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História de quem vivenciou a rebelião no CDP de Mauá
Por Gabriel Batista
Do Diário do Grande ABC
26/03/2006 | 07:48
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Ao fim da rebelião de terça-feira no CDP (Centro de Detenção Provisória) de Mauá, os seis líderes da ação reuniram os 654 presos e cinco reféns no pátio de sol, no último andar da carceragem. Um dos cabeças, na faixa dos 23 anos, pediu a palavra. "Irmãos, o que a torre queria a gente conseguiu. Estão todos de parabéns. É assim mesmo que tem que ser", disse o detento. Em seguida, todos os presos bateram palmas e entoaram gritos de louvor à facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). Era o anúncio do término da rebelião que durou oito horas. O resultado: a prisão estava completamente destruída.

O Diário fez contato com uma pessoa que acompanhou o motim de terça-feira, e que pediu anonimato para não sofrer retaliações. As informações contidas nesta reportagem configuram o relato da testemunha.

A rebelião teve início por volta das 11h. Um carcereiro caminhava pelo terceiro andar do prédio. De repente, estalos de portões batendo ecoaram pelo pavilhão. O funcionário tentou trancar tudo rapidamente para sair dali. Mas, na última porta, deu de cara com um grupo de presos. "A cadeia está tomada. Já era", informou um detento.

Cinco agentes penitenciários ficaram reféns. Eles eram colocados sentados em uma cela depois em outra, arrastados pelo colarinho. Chegaram a vestir o uniforme dos presos, seriam posicionados na entrada em caso de invasão da Tropa de Choque da Polícia Militar. Um dos líderes ficou com um telefone celular ligado o dia todo, em comunicação com a torre - um ou mais chefes do PCC, presos em outra cidade. Começaram as ordens, que o líder no CDP repassava: "A torre mandou quebrar o batente, vamos quebrar logo o batente."

Não obedecer à torre significaria o assassinato dos seis cabeças do CDP de Mauá, meia dúzia de rapazes com idades entre 23 e 27 anos. Dentro da cadeia, uma pistola em posse dos líderes. Durante todo o motim, os presos fumaram maconha. Estavam com muita droga.

Na escada do CDP, que leva ao pátio de sol, os presos utilizaram extintores para quebrar a parede. Aos poucos, tijolos eram esfarelados pelas batidas - as paredes não são de concreto. Buracos foram abertos na fachada do prédio. A cada outra cadeia do Estado que "virava" (nova rebelião), os detentos comemoravam. Para responder às provocações de um grupo de policiais civis posicionados do outro lado da avenida Papa João XXIII, onde fica o CDP, um dos amotinados atirou com a pistola.

Em um determinado momento, disseram aos reféns que não estava havendo negociação. Se o Choque entrasse, iriam matar os funcionários seqüestrados. "Não temos nada a perder", justificavam os amotinados. Os reféns falaram cinco ou seis vezes com a direção da unidade, via rádio HT. Os agentes-reféns pediram o andamento das negociações e que o Choque não entrasse.

No fim da tarde, os rebelados tocaram fogo em roupas, lençóis e toalhas. Não incendiaram os colchões, antichamas. Uma "advogada do PCC", chamada de Aliança, estava presa em um dos bloqueios da polícia na avenida. O diretor do CDP foi informado e pediu a alguém para ir até o local liberar a advogada. Quando ela chegou, por volta das 16h, a negociação começou.

Não existia mais presídio, não havia uma porta de pé. Na carceragem, sobrou apenas uma grade alta no pátio de sol. Por dentro, a cadeia mais parecia o esqueleto de um prédio. Os presos entregaram a pistola desmontada à advogada, pelo buraco da parede. Depois, comemoraram.




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