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Denúncia liga desmanches a policiais
Glauco Araújo e
Samir Siviero
Do Diário do Grande ABC
07/12/2002 | 17:55
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Policiais civis estariam recebendo propina mensal de donos de desmanches para não verificar a existência de peças e carros roubados nos estabelecimentos comerciais e, assim, permitir que estes se mantenham abertos. A denúncia foi feita ao Diário por um policial que trabalha na área da Seccional de Santo André e por um dono de desmanche, que preferem não se identificar com medo de represálias. O suposto esquema funcionaria há três anos.

De acordo com o promotor do Grupo de Atuação Especial para a Prevenção e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) Éder Segura, denúncias anônimas que descrevem o suposto esquema de corrupção relatado pelo policial e pelo dono do desmanche também chegaram ao conhecimento do órgão, que já investiga o esquema.

Apontados como principais alimentadores da indústria do roubo e furto de carros, os desmanches devem ser fiscalizados pela Polícia Civil mensalmente.

O policial e o dono do desmanche contam como funcionaria o suposto esquema de corrupção que permitiria a desmanches clandestinos e legalizados das cidades de Santo André, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra funcionar sem serem incomodados pela fiscalização da polícia. “O policial passa aqui só para assinar o livro de registros e pegar o dinheirinho deles, que aqui é de R$ 1,5 mil”, contou João (nome fictício), dono de desmanche.

O delegado seccional de Santo André, Dejar Gomes Neto, disse não ter conhecimento de nenhum esquema desse tipo. “Se soubesse, teria aberto sindicância e até mesmo inquérito policial para investigar, pois esse tipo de atitude não pode ser aprovado dentro da polícia.”

Apesar de a denúncia não citar as cidades sob sua jurisdição, os delegados seccionais Reinaldo Corrêa, de Diadema, e Mário Jordão Toledo Leme, de São Bernardo, também disseram desconhecer qualquer tipo de esquema parecido. “Todas as informações que chegam são investigadas; tivemos duas denúncias anônimas que nunca foram comprovadas pois não localizamos as pessoas citadas”, afirmou Corrêa. “Nunca recebi denúncia desse tipo”, disse Leme.

O policial José (nome fictício) contou que uma vez por mês “um policial circula por mais de 80 desmanches e coleta a quantia de R$ 1,5 mil de cada estabelecimento”. Esse é valor que o proprietário de desmanche teria de pagar para que nenhum investigador, de qualquer uma das delegacias da região, fizesse vistorias nas documentações de peças e carros encontrados no desmanche.

João confirma o suposto esquema. “O valor varia conforme o tamanho do desmanche e é dividido de acordo com a hierarquia da polícia. No mesmo esquema estão casas de prostituição, caça-níqueis e jogo do bicho, tudo cobrado de acordo com uma tabela.”

Segundo José, o suposto esquema existe desde 1999. “Já houve casos em que uma equipe de investigação recebeu uma denúncia sobre problemas em um desmanche e, quando chegou ao local, o proprietário perguntou, em tom de ironia, o que queriam por lá, além de praticamente proibirem a permanência dos policiais no desmanche, até que um policial superior interviesse e tirasse os investigadores do comércio”, contou.

Como o livre funcionamento dos desmanches aumenta o número de roubos e furtos de veículos, os donos desses estabelecimentos teriam recebido recomendação de pedir a “suas equipes de ladrões que os roubos e furtos de carros fossem feitos em outras regiões”, segundo José.

Conforme João, cada carro levado a um desmanche pode render R$ 500 ao assaltante ou à pessoa interessada em dar o “golpe do seguro”.

O dono do desmanche disse que a fiscalização só afrouxa quando há muita pressão da imprensa, ou quando há mudanças nas delegacias. É a época: os três delegados seccionais da região vão assumir postos na capital, e ainda não foram definidos os seus substitutos.




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