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Nos últimos atos, elogio a petista

Tortorello chamava integrantes do PT de ratos, mas convidou adversário para o grupo governista

Por Beto Silva
14/12/2014 | 07:05
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Diante de um hiato de dez anos sem Luiz Tortorello, é difícil encontrar histórias que não são de conhecimento público. Mas como estamos falando de uma pessoa diferenciada, sempre há algo surpreendente que pode ser achado. Na esteira da história política de um homem que via o PT com ojeriza, mais uma vez o destino se mostrou fascinante. Um dos últimos despachos do prefeito, acamado no hospital, num de seus últimos dias de vida, ele teceu elogios a um petista.

Foi justamente um integrante do PT uma das últimas pessoas a serem exaltadas pelo petebista. Justamente um militante do PT, cujos filiados chamava de ratos e gafanhotos em seus lendários discursos. “Por onde eles passam, devastam tudo”, dizia Tortorello, raivoso.

Na verdade, o enaltecimento foi a uma petista: a então vereadora Vera Severiano. Sabendo da gravidade da doença que acometeu o chefe do Executivo, a parlamentar escreveu uma carta para ser entregue a Tortorello. Nela, fez críticas administrativas, mas apontou fatores positivos do ser humano. O também vereador Jorge Salgado (àquela época no PTB, hoje no Pros) foi o emissário do documento. O conteúdo foi lido ao prefeito. “Ele escutou e tirou alguns aparelhos que estavam conectados a ele para poder responder”, recorda o aliado. “Tortorello elogiou Vera Severiano”, frisa.
A petista reagiu de maneira espontânea quando indagada pela reportagem acerca do episódio. “Putz...”, soltou no meio da pergunta. No entanto, não hesitou em confirmar. “Falei (na carta) do administrador especial. Tínhamos diferenças e divergências, mas ele era especial. Apesar de ser um coronel urbano, fez bem para a cidade.”

“Eu tinha sérias críticas ao modo de gerenciar dele. Mas temos de reconhecer que vestia a camisa da cidade, era preocupado e atento às necessidades da sociedade. Era popular, ticava viola, tomava cachaça, as pessoas se identificavam com o jeito simples dele. Tinha retórica apurada. Dá para sentir falta do carisma, mas não dos métodos.”

Vera conta o conteúdo do despacho de Tortorello. “Disse que eu era dedicada, compromissada, levava a política a sério”, discorreu a petista, para em seguida fazer outra revelação. “Foram quase as mesmas palavras que ele me dirigiu um tempo antes, quando me chamou para fazer política ao lado dele, em seu grupo.”

E não era qualquer filiado. Era uma pessoa que havia disputado com ele a Prefeitura, em 1996, quando foi eleito para seu segundo mandato. Tortorello obteve 58,77% dos votos, Claudio Demambro (PSDB) 29,34% e Vera, 10,58%. Na oportunidade, o prefeito eleito declarou que venceu não só do candidato tucano no município, mas também do governador Mário Covas (PSDB) que apoiou o adversário.

Tem o lado negativo das suas administrações, afirma opositor

O advogado Horário Neto, que era do PT e desde 2005 está no Psol, disputou o Paço são-caetanense com Luiz Tortorello em 1988, quando o petebista se elegeria prefeito pela primeira vez. Foram 38,03% dos votos para o então deputado estadual, que largaria A Assembleia Legislativa para assumir o Executivo municipal, e 18,98% para o petista.

A partir de então, Horácio foi um dos maiores opositores às gestões Tortorello. “Tenho de separar a pessoa do lado lado político. Essa data de dez anos exige respeito. Mas é preciso lembrar que tem o lado negativo das suas administrações”, aponta o hoje socialista.

“A minha visão do político sempre foi crítica. Adotou uma linha de privatização dos serviços públicos. Cresceu o poder das empresas sobre o Orçamento. Também tirou o piso salarial dos servidores. Fizemos muitas denúncias, uma das principais sobre irregularidades na contratação da Transbraçal (a Justiça não avançou na apuração e nunca fora comprovada qualquer ilegalidade)”, ressalta o ex-vereador, ao citar ainda o Caso Cressoni, de supostos desvios de verba e direcionamento de licitações. A investigação ainda está curso na Justiça.

Se estivesse vivo, parceria seria mantida, diz Auricchio

Escolhido por Luiz Tortorello para ser seu sucessor, José Auricchio Júnior (PTB) rompeu com os familiares do prefeito logos nos primeiros meses de gestão, por conta de divergências na condução do Palácio da Cerâmica. Dez anos depois, revela que se o líder daquele grupo político estivesse vivo, a parceria estaria mantida até os dias de hoje. “Havia sintonia. Estaríamos juntos”, afirma o ex-prefeito e hoje secretário estadual de Esporte.

Foram dez anos de convivência direta com Tortorello, principalmente quando Auricchio esteve à frente da Secretaria de Saúde por duas administrações (1997 a 2004). Antes disso, já era amigo dos filhos do petebista. “Foi ícone de São Catano, do Grande ABC e do Estado. Quando se perde figura icônica, produz vácuo traumático. Vivenciamos, isso. Mas a família e a classe política souberam preservar o nome dele. Ficará guardado na história da cidade. E o legado tem de ser mantido nas sucessões políticas”, acrescenta o secretário. “Era extremamente humilde. Com todo conhecimento que tinha, estava disposto a escutar. Sabia ouvir para aprender coisas novas.”

Auricchio classifica como “frustrante” não ter recebido a transmissão de posse das mãos de Tortorello. E faz uma confissão: “Tenho arrependimento de não ter feito livro de memórias da campanha, sobretudo do período que ficou doente. Em 90 dias tivemos grandes conversas.” 




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