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Em cinco anos cresce gravidez na adolescência
Vanessa de Oliveira
19/12/2016 | 07:18
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Celso Luiz/DGABC


Enquanto o número de nascimentos no Grande ABC teve alta tímida de 2% em cinco anos – passou de 36.053 para 36.783 casos entre 2010 e 2015 –, o índice de adolescentes com menos de 15 anos que deram à luz teve alta de 9,7% no mesmo período (133 para 146). Já a gestação de jovens com idade entre 15 e 19 anos caiu 9,84% (4.501 para 4.058). Especialistas ouvidos pelo Diário atribuem os dados ao fato de os programas de prevenção do governo não atingirem essa parcela da população.

O levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostra, porém, que, quando comparados os últimos dez anos, houve queda em ambos perfis. No primeiro, o número de adolescentes com menos de 15 anos grávidas registrou baixa de 12,57%. Já entre jovens de 15 a 19 anos, a redução foi ainda maior 26,16%.

“Na pesquisa realizada pelo IBGE e pelo Fundo de População das Nações Unidas, somente o Brasil apresentou queda nestes indicadores, sustentada pela legislação e pelos programas relacionados à saúde sexual e reprodutiva. Mas a queda nos índices não minimiza a projeção de que a cada cinco mulheres, uma será mãe antes de terminar a adolescência”, fala a coordenadora do curso de Ciências Sociais da Universidade Metodista de São Paulo, Claudete Pagoto.

A especialista acredita que o cenário regional demonstra que “as políticas públicas que envolvem a saúde e a educação sexuais nessa faixa etária (menor de 15 anos) não foram eficientes para alterar de modo efetivo esse quadro, particularmente como saúde pública.”

A ginecologista e coordenadora do Programa Estadual de Saúde do Adolescente de São Paulo, Albertina Duarte Takiuti, salienta que a iniciação sexual tem ocorrido cada vez mais cedo, mas falta oportunidade de discussão. “A idade do início da vida sexual está diminuindo e o aumento da gravidez na adolescência, do HIV e sífilis entre os jovens, são indicadores de que isso está ocorrendo sem proteção. Diante desses problemas é preciso mobilização das forças da sociedade, no sentido de trabalharmos com essa questão. Temos de ter atividade concreta para que essa situação mude, pois é risco físico, social e psicológico.”

Para o psicólogo Roberto Debski, a incidência maior de gravidez nas garotas com menos de 15 anos pode ser atribuída à falta de maturidade. “As meninas mais velhas talvez têm convívio social um pouco melhor, presenciando experiências de outras pessoas nesse sentido e, aí, elas podem ter mais de consciência.”

MUDANÇA DE VIDA
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A maternidade era desejo para um futuro distante para Vitoria Devido de Lima, 17 anos, moradora de Santo André. No entanto, há 25 dias, ela se adapta às mudanças que a chegada de Pietra Alice trouxe à sua vida. “Tudo mudou. Se antes ficava acordada de madrugada na balada, agora passo a noite acordada por causa dela. A vaidade de comprar roupas para mim (não existe mais). Compro menos para poder dar a ela, tudo é pensando em cuidar dela”, conta.

A criança é fruto do relacionamento de dois anos com o namorado, Caio Reis de Oliveira, 21. “Tomava anticoncepcional, mas parei porque precisava trocar o medicamento. Quando ia iniciar o outro, engravidei. Passava pela cabeça o risco de ficar grávida, mas o susto foi grande”, lembra.

Como a gravidez foi de alto risco, ela teve de interromper o terceiro ano do Ensino Médio e o trabalho no programa Jovem Aprendiz. “Não tinha estrutura para a gestação, aí acabei tendo de ficar internada sete dias e passar no médico do pré-natal uma vez por semana.”

Antes da gestação, ela planejava concluir os estudos e iniciar a faculdade de Nutrição. “Agora meus planos são para a minha filha.”

CONSCIENTIZAÇÃO EM TODOS OS ÂMBITOS

Para evitar que cada vez mais adolescentes se tornem mães jovens, especialistas frisam a importância de ampliar a abordagem do tema. “É preciso que haja espaços públicos de acolhimento aos adolescentes, com atendimento multiprofissional, onde se discuta o cotidiano deles, para que se sintam seguros ao terem atividades sexuais. Nesses locais, vendo profissionais preocupados com eles, se transformam em multiplicadores da esperança, começam a sociabilizar suas emoções, passam a sonhar”, pontua a ginecologista coordenadora do Programa Estadual de Saúde do Adolescente de São Paulo, Albertina Duarte Takiuti.

