Todo o material produzido pode ser acessado gratuitamente no site do jornal www.dgabc.com.br.

Durante a série o Diário apresentou para a sociedade alguns das dezenas de super-heróis que, em nome da profissão que cada um escolheu, saem todos os dias de casa, deixam a família e arriscam a própria vida para salvar a de um desconhecido. Como não seria possível retratar todos os 400 profissionais que atuam no hospital de campanha, escolhemos cinco personagens de reportagens publicadas durante a semana para representá-los na ilustração ao lado, produzida por Luiz Carlos Fernandes.

Da esquerda para a direita estão Milena Duarte (fisioterapeuta), Luciana Rezende (assistente social), Bruno Guimarães Maia (diretor e médico intensivista), Rita de Cássia Calegari (psicóloga) e Yago das Neves Jacinto (psicólogo).

Todos os profissionais do Diário envolvidos na produção da série contaram com amparo da equipe do hospital de campanha e estiveram protegidos do coronavírus por meio do uniforme hospitalar, o mesmo utilizado por médicos, enfermeiros e todos os outros trabalhadores que têm acesso ao covidário.


‘Vivenciei a luta pela vida e vi profissionais com sorriso no rosto’

Quando topei planejar, produzir e executar o projeto me questionei se estava, de vera, louca. Se de um lado a paixão jornalística pulsava, do outro, a doida do álcool gel e colecionadora de máscaras acreditava que passar dias dentro do covidário de hospital de retaguarda, em plena alta da pandemia, era muita maluquice. Para minha sorte, tive a companhia de dois malucos que toparam entrar nessa comigo, o fotógrafo Nario Barbosa e o cinegrafista Yuri Souza. Gênios.

Nada descreve o que é vivenciar um hospital de campanha. Tudo acontece ali. As pessoas não têm ideia da intensidade que existe naquele lugar.
Senti medo de me contaminar, angústia, tristeza e também muita gratidão pela oportunidade de poder mostrar o quão valiosa tem sido a estrutura. Mal dormi uma noite antes e, de manhã, ainda pensava se estaria fazendo o certo.

Ao chegar pela primeira vez no Dell’Antonia fiquei em pânico. Questionei os profissionais muitas vezes sobre protocolos de segurança, vestimenta, EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) e riscos. Me ambientei e, ao me vestir com o uniforme hospitalar senti meu coração disparar. Entrar na parte do covidário, a quadra que antes era palco de jogos, foi como parar no tempo. Um nó na garganta e muita emoção tomaram conta.

Ver os pacientes internados naquele ambiente tirou meu chão. De início, entrar nas alas de contaminados estava me dando até tontura e, de repente, o som contínuo de uma máquina cardíaca me paralisou. Um óbito. Foi como pisar nas nuvens. O som ficou longe e não consegui ver a pessoa. Não quis. Mas, ao mesmo tempo, ouvi a comemoração de uma alta que, ali, me deu forças para continuar, mostrar e registrar, para sempre, o trabalho incansável de um verdadeiro pelotão de super-pessoas.
Ressignificar é a palavra que fica em mim. Ali pude refletir e pensar no valor de coisas pequenas que deixamos passar. Vi mortes, entubações, pessoas passando mal, outras arrependidas e altas emocionantes. Vivenciei a luta pela vida. Pude ver profissionais trabalhando como se fosse acabar o mundo, mas sempre com sorriso e vivendo um dia de cada vez.

Agradeço ao Diário pela oportunidade e à chefia pela confiança. Aos leitores e os incentivos que recebi. Mas além destes, agradeço a Ângela (enfermeira, ouvidora e assessora do hospital) pela paciência, a cada um dos internados que me recebeu em seu leito e aos profissionais que estão encarando a guerra diária – vocês têm meus aplausos eternos.

