Cultura & Lazer Titulo
Adoniran Barbosa, 100 anos
Por Sara Saar
Do Diário do Grande ABC
01/08/2010 | 07:02
Compartilhar notícia


O vocabulário simples evoca o modo de falar do povo, peculiaridade esta observada na fonte: as ruas de São Paulo. Entre o cômico e o trágico, músicas de forte crítica social carregam as transformações da cidade a partir dos anos 1950. Nascido em Valinhos, interior do Estado, Adoniran Barbosa (1910-1982) foi paulistano por opção.

As homenagens ao centenário do sambista começaram com meses de antecedência. E não à toa, afinal Adoniran - pseudônimo de João Rubinato que costumava usar chapéu, terno e gravata borboleta - é reconhecido como um dos mais singulares compositores da música brasileira.

Seria sexta-feira, dia 6, o seu aniversário de 100 anos se talvez não tivesse bebido e fumado tanto - vícios que o levaram a um enfisema pulmonar.

Autor de clássicos como Trem das Onze e Saudosa Maloca, Adoniran levou o título de cronista. "Ele deu um colorido à vida cotidiana social de São Paulo. Conseguiu o feito de narrar situações trágicas de maneira bem-humorada", declara o produtor musical Thiago Marques Luiz, idealizador do disco comemorativo Adoniran Barbosa 100 Anos (Lua Music, 24 faixas, R$ 26,50).

Consequência: o compositor é lembrado pela alegria. Os sambas geralmente são batucadas em tom descontraído, mas cedo ou tarde todos chegam a refletir sobre as histórias. Este é o caso de Despejo na Favela que disfarça a tristeza da letra por meio do ritmo exuberante.

"Você pode escutar a música dez vezes. Uma hora, você para e presta atenção no que ela diz", analisa o jornalista Celso de Campos Junior, que fez o relançamento neste ano do título Adoniran: Uma Biografia (Globo, 680 págs., R$ 59,90) em edição revista e ampliada.

A cidade eternizada pelo sambista, obviamente, não é a metrópole do século 21, mas o repertório ainda soa atual. Exemplo é a canção Aguenta a Mão, João, que ilustra o sofrimento causado pela enchente de forma que só aparenta ser despretensiosa: Não reclama/ Contra o temporal/ Que derrubou teu barracão.

PRECONCEITO - Segundo Campos Junior, Adoniran sofreu muito preconceito. Em 1974, algumas canções que entrariam no primeiro LP foram censuradas sob a recomendação do autor voltar para o Mobral (antigo movimento de alfabetização).

A dificuldade estava em compreender a estética que somente ilustrava o que era falado nas ruas de São Paulo. "É um absurdo. Ele não escrevia errado ou era analfabeto", indigna-se Campos Junior. E completa: "Hoje, a população já reconhece o trabalho legítimo".

Apesar de ser quase que exclusivamente conhecido pela faceta singular na música, Adoniran antes despejou este linguajar simples aos personagens que interpretou no rádio.
Na década de 1930 já compunha, mas baseado no estilo romântico do samba carioca que não vingou. "Passou a aprimorar o estilo na década de 1940 quando começou a trabalhar como rádio-ator cômico. Depois, transferiu os tipos para a música", diz Campos Junior.

No rádio, Adoniran ficou até o fim dos anos 1960 e fez grande sucesso com o programa humorístico História das Malocas, na Record, convidado pelo produtor musical Oswaldo Molles, responsável por descobrir a veia cômica de Adoniran. "As famílias se reuniam em volta do rádio. Enquanto tinham crítica social, as falas ainda agradavam as crianças", afirma o jornalista com base em documentos.

Sua participação no cinema foi mais expressiva nos anos 1950 com o boom da Vera Cruz, em São Bernardo. Exemplo é o clássico de Lima Barreto O Cangaceiro (1953), premiado como melhor filme de aventura no Festival de Cannes - categoria extinta.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;