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O Brasil é um País sem memória, diz escritor

Ricardo Soares, de São Bernardo, homenageia sua geração e entrelaça trajetória de personagens com a história da Nação

Por Miriam Gimenes
Do Diário do Grande ABC
05/09/2020 | 00:01
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Arquivo pessoal


Houve um tempo em que amigos se reuniam para escrever e declamar poesias marginais. De tão distante da nossa realidade – até pelo que estamos vivendo nesta pandemia –, parece coisa de outro século. E é. Mais precisamente do fim da década de 1970, quando cinco jovens formavam o grupo Poetasia, um dos inúmeros que ‘povoaram’ São Paulo àquela época.

Mas pouco se registrou sobre esses poetas, que chegaram a publicar duas antologias. Nada melhor, portanto, do que um dos integrantes, o jornalista e escritor Ricardo Soares, de São Bernardo, para puxar da memória a atuação do grupo e traduzí-la em palavras. Para tanto, acaba de lançar Devo a Eles um Romance (Editora Penalux, R$ 50), uma assemblage literária, em suas palavras.

“Peguei a história deste grupo para pano de fundo e linquei com o acontecia no Brasil na época: Diretas Já, o movimento de redemocratização, tudo contado como uma colagem. Tomei emprestado o termo do poeta Manoel de Barros, ‘memórias inventadas’, e criei este livro, que é um pouco da história da minha geração”, explica o autor, que já trabalhou na década de 1980 na redação do Diário, como repórter especial.

Por misturar realidade e ficção, o autor tratou de mudar o nome dos integrantes do grupo, que chegou a ter manifesto e tinha como mote a ideia que ‘a arte estava com indigestão’ – eram os anos de chumbo no Brasil. “Muitas coisas foram pura invenção e outras, de fato, aconteceram. Avisei aos amigos os quais o livro foi dedicado para que não se melindrem. Dá para dizer, no entanto, que é um livro de memórias, algo que eu devia a essa geração, e a estes meus amigos. Em minha modesta opinião, há muita coisa que se fala do período militar antes desta época, mas de meados de 1970 para frente tem pouca coisa, inclusive na ficção. Então, o livro compreende a este período.”

Alfa, Cosme, Estrela, Profeta, juntos ao narrador da história, contam suas trajetórias ‘entrelaçadas’ com lugares como o Deserto do Atacama, e fatos como a eleição de Tancredo Neves, as Diretas, as greves no Grande ABC, a guerrilha colombiana e a tragédia de Vila Socó, em Cubatão.

É uma forma, reforça o jornalista, de lembrar este País, que sofre de amnésia, de fatos importantes e um tanto cruéis. “O Brasil é um País com falta de memória. É inadmissível que quem tenha vivido aquele período peça a volta da ditadura. Os mais novos até seria mais entendível, podem ser mal-informados, não sabem o que aconteceu porque não viveram. Mas quem tem mais de 40 anos falar uma idiotice dessa é um problema total. É um momento realmente de trevas este que estamos vivendo”, analisa.

O que aconteceu por aqui, ressalta, foi uma das ditaduras mais sangrentas da história mundial, e pedir a sua volta “não é só ignorância, é má fé”. Leitura mais do que importante, portanto, que pode ser adquirida em www.editorapenalux.com.br.

Além deste livro, Soares tem outros oito publicados, entre eles Cinevertigem (Record, 2005) e Amor de Mãe (Patuá, 2017), além de livros infanto-juvenis, como O Brasil é Feito por Nós? (1984). Também foi um dos criadores e o primeiro apresentador do programa Metrópolis, da TV Cultura (no ar até hoje) e, entre 1998 e 2005, escreveu, dirigiu e apresentou os programas Literatura e Mundo da Literatura, exibidos em emissoras educativas do País. 




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