‘Senti impotência por não poder fazer muita coisa pelos internados’

NARIO BARBOSA
nariobarbosa@dgabc.com.br

Senti uma mistura de sensações durante a produção de fotos para a série de reportagens. Se por um lado tive muito medo de estar em um local onde o novo coronavírus não é tão invisível assim – está por todos os lados – , por outro participar de uma cobertura histórica me enchia de motivação.

Andando pelas alas lotadas de pacientes em estado grave e com máscaras de oxigênio, lutando pela vida, senti bastante tristeza e uma certa impotência de não poder fazer muita coisa para ajudar. Mas senti também alegria de testemunhar alguns pacientes se recuperando da doença, saindo pela porta da frente e sendo recebidos com abraços pelos seus familiares.

O momento que mais me tocou foi presenciar um paciente tendo alta. Seus familiares o aguardavam do lado de fora com muita alegria. Foi emocionante ver o choro do filho, da mulher, da mãe e de todos que estavam ali.

Como fotojornalista, minha função no hospital de campanha era mostrar o cotidiano daquelas pessoas, que têm nome e sobrenome, têm uma uma história de vida. Não são apenas números em uma pandemia avassaladora.

Refleti bastante durante a série. Já estive muitas vezes no Dell’Antonia, mas para fotografar emocionantes partidas esportivas e parecia um pesadelo estar lá, pisando novamente na quadra, mas desta vez para fotografar pessoas lutando pela vida.

‘Foi um dos trabalhos mais emocionantes que participei’

YURI SOUZA
yurisouza@dgabc.com.br

Foram dias muito loucos que vivi na última semana. Quando recebi a proposta de fazer este documentário, confesso que fiquei com medo, mesmo já tendo me contaminado com a Covid-19. Acompanhar a rotina de um hospital de campanha foi um dos trabalhos mais emocionantes que tive a oportunidade de participar. É como se fosse uma montanha russa, pois você não sabe o que vai acontecer.

Em qualquer momento alguém recebe alta e é toda aquela alegria, mas, na mesma hora, uma pessoa vem a óbito e fica todo aquele clima ruim.

Trabalhar com a Bia Moço (repórter) e o Nario Barbosa (fotógrafo), foi uma imensa honra. Ela conseguiu alinhar todas suas ideias no roteiro, nas entrevistas e no jeito de conduzir as reportagens. Nario, talvez seja um dos melhores fotógrafos que já conheci, devido sua sensibilidade e olhar humano em todas as suas fotos e materiais. Eu fiquei com a função de tirar do papel e transformar tudo que víamos em um vídeo (leia mais ao lado).

Dirigir um documentário com essa temática me fez crescer como pessoa e aprender ainda mais a valorizar a vida e os pequenos momentos. Apesar de formarmos uma equipe enxuta, conseguimos entregar material profissional e de alta qualidade. Obrigado pela oportunidade.


Documentário sobre a série estreia hoje nas redes sociais

Todo material produzido pela equipe de reportagem do Diário dentro do hospital de campanha virou documentário, que estreia hoje, às 20h, em transmissão especial no Facebook do jornal (jornaldgabc). O vídeo na íntegra também pode ser conferido nas outras plataformas, como YouTube (dgabctv) e Instagram (@diariodograndeabc), além do site do jornal www.dgabc.com.br – basta apontar a câmera do celular para o QR Code abaixo para ter acesso ao conteúdo.

O documentário, dirigido e editado por Yuri Souza, com roteiro, produção e entrevistas de Bia Moço, fotografia e tratamento de Nario Barbosa, tem 26 minutos de duração e será disponibilizado gratuitamente em todas as plataformas. O material reúne depoimentos de personagens que fazem parte da equipe de 400 profissionais que atuam no hospital de campanha do Pedro Dell’Antonia, além de entrevistas com pacientes que estavam internados na luta contra a Covid.

Hoje, a partir das 15h, o documentário será exibido em primeira mão no Dell’Antonia, como espécie de homenagem aos profissionais que atuam lá.
 




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