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Show em que jovem morreu era censurado para menores
Artur Rodrigues
Fabio Leite
e Verônica Fraidenraich
Do Diário do Grande ABC
28/09/2005 | 08:13
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Faixas, site e convite alertando para a proibição da entrada de menores de 18 anos na Metôfolia, maratona de oito horas de shows, não impediram a presença de adolescentes entre as 8 mil pessoas que lotaram o Estância Alto da Serra, em São Bernardo, no último sábado. O evento foi marcado por pancadaria, muito álcool e a morte do estudante Rafael Rogério Dourado, 16 anos, por traumatismo craniano, na Estrada Velha, a cerca de 150 metros da entrada da casa de shows, localizada na estrada Névio Carlone. O Ministério Público informou nesta terça que vai investigar o caso.

O grupo de diretórios acadêmicos da Universidade Metodista, organizações encarregadas da divulgação e venda de convites, confirmou a censura para menores, assim como estava destacado na página da festa na internet e no ingresso. Segunda, o Estância havia informado que a censura era de 14 anos, mas nesta terça voltou atrás e afirmou que a entrada só era permitida para maiores de 18 anos. Segundo o Estância, a instrução para a segurança era pedir documento na entrada.

Amigos do estudante morto e outros participantes da festa garantem que não só a entrada era liberada para menores como também as bebidas alcoólicas. Segundo relataram dois acompanhantes de Rafael, ele havia bebido quatro cervejas e sofreu uma queda na estrada quando o grupo procurava uma van para voltar para casa.

A Promotoria da Vara da Infância e da Juventude vai apurar se o Estância tem alvará que autorize entrada de menores, a suspeita de venda de bebidas para adolescentes e a morte de Rafael. A presença de menores em uma festa open bar (com bebida gratuita das 12h às 14h na pista e durante toda a festa nos camarotes) também será alvo do procedimento. Apesar de não querer se pronunciar especificamente sobre o caso, o juiz da Vara da Infância e da Juventude Luiz Carlos Ditommaso lembra que a proibição da venda de álcool a menores está prevista no artigo 63 da Lei de Contravenções Penais, sob pena de multa e até fechamento da casa, em caso de reincidências. O juiz explica que estabelecimentos que infrinjam a lei, causando a morte de menores de idade, podem responder por homicídio culposo.

A Polícia Militar afirma que o Estância pediu com atraso e inadequadamente a presença da corporação dentro da casa. O estabelecimento argumentou segunda que pediu reforço policial e que foram enviados apenas 12 homens da PM ao local. O requerimento da casa, no entanto, foi protocolado dia 13 de setembro, 11 dias antes do evento. O prazo mínimo é de 20 dias, segundo a PM. De acordo com o major José de Quesada Farina, do comando do CPA/M-6 (Comando de Policiamento Metropolitano por Área 6), um ofício foi expedido avisando que a PM não faria policiamento dentro da casa. "Na estrada e nos arredores do Estância, o policiamento ocorreu normalmente."

Sobre o fornecimento de bebida a menores, o Estância afirma que proíbe a prática e argumenta que os jovens bebem nas barracas de camelôs ao longo da estrada. O conselheiro tutelar de São Bernardo Sérgio Linhares Hora cobra a atuação das autoridades para coibir a venda de álcool por camelôs. Ele lembra que não é a primeira morte de freqüentadores do Estância que ocorre este ano. Em abril, Leonardo da Silva Martins, 19 anos, morreu de infarto fulminante. Como na morte de Rafael, os amigos de Leonardo denunciaram demora no socorro. O Estância alega que enviou prontamente uma ambulância UTI e que Rafael, alcoolizado, se asfixiou com o próprio vômito antes da chegada do resgate.

Segurança – O Estância informou nesta segunda que contratou 260 seguranças para o evento. Mas não é o que informam as empresas que forneceram o serviço. No total, havia 100 profissionais trabalhando, sendo 80 da Fonseca Segurança e 20 da Santo Segurança. O número era insuficiente para as cerca de 8 mil pessoas presentes à festa, segundo afirmam as contratados e o sindicato da categoria. Normalmente são estimados dois seguranças – um homem e uma mulher – para cada cem pessoas, segundo explica Miriam Bazote, delegada regional das Empresas de Segurança do Estado de São Paulo. Para 8 mil pessoas que a casa afirma ter recebido, seriam então necessários 160 seguranças.

Luís Carlos Januário, advogado da Fonseca, é mais rigoroso e afirma que, pelo público da casa, seriam necessários 350 profissionais. "Os organizadores falaram em 3,5 mil pessoas, mas tinha perto de 10 mil". Januário diz só ter ficado sabendo da morte de Rafael Dourado no evento por meio do Diário, mas confirmou a briga na pista, área de responsabilidade da empresa. "Na arena não tinha segurança pois não havia de onde tirá-los. Se saíssem da revista ou entrada, haveria invasão. Não tinha condições de um ou dois seguranças agir na briga". O advogado disse que os seguranças encaminharam o garoto que apanhou para o posto médico do evento e que as pessoas que o agrediram se dispersaram na multidão. Ele relata que a orientação é para coibir sempre o consumo de entorpecentes e bebidas por menores. "Mas como fazer alguma coisa se era open bar?", comenta Januário.

Não há um padrão de comportamento para os seguranças particulares em eventos, explica Miriam Bazote, delegada regional das Empresas de Segurança do Estado de São Paulo. Ela diz que é complicado trabalhar com adolescentes, porque são difíceis de controlar e exigem maior segurança. Os responsáveis pela organização do evento (contratação de shows e distribuição de convites nos postos de venda) foram as empresas CP7 Eventos e B2 Eventos. Ambas não quiseram se pronunciar.

O Estância Alto da Serra não respondeu às insistentes tentativas da reportagem de entrevistar um dos proprietários da casa. O Diário também enviou por escrito diversos questionamentos a respeito do episódio e das críticas das empresas de segurança. Somente às 21h23 a redação recebeu nota pelo e-mail de Eloi Carlone, sócio do Estância, que nada acrescenta ao que já foi divulgado. "Ainda é prematura qualquer afirmação a respeito do acontecido, enquanto so fatos não forem devidamente apurados pela polícia judiciária; e a Estância Alto da Serra está à disposição das autoridades competentes para colaborar no completo esclarecimento dos fatos", conclui a nota.




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