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Volks paralisa produção por um mês em São Bernardo

Crise na Argentina e adequação na linha de fabricação deixam 4.500 operários em casa

Yara Ferraz
Do Diário do Grande ABC
07/05/2019 | 07:00
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Denis Maciel


A Volkswagen vai paralisar sua produção na fábrica Anchieta, em São Bernardo, por um mês. Os motivos que levam a montadora a deixar os 4.500 trabalhadores que atuam na produção em casa são o volume menor de exportações para a Argentina, que passa por crise econômica – e é um dos principais parceiros comerciais da fabricante – e a adequação à linha de produção para receber novo modelo, que deverá ser o Taigun. De acordo com a empresa, serão concedidas férias coletivas de 24 de junho a 13 de julho, ou seja, por três semanas, porém, segundo o SMABC (Sindicato dos Metalúrgicos do ABC), os colaboradores vão permanecer em casa por uma semana mais.

Segundo a Volks, o volume total de produção no Brasil em 2019 deverá ser cerca de 20% maior do que o registrado em 2018. “Conforme planejado em seu calendário de produção para o ano, já tendo previsto o volume menor de exportações para a Argentina, a fábrica Anchieta entrará em férias coletivas de 24 de junho a 13 de julho. Nesse período, a unidade realizará alterações técnicas significativas em suas linhas de montagem para a chegada de mais um produto inédito da Volkswagen no futuro”, informou a montadora.

Apesar da nota da fabricante, o diretor do sindicato e coordenador geral do CSE (Comitê Sindical de Empresa) da Volkswagen de São Bernardo, Wagner Lima, informa que na semana anterior às férias coletivas, iniciadas em 17 de junho, será realizado shutdown, mecanismo de flexibilidade pela empresa previsto no acordo coletivo para deixar operários em casa. “Quando há problemas na queda de produção, como este, por conta da crise, a empresa pode solicitar o shutdown. São 12 dias no ano, sendo que nós já tiramos uma vez em 2019. Esses dias são descontados do banco de horas coletivo e, depois, quando a empresa convoca o trabalhador, ele ‘paga’ este período”, afirmou.

Conforme o diretor, a crise na Argentina preocupa a entidade e os trabalhadores. Apesar de o acordo coletivo garantir a estabilidade dos profissionais até 2021, a situação pode abrir precedente para que a unidade fabril, que atualmente trabalha na sua capacidade máxima de produção (1.090 carros por dia), com três turnos, faça redução na produção ou nos dias trabalhados.

“O trabalhador já está com as férias comprometidas até 2020, ou seja, se necessário vamos ter que usar outros mecanismos. Com essa questão na Argentina e a economia interna não reagindo o tanto quanto era esperado, para nós é importante que este carro novo, que está previsto para a nossa unidade, saia o mais rápido possível. Queremos manter a produção na capacidade máxima”, destacou Lima.

NOVO MODELO - Fontes do setor indicam que o novo automóvel, que tem previsão de ser lançado no mercado em 2019 e será fabricado na unidade Anchieta, será um CUV, que utiliza a base de um carro de passeio, mas com adaptações que possibilitam características de um SUV. Hoje, a unidade é responsável pela produção do novo Polo, Virtus e Saveiro.

No fim de março, a Volks concedeu 12 dias de férias coletivas aos 4.500 trabalhadores da linha de produção para realizar adaptações a fim de receber o novo carro – ao todo, a planta emprega 9.100 funcionários. A expectativa era a de que pequena parcela da empresa, entre 50 e 100 pessoas, também tirasse férias ainda neste ano para que a adaptação terminasse de ser feita. Porém, segundo Lima, por conta da crise no país vizinho, todo o contingente da produção acabou ficando em casa novamente.

Por conta da situação econômica na Argentina, a Volkswagen já tinha concedido férias coletivas aos trabalhadores duas vezes no ano passado. Em agosto, 1.000 colaboradores foram atingidos pela medida por 30 dias. Já em outubro foi a vez de outros 1.800 funcionários.


Cenário atinge em cheio autopeças da região

De acordo com os dirigentes das regionais do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) no Grande ABC, a crise na Argentina e as consequências geradas no setor automotivo têm causado impacto nas fabricantes de autopeças da região. A parada da Volkswagen pode causar efeito ainda maior nas fornecedoras das montadoras e atingir cerca de 540 delas só em São Bernardo.

De acordo com o diretor do Ciesp do município, Cláudio Barberini Junior, a cidade tem aproximadamente 1.800 autopeças, sendo que 30% fornecem para o ramo automobilístico. “A empresa que estava se programando para fornecer para a Volks tem que parar a produção dela, o que é difícil para uma empresa média e pequena, diferentemente da montadora, que tem ferramentas para isso. Esse efeito em cascata preocupa. Mas, por conta da situação na Argentina, já temos sentido aumento de ociosidade em outros setores que também são impactados”, destacou.

“Esse impacto se multiplica nos fornecedores que são pequenos e ainda estão em situação de crise. Se depender da Argentina, que está em ano eleitoral, e ainda vive turbulência, vamos ter um ano difícil. No Brasil, enquanto não for engatilhada a reforma da Previdência, também não vamos ter grandes avanços na economia”, analisou o diretor do Ciesp de Santo André (que abrange Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra), Norberto Perrella.

Para o diretor do Ciesp Diadema, Anuar Dequech Júnior, a situação que já causou demissões e redução de produção nas empresas da cidade – são 2.000 indústrias, sendo que 40% (800) são fornecedores diretos de montadoras –, também tende a se agravar. “Infelizmente, o que a gente tem visto é o pessoal se preparando para a continuação da crise. Até tivemos uma época mais otimista, mas não se concretizou qualquer interferência na Argentina.”

O Diário questionou outras montadoras sobre os efeitos da crise argentina na produção da região. A Mercedes-Benz afirmou que, assim como as outras fabricantes de veículos, tem sentido forte impacto da crise econômica na Argentina. As exportações de caminhões e ônibus para o país vizinho tiveram queda de 92%, de 2.700 unidades enviadas no primeiro quadrimestre do ano passado para 226 de janeiro a abril deste ano. “Contudo, apesar das dificuldades com o seu maior parceiro comercial, a Mercedes-Benz tem buscado equilibrar sua produção de veículos comerciais com a conquista de negócios em outros países e também no mercado interno. Entre outros mercados que temos exportado, podemos destacar Peru e Chile. Para o Chile, por exemplo, exportamos 500 ônibus recentemente”, informou, em nota.

A Ford afirmou que continua trabalhando “intensamente para mitigar o impacto da crise da Argentina. O crescimento das vendas no mercado doméstico tem sido importante neste momento.”

A GM não comentou o assunto, mas o Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano afirmou que não há nenhuma paralisação prevista na linha. A Scania e a Toyota não se posicionaram.
 




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