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Quinze anos sem Tom Jobim
Por Dojival Filho
Do Diário do Grande ABC
06/12/2009 | 07:03
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Wilson Magão/DGABC


A ternura, o talento, a generosidade e a irreverência marcaram não apenas a produção musical, mas a intimidade do compositor, pianista e "maestro soberano" Tom Jobim (1927-1994). Na terça, completam-se 15 anos da morte do legendário autor, vítima de problemas coronarianos e complicações provocadas pela cirurgia de retirada de tumor na bexiga, após internação no Mount Sinai Medical Center, em Nova York.

Além de estandartes da MPB, como Wave e Águas de Março, ele colecionou histórias em um ambiente repleto de boêmios, intelectuais e musas de corpo dourado que rebolavam pela orla do Rio de Janeiro. Ex-aluno do professor de música alemão Hans Joachim Koellreutter, bebeu na fonte de Heitor Villa-Lobos, do jazz e dos eruditos Chopin e Debussy.

Um dos que se renderam ao seu carisma e simplicidade foi o violonista e produtor Roberto Menescal, autêntico representante da geração bossa nova que consagrou "o amor, o sorriso e a flor", no fim da década de 1950.

"A coisa mais viciante que tinha era o papo dele sobre todos os assuntos. Era um cara fascinante, charmoso e muito generoso com os músicos que vieram depois, como eu", relembra Menescal, autor de O Barquinho, Você, entre outros clássicos.

Mergulhador na juventude, o instrumentista compartilhou com o ídolo a paixão pelo mar. Aos risos, ele recorda um momento curioso, ocorrido na Barra da Tijuca, nos anos 1960, que sintetiza a maneira leve e bem-humorada como o amigo e mestre encarava a vida.

"Quando cheguei na praia, vi o Tom pescando sozinho. Um tempo depois, quando ele puxou a vara, percebi que não tinha colocado a isca. Perguntei o porquê e ele respondeu: ‘Menesca, você acha que eu venho aqui para pegar peixe, aquela coisa gosmenta? Eu quero é vir para cá e ficar só olhando esse mar."

PIANO NA VARANDA - No mesmo período, o compositor protagonizou outro episódio memorável na cobertura de Chico Buarque, na Lagoa Rodrigo de Freitas, um dos emblemáticos endereços cariocas. "Foi uma das melhores noites da minha vida", revela o cantor e violonista, Miltinho, integrante do MPB4, sobre a animada festa regada a uísque, versos e canções.

"Estávamos com nossas mulheres e, quando o Tom chegou, a gente tocava piano de armário em um quartinho nos fundos. Ele falou: ‘Pô, mas numa cobertura com uma vista dessas, vocês vão ficar tocando nesse quarto? Por que a gente não coloca o piano na varanda?"

Animado, o grupo carregou o instrumentos e, antes de atingir o objetivo, recebeu outro visitante ilustre, que, em parceria com Jobim, criou pepitas como Chega de Saudade, marco inaugural da bossa. "Quando chegamos na varanda, veio o Vinicius de Moraes. Ele olhava para nossas mulheres e dizia que eram gracinhas, daquele jeito dele. Cantamos a noite toda", conta Miltinho.

‘AMERICANIZADO' - Detentor de conhecimentos enciclopédicos sobre a fauna e flora nacionais, o maestro tinha ligação com o País até no nome: Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim. Mas, apesar disso, foi chamado de "americanizado", quando trabalhou e morou nos Estados Unidos e gravou com Frank Sinatra.

O artista ironizou as críticas. "Se um norte-americano passa vinte anos no Brasil e volta para lá, ninguém chama ele de brasileiro. Ao índio, não é permitido sair da taba", declarou em entrevista ao Pasquim. Ele deixou ainda para a posteridade a antológica frase: "Morar em Nova York é bom, mas é uma m.... Morar no Brasil é uma m..., mas é bom."

Em 1968, ao vencer o Festival da Canção com Sabiá, escrita com Chico Buarque, foi vaiado no Maracanãzinho. Por conta do clima de radicalização política motivado pela truculência da ditadura militar, uma parcela do público preferiu a segunda colocada, Pra Não Dizer que Não Falei de Flores, de Geraldo Vandré.

"O Tom era muito leve em relação a essas coisas, um ser totalmente iluminado. Não levava em conta as vaias. Achava aquilo tão pequeno", afirma a cantora Cynara, do Quarteto em Cy, que interpretou Sabiá na ocasião.

Miele prepara show-tributo

Ligado à bossa nova desde o início do movimento, quando dirigiu diversos artistas do gênero no programa Noite de Gala, exibido pela TV Rio, o showman Luís Carlos Miele planeja tributo a Tom Jobim em 2010. Ainda no primeiro semestre, ele pretende viajar pelas principais capitais do País com o espetáculo Um Brasileiro Chamado Jobim, em que se apresenta ao lado da cantora Lenny Andrade.

O repertório é baseado em composições menos conhecidas da extensa obra do artista. "Todo mundo que faz homenagens sente-se na obrigação de mostrar os standards. Nós faremos diferente e o show terá músicas como Olha pro Céu e Fotografia", conta Miele.

Entre uma canção e outra, o entertainer relembra passagens marcantes da trajetória do homenageado. Na abertura, recorda o fascínio de Jobim pelos pássaros, com a leitura do texto impresso no encarte do álbum Urubu (1975).

"O urubu é muito feio, mas do jeito que ele escrevia parecia muito bonito. Às vezes, o Tom chamava um amigo às 5h para ver os urubus levantarem voo no sopé do Corcovado", comenta.

No bis, Miele e Lenny entrarão vestindo chapéu Panamá, uma das marcas registradas de Jobim, assim como o charuto e o gosto pelo chope e o uísque. "No restaurante Plataforma, no Leblon, que ele frequentava com os atores José Lewgoy, Hugo Carvana e Antônio Pedro, o chope não era da marca que ele bebia. Então, compraram barris de outra marca e serviam só para o Tom, sem que ninguém soubesse." 




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