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Didi volta aos cinemas como caçador de tesouros
Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
06/01/2006 | 08:49
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Renato Aragão é dos poucos, pouquíssimos, cujos personagens cinematográficos são obrigados a vestir a carcaça e o nome do ator principal, comum no cinema norte-americano dos anos 20 e início dos 30. Ator, não. No caso de Didi Mocó Sonrisal Colesterol Novalgino Mufumbo – nome completo do pseudônimo adotado pelo showman cearense ainda nos tempos de Trapalhões –, é sua persona cinematográfica e televisiva que importa, única e imutável, resultante de sua transformação de líder de trupe em cavaleiro solitário do humor após a dissolução do quarteto que contava Zacarias, Mussum e Dedé. Uma metamorfose que também afeta o target do comediante, que assume sua busca por um público cada vez mais jovem, mais inocente. E tudo isso fica evidente em Didi – O Caçador de Tesouros, sétimo filme solo de Aragão e seu 45º se creditadas todas as aventuras cinematográficas, com ou sem Trapalhões.

No novo filme, dirigido por Marcus Figueiredo, fica igualmente evidente que a persona de Didi já não basta para o sucesso de uma produção cinematográfica; fica igualmente evidente que Didi Mocó representa um dos últimos espécimes de uma tradição circense que independe de preparação olímpica e de pirotecnias, estágio último do riso massageado pela ingenuidade.

A própria tentativa de complexidade dramatúrgica é um sinal da escassez do protagonista como chamariz único. Didi é o mordomo-babá-faxineiro da família Walker, formada por Samuel (Cecil Thiré) e pelo filho de 10 anos, Pedro (João Paulo Bienemann). Samuel vive intrigado com o rótulo de desertor atribuído a seu próprio pai, Lucas (Miguel Thiré), um ex-piloto das forças britânicas durante a Segunda Guerra e que morreu durante um desastre aéreo a caminho do Brasil, em 1945, acusado também de roubar parte do tesouro nacional da Inglaterra durante a fuga. Ao lado do garoto Pedro, Didi parte para o interior de São Paulo, rumo ao exato lugar onde teria caído a aeronave do suposto desertor e onde descobrem uma multidão de fantasmas que morreram 60 anos atrás.

Talvez não seja intencional, mas essa busca pelo herói que adormece na história acusado de vilanias que provavelmente não cometeu é a assimilação pelo roteiro de que o Brasil não cultua heroísmos nacionais, de que a mitologia do país não se inclina para o maniqueísmo de pistoleiros ou heróis uniformizados que têm como certa a validade de seus atos, do mesmo modo que a potência econômica pretende-se soberana em assuntos geopolíticos. Uma tradição estrangeira, a princípio escandinava e depois legitimada como expressão da cultura norte-americana. Por isso, também, Didi – O Caçador de Tesouros persegue um fato secundário na história brasileira, a Segunda Guerra.

O filme de Figueiredo ainda desperta algum interesse por relegar Didi a um plano secundário, como reconhecimento de que ali não há um personagem, mas uma marca, uma grife. Todos os conflitos centrais – destaque para o reencontro dos Walker, entre o filho de 60 anos e o pai-fantasma, na plenitude dos 20 – são independentes, quando não indiferentes a Didi. Talvez pela primeira vez na carreira solo de Aragão, um filme que reconhece o lugar de Didi no século XXI, triste mas legítimo, e não tenta resgatar o Didi dos anos 70 e 80.

DIDI – O CAÇADOR DE TESOUROS (Brasil, 2005). Dir.: Marcus Figueiredo. Com Renato Aragão, Francisco Cuoco, Grazielli Massafera, Eduardo Galvão, Cecil Thiré. Estréia hoje no ABC Plaza 2, Extra Anchieta 2, Mauá Plaza 5, Central Plaza 4 e circuito. Censura livre.



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