A coordenadora do curso de Ciências Sociais da Universidade Metodista de São Paulo, Claudete Pagoto, ressalta a necessidade de ampliar o acesso aos bens e serviços de saúde e de educação sexual nas instituições de ensino para que tenham consciência de seus atos neste momento de descobertas e de transformação do seu corpo. “Uma gravidez nesse período pode acarretar série de problemas de saúde à menina, bem como psicológicos e de adaptação a nova fase da vida. Cabe, portanto, fomentar o diálogo franco e sincero entre adultos e adolescentes.”

O psicólogo Roberto Debski salienta o tratamento do assunto em casa. “Deve ser tratado com calma, realismo, mostrando exemplos de pessoas que tiveram de mudar os planos por conta da gravidez, para que os adolescentes possam refletir. A família tendo maturidade e equilíbrio para que eles cresçam com mais sabedoria e inteligência emocional, não é um antídoto para que a gravidez não aconteça, mas é uma tentativa de prevenção.”

A analista de recursos humanos Viviane Luzinete da Silva Máximo, 31 anos, de Mauá, foi mãe aos 17 anos. Hoje, ela dialoga com a filha, Júlia, 13, para que ela possa aproveitar a fase da melhor maneira possível. “A adolescência é um momento de descobertas, nessa época nos vemos em muitos conflitos internos e nem sempre temos um parceiro para a vida nesse momento. Se os pais não tem bom relacionamento, afeta a criança, geralmente com problemas emocionais. Este não foi o meu caso, mas na mesma época vi outras amigas da mesma idade que eu com muitos problemas de relacionamento”, relata. 

Nas conversas com a filha ela recorda as dificuldades que enfrentou por ter sido mãe tão jovem. “A responsabilidade foi a parte mais dura; ter de cuidar de um bebê se eu não sabia cuidar de mim mesma. Se locomover sozinha é muito fácil, mas quando se tem um filho, uma simples ida à padaria exige programação.”

MUNICÍPIOS DESTACAM AÇÕES PONTUAIS

Algumas cidades do Grande ABC têm trabalho especial voltado às mulheres que engravidaram durante a adolescência. Em Santo André, por exemplo, a Secretaria de Saúde informa que possui o programa de pré-natal para esse público, feito por equipe multiprofissional com médico, enfermeira, psicóloga, nutricionista e assistente social, oferecido em dois locais: no Centro de Saúde Escola, no Parque Capuava, e no Instituto de Hebiatria da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC). 

“No caso dessa faixa etária, especificamente, há um trabalho maior de conscientização sobre a importância do pré-natal, uma vez que a assiduidade dessas pacientes costuma ser menor, além de uma atenção e orientação maior sobre práticas saudáveis, pois é comum na adolescência o consumo de alimentos ricos em gordura e açúcar e, assim, o risco de desenvolver doença hipertensiva específica da gravidez é grande”, explica a administração andreense. 

Sobre as ações de conscientização, as UBSs (Unidades de Saúde) possuem grupos de planejamento familiar que oferecem orientação sobre métodos contraceptivos e fazem a distribuição de preservativos.

Na cidade de São Bernardo, o Ambulatório de Gravidez Precoce do Caism (Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher) realiza o acompanhamento de adolescentes grávidas com idades entre 12 e 16 anos, encaminhadas ao serviço pelas UBSs e pelo Pronto Atendimento Ginecológico/Obstétrico do HMU (Hospital Municipal Universitário). “Além da atenção especializada, o Caism também tem enfoque na prevenção. Evitar que essas meninas engravidem novamente durante a adolescência – situação, infelizmente, ainda corriqueira – é uma das metas do ambulatório”, ressalta a Prefeitura. Depois do parto, a jovem passa a ser acompanhada pela equipe do Programa Saúde da Família, que orientam e ofertam métodos contraceptivos. 

Em Diadema, as UBSs desenvolvem grupos com adolescentes sobre saúde sexual e reprodutiva, não só nas unidades, mas também em escolas e ONGs (Organizações Não Governamentais). em seu território de abrangência (nas unidades, escolas, ONGs). 

São Caetano, na Usca (Unidade de Saúde da Criança e do Adolescente), no Centro, oferece orientação e ginecologista infanto-puberal, além do acompanhamento humanizado da parte clínica. 

<EM>Procuradas pelo Diário, as prefeituras de Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra não informaram se possuem trabalho nesta área.




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