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Vida de comandante
Por Cristiane Bomfim
Do Diário do Grande ABC
23/07/2007 | 07:00
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Voar pelos céus brasileiros exige conhecimento teórico e muita prática. A pressão lá em cima, dizem os pilotos, é tremenda. “Estamos sempre no limite”, confidencia o piloto aposentado Luiz Henrique de Bessa, 70 anos.

Ele ainda se lembra das aulas teóricas de piloto privado no Aeroclube de São Paulo, em 1955. Era o primeiro passo de uma carreira que durou 27 anos. “Na minha época não era fácil e hoje está mais difícil.”

Antes de ocupar o cargo de comandante – o posto mais alto dentro de uma aeronave – o profissional precisa de habilitações de piloto privado e comercial. “Ser piloto privado é a primeira etapa para qualquer interessado em aviação”, explica Klaus Schween, coordenador da escola de Aviação Wings, que fica ao lado do aeroporto de Congonhas, cenário do acidente com o avião da TAM.

São 270 horas de aula teórica e, no mínimo, 40 horas de vôo antes da prova. Entre as cinco disciplinas cursadas, estão regulamento de tráfego aéreo e conhecimentos técnicos de aviação.

CARREIRA

O conteúdo é complicado para um iniciante e a prova, elaborada pela ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), exige sete como nota mínima. No ar, o teste é ainda mais difícil. Vale de zero a cinco e só recebe a habilitação quem tirar quatro ou mais.

“Na prova prática, o piloto tem de mostrar conhecimento, técnica e habilidade. Enquanto está no comando da nave tem que responder perguntas difíceis e saber sair de situações adversas”, explica Schween.

Aos 18 anos, Luiz Henrique Bessa obteve a melhor classificação na turma de piloto privado. Ganhou a habilitação para conduzir aviões monomotores e o prêmio de 200 horas de vôo gratuitas, usadas por ele durante o curso de piloto comercial.

Hoje, o valor de uma hora de vôo em um avião monomotor não sai por menos de R$ 200.

SONHO

Nathália Cohen, 19 anos, conhece bem os termos técnicos da aviação civil. Por diversas vezes acompanhou de perto o trabalho do pai. “Eu sempre viajei na cabine enquanto meu pai pilotava, mas só agora decidi seguir a mesma profissão”, conta.

Para isso, ela assiste com dedicação às aulas teóricas de aviação. “Vou ser comandante. Meu pai já me disse que é muito difícil, mas me apóia.”

O curso de piloto comercial segue os mesmos moldes do de privado. “É claro que o número de disciplinas aumenta e fica tudo mais complicado”, afirma o coordenador da escola Wings.

As aeronaves, nesta categoria, são mais complexas e o vôo passa a ser com instrumentos, ou seja, não é preciso visibilidade para pilotar. O curso teórico tem 320 horas e, na prática, é preciso no mínimo 150 horas de vôo.

COMEÇO

Ano de 1958. Aos 21 anos, Luiz Henrique de Bessa ingressou na Vasp. Lá fez um treinamento de seis meses para poder pilotar o avião DC3, com capacidade para 28 pessoas.

A exigência mínima para a vaga era que o piloto tivesse 1,5 mil horas de vôo como piloto comercial. Essa é a mesma exigência da TAM hoje.

Dentro da companhia, o piloto faz cursos específicos para pilotar cada aeronave. Começa com uma mais simples e de menor porte e vai evoluindo, de acordo com a experiência.

“O DC3 era completamente diferente dos aviões que eu já tinha pilotado”. lembra Bessa. “Quando eu coloquei o fone de ouvido na orelha, eu pensei: acabou minha carreira, eu não entendo nada o que dizem”, relata, sobre como o sistema de comunicação era precário.

Com o tempo, se acostumou. O último vôo do comandante da Vasp foi a bordo de uma aeronave A-300, com capacidade para 252 pessoas.

PRESSÃO

“A gente lida com outras vidas. Tem que ficar ligado 100% do tempo, da decolagem ao pouso”. Na época, ele afirma que os pilotos tinham mais autonomia durante o vôo e que não eram pressionados. “A gente decidia a rota e se ia pousar ou não. Se eu achasse que estava chovendo muito e a pista poderia estar lisa eu não aterrizava e pronto.”

Além disso, ele salienta que os pilotos constantemente passam por reciclagens. “Temos que estudar sempre.” Hoje, a situação mudou e Bessa tem certeza que os pilotos sofrem muito mais.

“Há muitos interesses comerciais envolvidos e o dinheiro no Brasil sempre foi muito mal empregado”, resume, ao referir-se à falta de investimento em tecnologia e segurança dos aeroportos.



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