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Macunaíma soturno
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14/07/2019 | 07:00
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A provocação partiu do ator Cacá Carvalho: "Por que vocês não criam sua versão de Macunaíma?". Aquela ideia acendeu uma luz na cabeça dos integrantes da companhia Barca dos Corações Partidos e da produtora Andréa Alves - afinal, Cacá tornou-se conhecido ao protagonizar a agora mítica encenação criada por Antunes Filho, em 1978. Como o desafio soava grandioso, a trupe e a produtora pensaram em Bia Lessa, que assinou uma elogiada montagem de Grande Sertão: Veredas. O resultado da parceria é Macunaíma - Uma Rapsódia Musical, que estreia sexta-feira, 19, no Sesc Vila Mariana, depois de uma curta temporada de sucesso em Belo Horizonte.

"É um personagem que não se limita à questão de ser do brasileiro - vai além, pois fala do ser humano como um todo", comenta Bia, que inicialmente relutou em aceitar o desafio. "Participei como atriz de uma das versões de Macunaíma do Antunes e aquele discurso não me interessava em repetir agora." O clique, porém, aconteceu quando a encenadora ouviu o irônico comentário da escritora Verônica Stigger, incumbida de adaptar o livro de Mário de Andrade (1893-1945), publicado em 1928, e no qual ela evoca a famosa frase de Macunaíma: "Ai, que preguiça... do mundo como está hoje!".

"Essa mistura de otimismo e pessimismo ecoa em mim com força", explica Bia que, ao promover um diálogo entre aluna e o mestre Antunes, optou por uma fidelidade à obra em todos os sentidos, físico e conceitual. Macunaíma é um personagem mítico, dotado de poderes de criação e transformação, ao mesmo tempo em que é malicioso e pérfido. Ainda que se lhe imponha o epíteto de herói sem nenhum caráter, ele não se revela um personagem mau-caráter, mas alguém sem caráter definido, com atitudes inesperadas, cuja maioria das ações é movida por um certo prazer mundano.

Assim como no livro, a peça acompanha Macunaíma desde o nascimento, em uma tribo na Amazônia, em uma cena que apresenta ao espectador a força espetacular da montagem: no palco tomado por um plástico preto, o herói é parido mais de uma vez, em uma coreografia que retrata com fidelidade o gestual de uma tribo de índios. Não apenas isso: ao longo dos sete meses de ensaios, Bia e o grupo da Barca se conscientizaram de que a nudez em cena era necessária. "É o corpo fazendo o papel de corpo, com a mesma liberdade de uma criança nua."

"Começamos improvisando, sem saber o caminho a tomar, o que ajudou também a compor a maioria das músicas", conta Beto Lemos que, além de atuar, divide a função de diretor musical com Alfredo Del-Penho. "Criamos 70 músicas, entre canções e vinhetas, das quais escolhemos 52", completa Del-Penho. E, como é marca do trabalho do grupo, todos os sete integrantes e ainda os seis atores convidados tocam diversos instrumentos. A trilha sonora é completada ainda pela música adicional do duo O Grivo.

A missão é apresentar uma peça que propõe uma reflexão sobre a vida contemporânea. "Estimulados pela Bia, nosso questionamento era: "Que país é esse?", comenta Fábio Enriquez. "E sem grandes recursos cênicos: plástico o tempo todo, maquiagem apenas nos pés, tudo para reforçar a força criativa da vida", completa Eduardo Lemos. Todos em atuação emotiva e física. "Se Grande Sertão é mais reflexivo, Macunaíma traz um fluxo constante de ações e não de pensamento", diz Bia.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.




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